“Se a arte não serve para elevar o Eu coletivo, então ela é inútil.”–Gandhi, Por: Maurizio Colantuoni

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escultura sem título de Maurizio Colantuoni

“Se a arte não serve para elevar o Eu coletivo, então ela é inútil.”—Gandhi

por Maurizio Colantuoni

Tradução: Mario S. Mieli

A partir da metade do século passado, o poder que controla os meios de comunicação não permitiu que isso aconteesse. Vejamos a história da arte dos últimos 50 anos. Nos anos 60, foram impostas no mercado da arte contemporânea, a arte conceitual e a pop art.

A arte conceitual se baseia no conceito de que a obra de arte não precisa do contexto da galeria de arte para ser tomada como arte. Isso é exatamente o oposto da citação de Gandhi. É o triunfo do pensamento relativo, trazendo a semiótica como grande novidade. Mas esse conceito (sinal, significado e significante) tinha sido expresso 4000 anos atrás, nos textos védicos, e se dirigia à única coisa que pode representar: a super consciência. Ou seja, o pensamento absoluto. Ao contrário, a pop art é a aquisição do quotidiano destituída de qualquer crítica (a lata de feijão ou o retrato da atriz-celebridade representados sobre tela). Se todas as formas de arte foram influenciadas por um determinado tipo de droga, a pop art pode ser representada pela heroína, uma droga que faz parecer qualquer coisa aceitável e, portanto, se torna alienação.

Um tipo de arte perfeita para controlar as massas. Não por acaso existem documentos da CIA nos quais se impunha a presença dos artistas pop na Bienal de Veneza de 1968. Tudo isso, nos anos recentes, fez com que uma das obras de arte mais caras fosse uma ovelha dilacerada em formaldeído. O colecionador que tem essa obra em casa, seguramente satisfez seu senso de posse fetichista e de satisfação econômica, mas seu filho, que cresce ao lado da obra, como verá o mundo se, desde pequeno, considera uma ovelha dilacerada como uma grande obra de arte?

Queremos, entretanto, salvar a boa fé dos artistas. É o sistema que escolhe o que dar às pessoas, e as pessoas são aquilo que lhe deram. Egon Schiele dizia que a arte não pode ser moderna. A arte é primordialmente eterna. Em uma entrevista de 15 anos atrás, David Bowie afirmava que a arte se estava enclausurando em si mesma. É exatamente o que ocorreu.

Há décadas essas tipologias triunfantes estão sendo levadas adiante por um sistema auto-referencial formado por donos de galerias, críticos, colecionadores, jornalistas. Analisemos brevemente esses papéis. O papel dos donos de galeria, segundo minha experiência, é o de fazer levitar o mais possível os preços das obras, reduzindo-as a produtos financeiros. Ao passo que seu papel deve ser de grande responsabilidade: oferecer ao público obras que elevem o Eu coletivo.

Os críticos leem as obras nos limites do último período da história da arte. Tudo o que não couber nesse limite asfixiado e de contínua busca de novidade é, para eles, incompreensível. Não têm outros métodos ou tipos de conhecimento para descrever uma obra. Os colecionadores, que são os financiadores desse mecanismo, procuram exclusivamente o investimento seguro. A maior parte das obras que compram são trancafiadas nos cofres de bancos, como lingotes de ouro.

Se esses personagens não cumprirem esses papeis serão expulsos do sistema ou, no melhor dos casos, relegados a papeis de categoria C. O fim de tudo isso é preencher o horizonte mental das pessoas com um tipo de arte alienante. Por que as obras de arte devem custar tanto? Por que as obras de arte não devem estar em um maior número de casas, em vez de ficarem trancadas nos cofres dos bancos? Por que nas casas das pessoas comuns se encontram pouco mais que reproduções de calendários ou estúpidos bibelôs? Por que as pessoas devem ser vítimas de poucas obras de arte públicas colocadas ali por um sistema degenerado? A resposta é que, privando-as de obras de arte elevadas, as pessoas acabam vivendo em um estado de baixo nível de consciência.

No passado, quando as minhas esculturas se tornaram cheques na parede, eram vendidas pelos melhores galeristas por cifras, na minha opinião, astronômicas. Eram compradas sobretudo por “laranjas”, corruptos, ricaços enfastiados ou emergentes, ou até pelo político que tinha feito sumir o dinheiro destinado à ajuda dos refugiados da Somália. Essas eram as pessoas que compravam minhas esculturas. Tudo isso provocou em mim um nauseante curto circuito. Continuei meu trabalho de modo solitário.

Em uma época como a nossa, em que cada coisa pode ser reproduzida, uma escultura ou um quadro pode ser produzido em mais exemplares, e ser assim adquirido por um grande número de pessoas por um preço razoável. Quando Joseph Beuys ainda estava vivo, comprei um seu múltiplo ilimitado na banca dos verdes, na feira de Basileia, por uma cifra compatível com as minhas magras finanças juvenis.

As obras devem ser reproduzidas em mais cópias e vendidas por preços razoáveis. É essa uma das duas chaves para tornar a arte útil para as pessoas. A outra diz respeito ao papel dos artistas, que sintetizo em uma afirmação do sempre lúcido Alejandro Jodorowsky.

“… Duvidava até da arte… Para que serve? Se serve somente para divertir pessoas que têm medo de despertar, não me interessa. Se é um meio para ter sucesso do ponto de vista econômico, não me interessa. Se é uma atividade de que o meu ego lança mão para se ensoberbar, não me interessa. Se preciso ser o bufão daqueles que detêm o poder, envenenando o planeta e fazer padecer de fome milhões de pessoas, não me interessa. Qual é, então, a finalidade da arte? Depois de uma crise a tal ponto profunda que cheguei a pensar em suicídio, cheguei à conclusão de que a finalidade da arte era curar. Se a arte não cura, não é arte”.

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