A pior das escravidões
Por: Gianni Tirelli
Fonte: oltrelacoltre
Tradução: Mario S. Mieli
Podemos não nos dar conta do ar, mas não podemos negar a sua função vital – e isso vale para Deus. Se renunciamos ao ar, renunciamos a Deus e a toda possibilidade de salvação. Esse mecanismo lógico e perfeito, encarna toda forma de vida, e produz, à base de nossos atos, a alternância entre a alegria e a dor. Negar Deus subentende negar a razão, evitando, assim, toda interpretação do mal e do bem. Hoje nos foi tirado todo personalismo, vontade, parâmetro e julgamento crítico. Como poderíamos distinguir o justo do iníquo e a beleza do horror? Assim o relativismo impera e dita lei.
É DESSE MODO QUE SE CONTROLAM AS MASSAS, TIRANDO DELAS OS PARÂMETROS DE REFERÊNCIA, DE JULGAMENTO CRÍTICO E DE COMPARAÇÃO. Se nós todos aceitamos, de fato, que o nosso habitat seja sistematicamente devastado pelo lixo e pelos resíduos tóxicos poluidores, que comprometem a qualidade de vida, a saúde e o futuro dos cidadãos, reduzindo tudo a um “efeito colateral do bem estar e do progresso”, daí não fica difícil duvidar da existência de Deus, em prol daquela do Diabo. A obra de plágio midiática cancelou todo individualismo e o pensamento único homologador se impôs ao instinto primordial e à capacidade de observação e de discernimento. Dessa forma nos atemos às indicações de um manualzinho de instruções que o próprio Sistema Besta nos entrega no dia em que nascemos. Em poucas palavras, o homem foi para sempre privado de consciência, transfigurando, assim, o significado de existência em um específico estado vegetativo. Hoje, a ciência moderna, árida e oportunista, sujeitada ao Poder econômico, livrou-se da espiritualidade, considerando-a um próprio e verdadeiro impedimento ao seu plano de homologação dos indivíduos que, na prática da coerência dos valores, princípios e deveres, frustravam o comércio do efêmero e do ilícito. O sentimento de culpa que intervinha nas escolhas e os comportamentos, limitando as degenerações, foi miseramente minado e substituído pelo “tudo é relativo”, como o novo slogan do Sistema poder, entronizado como dogma absoluto e irrenunciável das sociedades consumistas ocidentais. As graníticas e imperecíveis digas da ética se esmigalharam sob a imponente pressão do liberalismo relativista/consumista. Os princípios éticos, reguladores e sentinelas dos comportamentos humanos foram removidos para sempre e vício, perversão e medo os substituíram. O mal, antigamente reconhecível e atribuível, assumiu os traços da normalidade, expropriando o espírito do homem e privando-o, assim, da consciência, do discernimento e da dignidade.
Na verdade, não sabemos mais distinguir o mal do maligno, a liberdade da licença, a esperteza da inteligência, a verdade da mentira e o progresso da catástrofe ambiental. Essa nossa é a pior das escravidões. Somos prisioneiros, constrangidos dentro da gaiola invisível da homologação e de um persistente desconforto psíquico/existencial, oprimidos pela ditadura de uma liberdade efêmera e pela ilusão induzida pelo Sistema Relativista de nos considerarmos como tal. Todos os outros adjetivos que poderíamos colocar ao lado do termo “relativismo”, com a intenção de reforçar o seu significado etimológico, na realidade, o mortificariam, pois ele mesmo (o relativismo) é uma condição fora de toda objetiva compreensão humana, e o mais terrível auspício.
De fato, dentro de nós, não vibra mais nenhuma corda e cada movimento da maré se apagou, esmagado pelo achatamento descendente de todo o nosso personalismo, julgamento crítico e gesto revolucionário. Nem mesmo sob o pior dos regimes tinha sido jamais produzida uma tal massificação das consciências e uma tão alta percepção do medo, em todas as suas formas psicóticas, hipocondríacas, de densidade e de contaminações.
Os indivíduos androidizados das sociedades ocidentais interpretam o conhecimento do passado como incapaz de atingir uma realidade objetiva e absoluta. Afirmo isso tendo como base uma atenciosa e desencantada observação de seus comportamentos, raciocínios, convencimentos e, enfim, analisando os efeitos de suas escolhas na realidade presente. Assim, a ilegalidade tornou-se regra e os órgãos responsáveis por contrastá-la são de tal modo podres e corruptos que chamar as nossas sociedade de civis é um oxímoro. O oxímoro, parido em quantidade industrial pelo moderno Sistema liberticida, é o germe maléfico do relativismo.
Portanto, a locução “certeza científica” descreve com eficácia o contraste lógico de uma tal afirmação, codificando-a, acertadamente, entre a categoria sem limites dos modernos e catastróficos oxímoros, hoje adotados em massa nas regras comportamentais, de modo a ter promovido a mutação da liberdade em licença e a realidade em um exercício compulsivo voltado à satisfação de toda perversão e dependência.