>> Os forcados e a deflagração da Europa, por Franco Bifo Berardi

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Os forcados e a deflagração da Europa, por Franco Bifo Berardi

Fonte: micromega
Tradução: Mario S. Mieli

O que está acontecendo na Itália precisa ser lido no contexto da deflagração da União Europeia, provocada pela agressão financista guiada pelo Banco Central Europeu e pelo governo alemão.

A partir de Maastricht, a classe financeira global decidiu cancelar, na Europa, qualquer rastro da força operária do passado, a democracia, a garantia salarial, os gastos sociais. Em nome do fanatismo liberal, acabou por erradicar as raízes do consenso sobre o qual se fundava a União Europeia. O efeito, porém, não é só a redução pela metade da folha de pagamentos dos trabalhadores europeus, a destruição da escola e da saúde pública, a abolição do limite do horário de trabalho, a precarização generalizada. É também a guerra.

Era previsível, estava previsto, agora começa a acontecer.

A desagregação final da União Europeia pode ser lida no mapa.

Comecemos pelo leste. A insurreição ucraniana é prova de como mudou a natureza da Europa. Nascida como projeto de paz entre alemães e franceses, e, portanto, de paz em todo o continentes, a União hoje se tornou exatamente o contrário. Os europeístas ucranianos usam o europeísmo como arma apontada contra o imperialismo russo, e acordam fantasmas do nazismo. A entrada na Europa é vista como uma promessa de guerra, e a precipitação do conflito na Ucrânia só poderá ter consequências assustadoras para a Europa inteira. Bruxelas vai reagir abrindo um confronto com a Rússia de Putin, ou deixará que a Rússia de Putin sufoque uma revolta que nasceu em nome da Europa?

Desloquemo-nos para oeste. O Parlamento catalão lançou o referendo independentista para o outono de 2014. Os franquistas do governo madrileno responderam que o referendum não será feito nunca.

Enquanto isso, na França, as sondagens de opinião preveem que o Front National se tornará partido de maioria nas próximas eleições. Naquele ponto, o pacto franco-alemão sobre o qual se funda a União será cancelado na consciência da maioria dos franceses, e a balcanização do continente precipitará.

Esta dinâmica me parece o contexto no qual ler as dolorosas convulsões da península italiana.

O governo Letta-Alfano-Napolitano, filial do partido destruidores da Europa, está na sala de reanimação. Pode durar ou cair, pouco importa: não é capaz de manter nenhuma promessa, nem mesmo aquelas feitas aos seus patrões de Frankfurt.
O movimento dos forcados é um transbordar do nervosismo social. Em 2011, o movimento anticapitalista tentou parar a agressão financista, mas não teve a força de colocar em ação uma sublevação solidária entre trabalhadores, e o movimento se resolveu em um protesto que a classe político-financeira, por criminoso interesse, e por imbecilidade conformista, recusou até mesmo escutar.

Mas a sublevação não para, porque têm os caracteres telúricos de uma desagregação da própria base do consenso social. É uma sublevação isenta de coerência interna, isenta de estratégia progressiva. Há dentro dela elementos de nacionalismo, de racismo, de egoísmo pequeno-proprietário, mas também elementos de rebelião operária, de democracia direta e de raiva libertária. Não é importante a sua confusa consciência, as contrastantes ideologias e os contrastantes interesses que a mobilizam. Conta o fato de que o seu colante objetivo é o ódio contra a Europa. Esse ódio que só pode ser portador de desgraças.
Franco Bifo Berardi
(13 de dezembro de 2013)

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