Para entender o terrorismo, reler Heródoto
A tirania se fortalece na emergência: hoje em dia, como na antiga Grécia de Pisístrato
Por: Diego Fusaro
Tradução: Mario S. Mieli
Que a história seja “mestra de vida” (magistra vitae) é um ditado conhecido que remonta a Cícero e que ainda mantém sua validade.
Conhecer a história do passado ajuda a entender o presente e, talvez, também a evitar que os erros de ontem sejam repetidos hoje.
Portanto, no período pós-1989, vivemos num contexto marcado pela temporalidade do regime do eterno presente: a sociedade de classes visa contrabandear-se como eterna, negando o direito de futuros alternativos e celebrando-se como um fado inevitável, como incorrigível destino. “Você não terá outra sociedade fora dessa!” é o imperativo propagado incessantemente.
NÃO HÁ CONSCIÊNCIA DO PASSADO. A desistorização em curso não diz respeito apenas à dimensão do devir, agora removida em nome do presente eternizado. Investe inclusive nas extensões de um passado também cada vez mais cancelado em nome do eterno presente: tende a se eclipsar o sentido histórico e em todo o horizonte prevalece o que, variando a Nietzsche, propus em outro lugar rotular como “doença anti-histórica”.
Esta patologia consiste na incapacidade de se ter consciência do passado, ou mesmo de relacionar o presente com sua história. Por isso, o que está acontecendo hoje aparenta ser sempre diferente e não somos capazes de relacioná-lo com os eventos do passado. E, ao contrário, olhar retrospectivamente para a nossa história é o gesto fundamental para entender também o nosso presente. Procuremos, nesse sentido, fazer um exercício, lembrando a voz dos antigos gregos.
A TIRANIA DE PISÍSTRATO. Assim escreve Heródoto em suas Histórias (I, 1), quanto à maneira como Pisístrato obteve sua tirania em Atenas: “Ele concebeu o seguinte estratagema. Feriu-se a si mesmo e a suas mulas e depois dirigiu seu carrinho na praça central, fingindo ter escapado de uma emboscada de inimigos que, segundo ele, teriam tido a clara intenção de matá-lo enquanto seguia o caminho para o seu campo; pediu, portanto, que o povo lhe designasse guardas que lhe dariam guarita, pedindo que também levassem em consideração seus méritos anteriores quando, estrategista na época da guerra contra Mégara, tinha capturado o porto de Niceia e empreendido outros grandes feitos. O povo ateniense deixou-se enganar e concedeu-lhe escolher entre os cidadãos um certo número de homens que se tornariam os lanceiros privados de Pisístrato, ou melhor, seus “taqueiros”, dado que a escolta estava armada de tacos de madeira. Este corpo de guarda contribuiu ao golpe de Estado do Pisístrato, ocupando a Acrópole “.
A EMERGÊNCIA SE TORNA PRETEXTO. Heródoto está aqui descrevendo perfeitamente o que, milênios depois e, com maior razão que o ocorrido com Pisístrato, será conhecido como a “estratégia da tensão”: o medo e o terror também são métodos de governo que beneficiam o poder, permitindo-lhe de fazer com que as massas aceitem o que elas, em condições normais, nunca aceitariam.
Heródoto está delineando aqui perfeitamente – podemos dizer – a estratégia que está acontecendo com relação ao terrorismo.
A situação de emergência torna-se um pretexto para restringir as liberdades e para garantir que os cidadãos, reduzidos a súditos, aceitem o fato conscientemente, como escravos que amam suas próprias cadeias.