A grandeza de Pasolini: sabia ver mais longe

Ele intuiu antecipadamente temas e problemas da época presente

 

 


Franco Berardi Bifo
Indymedia Italia

21 de outubro de 2005

Tradução Imediata

Nos meus anos de adolescência, eu tinha visto "O Evangelho segundo Mateus" e "Teorema", mas Pier Paolo Pasolini irrompeu no meu imaginário de rapaz de dezoito anos, em 1968, quando a revista L'Espresso publicou a famosa poesia sobre a batalha de Valle Giulia, na qual ele toma a defesa do policial contra o estudante contestador, filhinho de papai.

Com as categorias de que eu dispunha na época, etiquetei Pasolini de populista, mesmo sabendo do fascínio de sua coragem intelectual e de seu anticonformismo. Em 1974, lia as cartas a Gennariello, que Pasolini publicava no Corriere della Sera. Eram cartas a um mítico rapazinho da Itália autêntica, que estava desaparecendo, cartas através das quais o poeta queria salvar a autenticidade de uma alma popular imaginária. Eu o lia e o achava antipático. Aquele homem taciturno e fugidio me fascinava, mas o sentia distante, juiz impiedoso de uma realidade que me parecia, ao contrário, cheia de possibilidades.

Havia em seus escritos a aspereza de quem se sente traído pela incidência caótica de fenômenos inovativos nos costumes, na tecnologia, no imaginário. E havia a nostalgia de um tempo mitológico, de uma passado de imaginada integridade. A modernidade o irritava. E, sobretudo (isso era o que eu mais desaprovava, no meu coração), não queria ver como dentro dos comportamentos juvenis ocorria uma mutação heterogênea, diferenciada, aberta a múltiplos e imprevisíveis êxitos.

Pasolini via emergir um novo fascismo de mutação tecnológica, da mutação antropológica, que se delineava com a difusão da televisão e do consumos de massa.

"O fascismo — escrevia Pasolini em um artigo publicado no Corriere em dezembro de 1973 — não foi, substancialmente capaz nem de atingir a alma do povo italiano: o novo fascismo, através de seus novos meios de comunicação e de informação (especialmente a televisão) não só a atingiu, mas a dilacerou, violou, estragou para sempre".

A nostalgia humanista de Pasolini tinha muitos elementos em comum com o estilo de pensamento que provinha da Escola de Frankfurt (sobretudo de Herbert Marcuse, que era muito lido, naqueles anos). A perspectiva dos participantes dessa Escola mostrava uma sociedade integrada, dominada pelos modelos de consumo homologados, incapaz de reação política e cultural.

Mas a minha geração estava vivendo uma experiência muito diferente daquela que os teóricos da integração neocapitalista estavam descrevendo: a experiência de uma ruptura do conformismo consumista, o esmigalhar da homogeneidade social, o emergir das lutas autônomas dos jovens operários. Lá onde os membros da Escola de Frankfurt viam a afirmação de um materialismo homologador, Tronti via a formação de "uma rude raça pagã, sem fé, sem ideais, sem ilusões" que teria conduzido o ataque contra a exploração e, desse modo, desvendado o caráter desumano da transformação de tudo em mercadoria.

Tronti contra Marcuse: essas eram as coordenadas da minha orientação no pensamento político daquela época.

Uma questão similar eu encontrava no debate literário italiano daqueles anos, que opunha a Pasolini os escritores da neo-vanguarda experimental. Balestrini, Eco, Pagliarani, Barilli procuravam colher na inovação social e estética do neocapitalismo uma potencialidade, uma bifurcação possível.

Em certos aspectos, estava sendo reproposta a discussão que, algumas décadas antes, tinha oposto Benjamin a Adorno, onde o primeiro procurava nas novas tecnologias de comunicação, potencialidades e recursos que o segundo considerava canceladas pela massificação, pela perda da aura. Por isso, no começo dos anos 70, eu via Pasolini como um nostálgico de uma época passada, um corajoso estimulante e fascinante reacionário.

