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Singelas PROFANA-ações 40 – Oliver Ressler: A Ópera dos Três Vinténs do século XXI

Por: Andris Brinkmanis
Fonte: alfapiù, arte · 31 de março de 2012
Tradução: Mario S. Mieli

Crítica da mostra: “After the Crisis is Before the Crisis” (Depois da Crise é Antes da Crise) – do artista austríaco Oliver Ressler, até 28 de abril de 2012, na Galleria Artra de Milão


Qual poderia ser a representação mais apropriada da atual crise financeira? Como torná-la “transparente”, visível, quase tátil, profanando o mito de sua suposta complexidade e abstração? Como evitar a opacidade dos lugares comuns e a espetacularização apocalítica que ela está assumindo, graças à linguagem midiática, televisiva, técnico-burocrática? Se os movimentos contemporâneos têm procurado fornecer certos meios linguísticos e semióticos úteis, também o artista austríaco Oliver Ressler, que recentemente inaugurou sua mostra, com curadoria de Marco Scotini, na galleria Artra de Milão, busca individuar respostas e propostas possíveis para essas perguntas.

O projeto, com seu título profeticamente misterioso– After the Crisis is before the Crisis – através desse jogo linguístico nos torna participantes e nos prepara simbolicamente para algo que, no momento da agonia do capitalismo financeiro, está antecipando o seu verdadeiro futuro. Ressler, sempre atento aos temas sociais mais urgentes em escala global (de um ponto de vista documentarista/ativista), opta, pela primeira vez, por usar linguagem e abordagens menos utilizadas.



Em seu último vídeo “The Bull laid bear”, criado em colaboração com Z. Begg, a nova estratégia estética de Ressler nos revela logo as suas fontes e o seu próprio método, ao som tornado célebre por Billy Holiday (aqui reinterpretada pela neozelandesa Singing Sadie). Em 1928, Brecht encena a Ópera dos Três Vinténs, na qual, por meio de um lúcida colagem demoníaca, ataca a burguesia da época criando o instrumento do teatro épico e antecipando assim a futura crise política, o fascismo. l

No vídeo, que conclui com a famosa frase de Brecht: “O que é roubar um banco comparado a fundar um?”, Begg e Ressle escolhem como sua própria estética não a abordagem moralizante do documentário político clássico, mas a linguagem dos desenhos animados, inserindo alguns personagens reais em um ambiente desenhado e retratando os representantes das finanças no mais perfeito estilo das mais famosas revistas de sátira do século passado.

Quando se não hoje, a ópera de Brecht alcançou novamente sua máxima atualidade? Em que sociedade, se não na contemporânea, os criminosos, como o personagem de Mackie Messe, não só não são enforcados, mas são agraciados e premiados com os máximos cargos de representação régia ou estatal? E onde, se não nas revistas de sátira sob os regimes totalitários da época da guerra fria, podia-se decodificar um discurso sério sobre o próprio tempo e a própria história?

Em linha, portanto, encontram-se também as outras obras. Uma série de fotografias em estilo brechtiano declaram inválidos os dispositivos de um poder estatal clássico, mostrando os seus máximos representantes – policiais, gerentes e militares – amontoados no chão como o resíduo de uma democracia estatal que já perdeu agora qualquer relevância e controle sobre a situação atual. Alguns fragmentos de um cercado – dispositivo de segurança por excelência – são aqui desviados e transformados em uma grande grade eventual, à disposição de todos. Por sua vez, o vídeo “Robberies” reflete sobre o fenômeno recente de pilhagem das lojas por parte dos “novos pobres”, contrapondo as fotos desses eventos com as imagens de Merkel e Sarkozy, que tomam decisões sobre a pilhagem dos próprios cidadãos.


Uma outra dupla vídeo-projeção se focaliza no mercado municipal de Yerevan, como o lugar simbólico da nova miséria e fornece documentação que retrata a herança industrial da Armênia em desuso. Para concluir, encontramos, enfim, a impressão digital de um carro de luxo no piso da galeria, como a carroça régia que na Ópera dos Três Vinténs chega para anunciar o perdão concedido ao criminoso principal.

Volta tudo! Nessa “Ópera” também há mendigos, pobres lamentosos, funcionários estatais corruptos, legendas gigantescas (o método usado no teatro épico). Uma dessas – Too Big to fail – é uma escrita que reproduz nas letras as fotos de uma manifestação vienense contra os bancos, mudando completamente o significado da frase, normalmente usada quando se fala do sistema bancário. A perversão do contexto, pelo contrário, emerge do conjunto de obras colocadas na exposição. Assim aqui o jogo se torna um ato de resistência para profanar aquilo que parece improfanável.

Walter Benjamin, falando do estado de exceção em que vivemos, e que se tornou a regra, propõe contrapor-lhe um estado de exceção “efetivo”, que seria nossa tarefa realizar, a partir da tradição dos oprimidos. “Devemos alcançar – afirma – um conceito de história que corresponda a esse fato. Teremos como tarefa, então, pela frente, a produção do estado de exceção efetivo”. O que Ressler faz não é mais que nos convidar a concretizar essa urgência!

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