obra de Arnaldo Roche-Rabell: You Have to Dream in Blue
Está na hora de uma grande reconversão biológica
Por: Gianni Tirelli
Fonte: stampalibera
Tradução: Mario S. Mieli
O ser humano desenraizado radicalmente da terra é a única e verdadeira causa da tragédia humana, tanto em termos morais como de civilização que, em breve, explodirá em toda a sua potência, com todas as consequências derivadas. Para tudo isso (com o benefício da visão retrospectiva), deveríamos ter investido em bens duradouros, essenciais e não sujeitos à falsificação, imunes de toda interferência industrial possível, que pudesse contaminar sua natureza.
O trabalho industrial não paga, contamina o ambiente, anula o indivíduo, deprime qualquer sua aspiração e paixão, até reduzir a sua existência a um lugar de expiação, e em indolente aceitação de uma condição antinatural onde passa a ser degradado como engrenagem, funcional só aos ritmos produtivos e aos lucros do Sistema Patrão – e, o que é ainda pior, embrutecendo-nos e nos tornando perversos, deixando-nos refratários às necessidades dos outros e sempre mais vulneráveis à dor e à doença.
PORTANTO, CHEGA DE POLÍTICAS INDUSTRIAIS!
Edward Burtynsky – “Oxford Tire Pile #1,” feita em Westley, Calif. em 1999, uma das peças centrais da exposição “An Artificial Wilderness” (Uma Selva Artificial), Wadsworth Atheneum in Hartford.
Fonte: http://wnpr.org/post/wadsworth-atheneum-highlights-artificial-wilderness
Chegou a hora de um maciço retorno à Terra, e de pacificação com a natureza. O homem que não possui terra e que não ara, não semeia e não colhe os seus benditos frutos, não pode considerar-se tal, mas um elemento impróprio de um habitat no qual ele próprio não se reconhece, longe daquele desenho imperturbável que, desde a origem, regulava e monitorava os comportamentos humanos, harmonizando-os entre si.
Essa inédita espécie de homem “moderno” é como uma abelha sem flores, um peixe sem mar, uma árvore sem raiz, um pássaro sem céu, uma religião sem Deus, um coração sem paixão, uma vela sem vento.
Não somos mais que engrenagens cansadas e enferrujadas de um mecanismo perverso e pervertido, cujos custos relativos à sua manutenção e à recuperação de todas as escórias tóxicas produzidas e dispersas no território do Industrialismo Destrutor superam grandemente os benefícios trazidos à comunidade (no sentido de qualidade de vida e de felicidade) e aos próprios lucros.
A capacidade de sonhar, de amar, de crer e de ter esperança é produto daquela relação simbiótica (troca mútua) que, desde sempre, o ser humano teve e cultivou com a Terra, mãe indiscutível do nosso destino. Uma Terra hoje dilacerada, desprezada, violentada e estuprada por uma onda de diabos de escritório, vestidos com colarinhos brancos e gravatas espalhafatosas, que mercantilizaram com Satanás o sangue e o futuro de nossos filhos, contra vício perversão.
Uma boa parte do velho mundo resistiu até 50 ou 60 anos atrás, depois de milênios em que o homem (aquele realmente sapiens) obtinha todo o seu sustento, verdadeira alegria e verdadeira dor da Mãe Suprema, a TERRA. Nossos medos mais perversos, ataques de pânico, depressão, as infinitas formas neuróticas e muito mais, não são mais que o resultado desse destacamento entre o homem e a natureza. As tradições, o rito mágico, a iniciação, o folclore, o temor do incognoscível, eram os fundamentos éticos de um viver consciente. Hoje estamos submetidos ao Nada e envolvidos numa dor pungente da qual não sabemos como nos liberar.
Não adiantam fármacos, drogas, efêmeras liberdades, para acalmar a nossa dor existencial! Chegou a hora da Grande Reconversão Biológica: abandonar as cidades para afundarmos nossas mãos na terra – cavar com enxada, semear, colher e, no fim, esperar. Esse é o único e verdadeiro conhecimento, medicamento e cura para todos os nossos males: reencontrar nossa verdadeira essência, as emoções, as atmosferas, a magia, o silêncio e a Fé, sem a qual nada tem sentido.
Nossa época moderna é caracterizada por uma idolatria de baixíssimo nível, em que são mitificados os astros da música, os jogadores de futebol, pilotos, atores, políticos anões, putas e empreendedores poluidores, e na qual o conceito de “divino” foi cancelado para sempre de toda ação, emoção e sentimento humanos. Uma faixa de fogo deseducadora e mistificadora, que o Sistema Besta implantou para mercantilizar (sem mais qualquer obstáculo de natureza ética e moral), a sua efêmera e ensanguentada mercadoria.
obra de Ana Mendieta, “A Árvore da Vida”
O mundo camponês do passado (o qual representava cerca de 99% da população) era caracterizado pela autonomia e autossuficiência, e cada indivíduo ou grupo definia e determinava a sua “razão de ser”, quanto à satisfação das necessidades primárias e essenciais, relativas ao e dependentes do território, à sua capacidade de produzir bens e privilégios (água, fertilidade, energia) e ao impulso de consolidadas tradições e atávicas crenças.
A força de vontade, que no passado tinha a função, o escopo e a potência de produzir diversidade e mérito, veio a faltar, para transfigurar em homologação e indolente aceitação.
O Sistema, por outro lado, sobrevive justamente em virtude de nossos comportamentos irracionais e de uma conclamada estupidez das pessoas que, com o passar do tempo, foram transfiguradas em uma inédita forma de escravidão pelas necessidades virtuais, totalmente ineficazes e seguramente devastadoras para a saúde.
Perdemos o conhecimento básico que, antigamente, era sinônimo de autonomia, de autossuficiência, e no qual o indivíduo era o único artífice e responsável pela própria condição.
Esses dons sagrados que, desde a aurora dos tempos, determinaram a condição humana e suas imprescindíveis e originárias razões e que se atestam nos elementos Terra, Água, Ar e Fogo, em virtude de um quinto, fundador, criador e gerador de todas as coisas que, na Fé, exprime toda a sua potência e natureza transcendente: Deus.
Instalação “SIM” de Regina Vater, parte da mostra “CULTIVARE”, Rio de Janeiro, 2007
Fonte: imediata
Recomendamos também a leitura do texto pelo mesmo autor:
>> Uma humanidade sem deus e submersa pelo nada, por Gianni Tirelli
http://imediata.org/?p=2308
Artistas cujas obras foram reproduzidas nesta matéria:
Ana Mendieta, Arnaldo Roche-Rabell, Edward Burtynsky, Regina Vater