Não me arrependo, que fique bem claro, daquela minha leitura juvenil. Tinha entendido alguma coisa, mas não tinha entendido o essencial. Comecei a compreender o essencial de Pasolini depois de 1977, depois da explosão do movimento daquilo que nós chamávamos então de proletariado juvenil. Aquele movimento tinha, de certo modo, procurado inverter a sua visão. Nós partíamos daquelas formas de vida que Pasolini considerava "fascistas", homologadoras, partíamos das formas de vida que outros condenavam como bárbaras porque naquela barbárie procurávamos introduzir a ironia e a autonomia e a crítica prática. Queríamos coligar a energia barbárica daquilo que o movimento operário etiquetava como sub-proletariado às lutas autônomas dos operários. Queríamos fazer da leitura um jogo selvagem de liberação da criatividade.

Ao consumismo, tínhamos reagido com a idéia de uma reapropriação feliz e irônica das mercadorias, ao invés de condená-lo em nome de qualquer integridade saudosista. Nesse sentido, estávamos no mesmo lado de Pasolini, mas ao seu Gennariello não dizíamos: permaneça antigo, se quiser ser humano. Dizíamos sobretudo: desafie a modernidade para extrair novos horizontes de humanidade.

Depois as coisas aconteceram do jeito que foi. Nem todas na forma como tínhamos pensado. E depois de 1977, a minha perspectiva foi mudando aos poucos. Comecei a entender uma coisa que tinha me escapado antes, e que era fundamental: o olhar de Pasolini não era aquele de um crítico político, mas era o olhar de longo alcance do antropólogo. O que ele entrevia era uma maturação mais longa e mais profunda daquela que nós tínhamos antecipado. Não quero dizer que ele estava certo e nós errados, tínhamos visto rostos diferentes do mesmo processo. Pasolini tinha compreendido antecipadamente que o poder da mutação tecnológica estava destinada a prevalecer sobre as culturas libertárias e igualitárias que efetivamente constituíam o ponto de chegada da inteira tradição humanista.

Pasolini se tinha colocado, desse modo, fora do tempo, mas, lamentavelmente, aquele seu ‘fora do tempo’ significava uma antecipação do tempo. Ele tinha entendido que frente à midiatização, acontece algo que diz respeito ao sensorial humano, à relação entre o imaginário e a imaginação, e que nessa mutação, a política não tem muito a ver, a ação voluntária pode não ser eficaz, e ele tinha pressentido a marginalização pela qual o intelectual estava destinado a se tornar vítima. Tinha pressentido muito da época presente.

No ano 2000, por ocasião dos 25 anos da morte de Pasolini, o diretor Guido Chiesa realizou um filme que foi mostrado pelo canal Telepiù, titulado "testes para um massacre". Um certo número de rapazes se apresentava em frente à câmera de tv para um teste para um filme sobre Pier Paolo Pasolini, e a cada um deles era pedido se teriam aceitado de fazer parte de cenas repulsivas, como comer merda e se mostrar em atitudes não propriamente decorosas. As respostas dos garotos eram a melhor (e a mais desesperadora) confirmação imaginável à previsão do escritor. Conformismo, caretice, insegurança se misturavam ao servilismo com relação ao poder (representado pela telecâmera), com a hipócrita disponibilidade de fazer qualquer coisa, se se trata de trabalho, se se trata de televisão, se se trata de ganhar um pouco de dinheiro, de aparecer um pouco. O filme de Guido Chiesa (que, infelizmente, passou um pouco em surdina, mas mereceria ser visto) aparece como um discurso lúcido e sem muitas esperanças sobre a primeira geração pós-humana. Mas quem somos nós, homens do século XX, homens do passado, para julgar o imprevisível que está destinado a vir com o pós-humano?

