Precisamos de um movimento contra a guerra

 

 


Judy Rebick
Zmag

15 de março de 2002

Tradução Imediata

As repercussões pós-11 de setembro tornaram a vida mais difícil para a esquerda, no Canadá. A maior militarização do Canadá e a repressão dos direitos civis tem sido desorientadoras. Mas nossos problemas estratégicos continuam os mesmos. Estão simplesmente mais intensos.

Pela primeira vez em mais de uma geração, o público está demonstrando um forte apoio para maiores gastos militares e para uma maior participação do Canadá em uma guerra de tiros sob liderança da América. Para a esquerda, que geralmente tem apoiado mais financiamentos públicos para os serviços sociais e públicos e menos para gastos militares e de segurança, trata-se de um sério revés.

A esquerda no Canadá tem sido incapaz de questionar a roda-viva da política e da mídia — o pressuposto, por exemplo, que poucos civis foram mortos durante os intensos bombardeios do Afeganistão, ou que a maioria das pessoas daquela região apoia a intervenção americana. Desde 11 de setembro, as fontes de mídia alternativa na Internet tem crescido incrivelmente. Mas a mensagem da oposição em todo o mundo à guerra dos EUA contra o terrorismo ainda não alcançou a mídia principal dos EUA.

Somente um amplo movimento anti-guerra pode mudar a opinião pública. Os intensos protestos contra a guerra estão aumentando na Europa; o Canadá e os EUA ainda não verificaram mobilizações significativas. Esperançosamente, um grande protesto contra a guerra, planejado para ocorrer no dia 20 de abril em Washington, dará o chute inicial a um movimento mais amplo na América do Norte.

Por outro lado, o Novo Partido Democrático (New Democratic Party) tem sido capaz de se distinguir como o único partido que se opõe à guerra. Sem a corajosa intervenção do NDP, não teria havido nenhuma voz parlamentar levantando questões sobre a corrida do Canadá para seguir os bombardeios ao Afeganistão, liderados pelos EUA. Pode ser que a posição deles não seja muito popular, mas traz um respeito muito necessário ao NPD, da parte de ativistas sociais e da mídia.

Mesmo antes de 11 de setembro, a polícia, os tribunais e o governo tinham aumentado intensamente a segurança e a repressão do estado, devido ao crescente movimento antiglobalização. A criminalização dos dissidentes, tão visível através do gás lacrimogêneo em Quebec, agora foi codificado nos novos projetos de lei de segurança do Canadá.

Também temos visto mais racismo desde 11 de setembro: ataques nas ruas contra pessoas que aparentam ser do Oriente Médio; maiores aborrecimentos para homens com pele mais escura nas fronteiras; o ataque selvagem da mídia à professora Sunera Thobani da Universidade de British Columbia, depois que ela se manifestou contra a guerra. Esses fatos trazem um grande desafio para a esquerda: como comunicar com as crescentes comunidades de cor.

A esquerda canadense tem, tradicionalmente, confiado em um certo elemento de anti-americanismo; a identidade do Canadá foi formada nas últimas gerações, por meio de declarações de como somos diferentes dos americanos. Nos últimos meses, nossa identificação com nossos vizinhos foi maior do que o nosso desejo de nos diferenciarmos deles. Baseando-se nesses sentimentos, Ottawa passou a harmonizar a segurança das fronteiras e as políticas de imigração. Mas a reação pública ao nosso ouro em hóquei revelou que tanta afinidade era temporária. "Pelo menos podemos ganhar dos americanos em alguma coisa", afirmou um fã delirante.

Antes de 11 de setembro, um nova geração de ativistas despontou para desafiar o controle das corporações sobre praticamente tudo. Ao contrário da imaginação das classes tagarelas, o movimento antiglobalização não foi desmobilizado. Mas os ataques tiveram um impacto. Eles certamente intensificaram as divisões entre os jovens ativistas de ação direta e a esquerda mais tradicional, como os ativistas do movimento trabalhista. Planos para um protesto intenso em Kananaskis para o G8 em junho estão recebendo apoio significativo de grupos como o Conselho de Canadenses e de alguns sindicatos — mas outros estão ainda esperando para ver.

A discussão a respeito de aceitar-se ou não as táticas violentas durante as demonstrações parece que se placou, pelo menos por enquanto, pelo risco de uma maior repressão. Como disse um dos protestantes em Nova York: "Só o fato de estar na rua já é uma confrontação suficiente." Poucos desses jovens ativistas voltaram a atenção para o trabalho contra a guerra.

No cenário internacional, as seqüelas do 11 de setembro somente fortaleceram a determinação de um crescente "movimento de movimentos" globais. No último mês de fevereiro, em Porto Alegre, Brasil, mais de 60.000 pessoas que se reuniram no Fórum Social Mundial provaram ser falsa a noção de que o movimento pela justiça social mundial esteja debilitado, de alguma forma.

