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Hotel Gramsci

Por: Diego Fusaro
Fonte: Lo Spiffero 14/04/2014
Via: Come Don Chisciotte
Tradução: Mario S. Mieli

O hotel de luxo de cinco andares surgirá no centro de Turim, na Praça Carlo Emanuele, e se chamará Hotel Gramsci. Surgirá das cinzas da casa em que Antonio Gramsci residiu de 1919 a 1921, fundando o “Ordine Nuovo” e, lançando, assim, as bases do futuro Partido Comunista Italiano. Não conheço, pessoalmente, uma maneira melhor para descrever a história da esquerda italiana: a passagem da nobre figura de Antonio Gramsci para um hotel de luxo a ele dedicado, com todo o apoio da esquerda da cidade.

É o emblema da involução da esquerda, o tragicômico evento da “grande serpente metamórfica PCI-PDS-DS-PD” (a definição é de Costanzo Preve): nela, é possível ler, em filigrana, uma dialética de progressivo abandono no anticapitalismo e de gradual integração, hoje tendo-se tornada total, com as lógicas ilógicas do mercado divinizado por parte das forças de esquerda. O Hotel Gramsci apresenta uma “sinistra” (N.doT.: esquerda, em italiano) (!) analogia com o Grande Hotel Abismo, de que falava Lukács em sua Destruição da Razão.

O paradoxo está no fato de que a esquerda, hoje, por um lado, herdou a jazida de consensos inerciais de legitimação própria da valência opositiva do agora defunto Partido Comunista e, por outro lado, não hesita em empregá-los pontualmente, tendo em vista o deslocamento da geração comunista dos anos ’60 e ’70 em direção a uma gradual “aculturação” (secularista, relativista, individualista e sempre pronta a defender a teologia intervencionista dos direitos humanos) funcional à soberania irresponsável da economia. Os múltiplos renegados, arrependidos e últimos homens que povoam as fileiras da esquerda se encontram improvisamente desprovidos de qualquer tipo de legitimação histórica e política, mas ainda dotados de um grupo de seguidores identitários inercial a ser explorado como fonte de mobilização conservadora.

Por isso a esquerda continua inflexivelmente cultivando formas litúrgicas herdadas da fé ideológica precedente, no ato mesmo com o qual abdica completamente respeito ao próprio originário espírito de cisão, aderindo às lógicas do capital em formas cada vez mais vulgares. Trata-se do tradicional zelo dos neófitos, ao qual, por outro lado – junto com os ritos de expiação – acrescenta-se o fato de que, sobre a cabeça dos arrependidos, pende sempre a espada de Dâmocles de seu passado comunista que, ainda que renegado, pode ser sempre exumado se as circunstâncias o pedirem.

Longo o plano inclinado que, da nobre figura de Antonio Gramsci leva a Massimo D’Alema, em que tem sido consumado o tragicômico trânsito da paixão transformadora marxiana para o desencanto weberiano fundado na consciência da morte de Deus, com anexa reconciliação com o ‘ordo’ capitalístico. Com os versos de Shakespeare, lilies that fester smell far worse than weeds: “lírios que apodrecem cheirando muito pior que ervas daninhas”.

Ver também:
>> Amores Insólitos 21 – ODEIO OS INDIFERENTES, por Antonio Gramsci, com leitura de Fiorella Mannoia e de Paolo e Luca, seguidos do filme “A forma da memória”
http://imediata.org/?p=2283

>> Cinco minutos para ouvir sentida mensagem de Eric Hobsbawm a Antonio Gramsci
http://imediata.org/?p=2721

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