 

 

 

La grandezza di Pasolini: sapeva vedere più lontano

Franco Berardi Bifo

Con anticipo intuì temi e problemi dell'epoca presente

Negli anni dell'adolescenza avevo visto "Il Vangelo secondo Matteo" e "Teorema", ma Pier Paolo Pasolini irruppe nel mio immaginario di diciottenne solo nel 1968, quando L'Espresso pubblicò la famosa poesia sulla battaglia di Valle Giulia, quella in cui prende le difese del poliziotto contro lo studente contestatore figlio di papà.

Con le categorie di cui disponevo allora etichettai spregiativamente Pasolini come populista, pur subendo il fascino del suo coraggio intellettuale, e del suo anticonformismo. Nel 1974 leggevo le lettere a Gennariello che Pasolini pubblicava sul Corriere della sera. Erano lettere a un mitico ragazzino dell'Italia autentica che stava scomparendo, lettere con cui il poeta voleva salvare l'autenticità di un'anima popolare immaginaria. Lo leggevo e mi era antipatico. Quell'uomo taciturno e schivo mi affascinava, però lo sentivo lontano, giudice arcigno di una realtà che a me appariva invece carica di possibilità.

C'era nei suoi scritti l'asprezza di chi si sente tradito dall'incedere caotico di fenomeni innovativi nel costume, nella tecnologia, nell'immaginario. E c'era la nostalgia di un tempo mitologico, di un passato di immaginaria integrità. La modernità lo irritava. E soprattutto (questo era ciò che più gli rimproveravo in cuor mio) non voleva vedere come dentro i comportamenti giovanili era all'opera una mutazione eterogenea, differenziata, aperta ad esiti molteplici e imprevedibili.

Pasolini vedeva emergere un nuovo fascismo dal mutamento tecnologico, dalla mutazione antropologica che si delineava con la diffusione della televisione e dei consumi di massa.

´Il fascismo - scriveva Pasolini in un articolo uscito sul Corriere nel dicembre del 1973 - non è stato sostanzialmente in grado nemmeno di scalfire l'anima del popolo italiano: il nuovo fascismo, attraverso i nuovi mezzi di comunicazione e di informazione (specie la televisione) non solo l'ha scalfita, ma l'ha lacerata, violata, bruttata per sempreª.

La nostalgia umanistica di Pasolini aveva molti elementi in comune con lo stile di pensiero che proveniva dalla Scuola di Francoforte (soprattutto da Herbert Marcuse che in quegli anni era molto letto). La prospettiva dei francofortesi mostrava una società integrata, dominata dai modelli di consumo omologati, incapace di reazione politica e culturale.

Ma la mia generazione stava vivendo un'esperienza molto diversa da quella che i teorici dell'integrazione neocapitalista andavano descrivendo: l'esperienza di una rottura del conformismo consumista, lo sgretolamento dell'omogeneità sociale, l'emergere di lotte autonome dei giovani operai. Laddove i francofortesi vedevano l'affermarsi di un materialismo omologante, Tronti vedeva formarsi ´una rude razza pagana senza fede senza ideali senza illusioniª che avrebbe condotto l'attacco contro lo sfruttamento e in questo modo svelato il carattere disumano della mercificazione.

Tronti contro Marcuse: queste erano le coordinate del mio orientarmi nel pensiero politico di allora.

Una questione simile ritrovavo nel dibattito letterario italiano di quegli anni che opponeva a Pasolini gli scrittori della neoavanguardia sperimentale. Balestrini, Eco, Pagliarani, Barilli cercavano di cogliere nell'innovazione sociale ed estetica del neocapitalismo una potenzialità, una biforcazione possibile.

Si stava riproponendo per certi aspetti la discussione che qualche decennio prima aveva opposto Benjamin ad Adorno, dove il primo cercava nelle nuove tecnologie di comunicazione potenzialità e risorse che il secondo considerava cancellate dalla massificazione, dalla perdita di aura. Perciò in quei primi anni Settanta vedevo Pasolini come il nostalgico di un'epoca passata, un coraggioso stimolante affascinante reazionario.