No Canadá, não é tanto o 11 de setembro, quanto os insucessos políticos da esquerda que ditam a necessidade de novas estratégias. Uma nova geração de ativistas está demandando um processo de organização muito mais democrático e aberto, da base ao topo. assim como mais táticas de militância. Mundialmente, a política da nova esquerda está se concentrando em democracia participatória, sustentabilidade ambiental e justiça global. E as maiores barreiras a esses objetivos são a política militar e externa dos EUA, e a política econômica dos EUA conforme refletida pelo Banco Mundial e pelo Fundo Monetário Internacional. As razões para a luta estão mais fortes do que nunca.

Judy Rebick é a editora de www.rabble.ca e autora de Imagine a Democracia (Imagine Democracy). Este artigo foi publicado primeiramente no The Globe e Mail.

 

We Need An Anti-War Movement

by Judy Rebick

March 15, 2002

The shockwaves of Sept. 11 have made life more difficult for the left in Canada. Canada's increased militarization and the repression of civil rights have been disorienting. But our strategic problems remain the same. They're simply more intense.

For the first time in more than a generation, the public is showing strong public support for increased military spending and for Canada's participation in a shooting war under American leadership. For the left, which has generally supported more public financing for public and social services and less for military and security, this is a serious setback.

The left in Canada has been unable to question the political and media spin -- the assumption, for example, that few civilian lives have been lost in the massive bombings of Afghanistan, or that most of that region's people support the U.S. intervention. Since Sept. 11, alternative media sources on the Internet have grown tremendously. But the message of worldwide opposition to the U.S. war on terrorism has yet to reach the North American mainstream.

Only a broad antiwar movement can change public opinion. Europe's massive antiwar protests are growing; Canada and the U.S. have yet to see significant mobilization. Hopefully, a major antiwar protest planned for Washington on April 20 will kick-start a broader North American movement.

On the other hand, the New Democratic Party has been able to distinguish itself as the only party to oppose the war. Without the NDP's courageous intervention, there would have been no parliamentary voice raising questions about Canada's rush to follow the U.S.-led bombing of Afghanistan. Theirs might not be a popular position, but it brings much-needed respect to the NDP from social activists and the media.

Even before Sept. 11, the police, courts and government had been massively increasing security and state repression in the face of a growing antiglobalization movement. The criminalization of dissent so visible through the tear gas in Quebec City has now been codified in Canada's new security bills.

We've also seen more racism since Sept. 11: attacks on the streets against people who looked Middle Eastern; the hassling of brown-skinned men at border crossings; the savage media attack on University of British Columbia professor Sunera Thobani after she spoke out against the war. These bring a major challenge for the left into sharp relief: to reach out to this country's growing communities of colour.

The Canadian left has traditionally relied on a certain element of anti-Americanism; Canadian identity has been formed in the last few generations by declaring the many ways in which we're unlike Americans. Over these past months, our identification with our neighbours was stronger than our desire to differentiate ourselves from them. Relying on these feelings, Ottawa moved to harmonize border security and immigration policies. But public reaction to our hockey gold revealed that such sympathy was temporary. "At least we can beat the Americans at something," said one delirious fan.

Before Sept. 11, a new generation of activists came out to challenge corporate control of practically everything. Contrary to the imagination of the chattering classes, the antiglobalization movement has not demobilized. But the attacks have had an impact. They certainly deepened divisions between the direct-action youth activists and the more traditional left, like those activists in the labour movement. Plans for a massive protest camp in Kananaskis for the G8 in June are receiving significant support from groups like the Council of Canadians and some unions -- but others are still sitting on their hands.

The debate about whether or not to accept violent tactics in demonstrations seems to have been settled, at least for the moment, by the danger of increased repression. As one protester said in New York City, "Just being on the streets is enough of a confrontation." Few of these youth activists have turned their attention to antiwar work.

On the international level, the aftermath of Sept. 11 has only strengthened the resolve of a growing global "movement of movements." Last February in Porto Alegre, Brazil, more than 60,000 people who met in the World Social Forum gave the lie to the notion that the global social-justice movement is in any way weakened.

In Canada, it is not so much Sept. 11 as the failures of the political left that dictate the need for new strategies. A new generation of activists is demanding a much more democratic, open and bottom-up organizing process, as well as more militant tactics. Globally, the politics of the new left are focusing on participatory democracy, environmental sustainability and global equity. And the major barriers to those goals are U.S. military and foreign policy, and U.S. economic policy as reflected in the World Bank and the International Monetary Fund. The reasons to fight are as strong as they've ever been.

Judy Rebick is the publisher of www.rabble.ca and the author of Imagine Democracy. This article was originally published in The Globe and Mail.

 

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