Non mi pento, sia ben chiaro, di quella mia lettura giovanile. Avevo capito qualcosa, ma non avevo capito l'essenziale. Ho cominciato a capire l'essenziale di Pasolini dopo il '77, dopo l'esplosione del movimento di quello che noi chiamavamo allora proletariato giovanile. Quel movimento aveva in un certo senso cercato di rovesciare la sua visione. Noi partivamo proprio da quelle forme di vita che Pasolini considerava "fasciste", omologanti, partivamo da forme di vita che altri condannavano come barbariche, perché in quella barbarie cercavamo di introdurre l'ironia e l'autonomia e la critica pratica. Volevamo collegare l'energia barbarica di quello che il movimento operaio etichettava come sottoproletariato alle lotte autonome degli operai. Volevamo fare della letteratura un gioco selvaggio di liberazione della creatività.

Al consumismo avevamo reagito con l'idea di una riappropriazione felice ed ironica delle merci, piuttosto che condannarlo in nome di qualche passatista integrità. In questo senso eravamo sullo stesso terreno di Pasolini, ma al suo Gennariello non dicevamo: rimani antico se vuoi essere umano. Dicevamo piuttosto: sfida la modernità per tirarne fuori nuovi orizzonti di umanità.

Poi le cose sono andate come sono andate. Non tutte nel verso che avevamo pensato noi. E dopo il '77 la mia prospettiva si è poco alla volta modificata. Ho cominciato a capire una cosa che prima mi era sfuggita, e invece era fondamentale: lo sguardo di Pasolini non era quello del critico politico, ma era lo sguardo lungo dell'antropologo. Quella che lui intravedeva era una mutazione più lunga e più profonda di quella su cui avevamo posto lo sguardo noi. Non voglio dire che lui avesse ragione e noi torto, avevamo visto facce diverse dello stesso processo. Pasolini aveva capito con anticipo che la potenza della mutazione tecnologica era destinata a prevalere sulle culture libertarie ed egualitarie che effettivamente costituivano il punto di arrivo dell'intera tradizione umanistica.

Pasolini si era messo in questo modo fuori tempo, ma purtroppo quel suo fuori tempo significava un anzitempo. Aveva capito che di fronte all'incedere della mediatizzazione accade qualcosa che concerne il sensorio umano, il rapporto tra immaginario e immaginazione, e che in questa mutazione la politica non c'entra molto, l'azione volontaria può non essere efficace, e aveva presentito l'emarginazione di cui l'intellettuale era destinato a diventare vittima. Aveva presentito molto dell'epoca presente.

Nel 2000, in occasione del venticinquennale della morte di Pasolini, il regista Guido Chiesa realizzò un filmato che andò in onda su Telepiù, intitolato "provini per un massacro". Un certo numero di ragazzi si presentavano davanti alla telecamera per un provino per un film su Pier Paolo Pasolini, e a ciascuno di loro veniva chiesto se avrebbero accettato di fare scene disgustose, come mangiare merda e mostrarsi in atteggiamenti non proprio dignitosi. Le risposte dei ragazzi erano la migliore (la più disperante) conferma immaginabile alla previsione dello scrittore. Conformismo, perbenismo, insicurezza si mescolavano con il servilismo nei confronti del potere (rappresentato dalla telecamera), con l'ipocrita disponibilità a fare qualsiasi cosa se si tratta di lavoro, se si tratta di televisione, se si tratta di guadagnare un po' di denaro e di apparire un po'. Il film di Guido Chiesa (che purtroppo è passato un po' sotto silenzio e meriterebbe di essere rivisto) vien fuori come un discorso lucido e senza molte speranze sulla prima generazione postumana. Ma chi siamo noi, uomini del ventesimo secolo, uomini del passato, per giudicare l'imprevedibile che dal postumano è destinato a venire?

 

 

http://italy.indymedia.org/news/2005/10/903049.php

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