As tecnologias HyPE que podem melhorar as capacidades humanas, também poderiam ser manipuladas para conseguir o efeito inverso.
A Convenção para a Diversidade Biológica ainda não foi capaz de resolver os problemas que surgiram durante a Conferência do Rio de Janeiro.

"RAFI" VIRA "ETC" MANTENDO AÇÃO PELA BIODIVERSIDADE



A Fundação Internacional para o Progresso Rural (RAFI), que há dezesseis anos dedica-se à conservação e ao avanço sustentável da diversidade cultural e ecológica, assim como aos direitos humanos, passou a chamar-se "ETC Group" (pronuncia-se "ETCÉTERA"), que significa "Grupo de Ação sobre a Erosão, Tecnologia e Concentração". Apesar da nova denominação, o grupo continuará apoiando projetos socialmente responsáveis de tecnologias úteis às populações mais pobres e marginalizadas, além de monitorar questões ligadas ao controle internacional e ao poder das corporações.

O grupo ETC trabalha em parceria com organizações da sociedade civil, promovendo a autoconfiança cooperativa e sustentável no interior de sociedades em desvantagem, fornecendo informações e análises das tendências e alternativas socioeconômicas e tecnológicas. Esse tipo de trabalho requer ações conjuntas nos vários fóruns: na comunidade, e em nível regional e global.

A força do grupo ETC está na pesquisa e análise de informações tecnológicas (especialmente, mas não exclusivamente os recursos genéticos das plantas, as biotecnologias e [em geral] a diversidade biológica), e no desenvolvimento de opções estratégicas relacionadas às ramificações socioeconômicas das novas tecnologias.
 
O novo site do ETC (ex-RAFI), ilustrado pelo excelente desenhista Eric Drooker,
disponibiliza farto material de ação ambiental direta, relatórios, boletins, publicações pontuais, como por exemplo o indispensável balanço "A NOVA AGENDA DA GENÔMICA" (Os HyPEs e o Genoma Humano: A doença da divergência). O relatório argumenta que o principal interesse do setor farmacêutico no "Livro da Vida" e os progressos paralelos nas neurociências reside no desenvolvimento de novos medicamentos e terapias dirigidas a "pessoas que estão bem de saúde", em confronto a "pessoas doentes". O estudo também demonstra que as estratégias das empresas centradas nos progenitores poderiam eliminar o "diferente" das espécies humanas, a favor de uma "norma" multicultural.

"A Nova Agenda da genômica — Um Epílogo Político ao Livro da Vida: Atualização sobre as Multinacionais Farmacêuticas e o Genoma Humano", pode ser encontrado em sua versão integral no website do ETC: http://www.etcgroup.org/article.asp?newsid=249

Traduzimos abaixo alguns dos seus tópicos principais.

Clonagem — um cordeiro com pele de lobo? A nova agenda da genômica revela pouco interesse pela clonagem humana. Desde que o carneiro "Dolly" apareceu em nossas telas de TV, quase cinco anos atrás, as preocupações do público com engenharia genética na medicina tem se dirigido às implicações morais e técnicas sobre o que as companhias farmacêuticas têm considerado como o seu pequeno nicho de mercado. Enquanto isso, avanços no mapeamento do genoma humano têm desovado mercados amplamente mais lucrativos, muito mais imediatos e menos controversos do que a clonagem ou a pesquisa de células-tronco. As empresas têm uma agenda para a genômica completamente nova.

genômica da entreperna ao crânio: a nova agenda da genômica engloba desde a reprodução humana às manipulações neurais — da entreperna ao crânio. Particularmente preocupantes são os novos HyPES — remédios para Melhoria do Desempenho Humano, que têm o objetivo de melhorar o desempenho de indivíduos em todas as áreas da vida. Todavia, as mesmas tecnologias HyPE que podem melhorar as capacidades humanas, também poderiam ser manipuladas para conseguir o efeito inverso, em inimigos ou dissidentes civis. Que posição deve ser tomada pelos governos e ativistas, neste ambiente político modificado?

Prática de alvo: a nova agenda da genômica tem como alvo os diferentes e os dissidentes. Povos indígenas de regiões remotas constituem um alvo porque suas linhas de células podem conter variações patenteáveis que poderiam ser usadas para diagnosticar ou "curar" desordens genéticas. Similarmente, populações com doenças ou deficiências são vistas pelo setor seja como "cura" seja como "clientes". A variação genética dessas populações deve ser estudada para produzir-se terapias genéticas comerciais, e esses mesmos grupos "diferentes" — ou seus progenitores — são também os consumidores finais da pesquisa. Os pobres também são alvo da pesquisa. Empresas de genômica têm se concentrado em populações da China, por exemplo, porque são política e economicamente fracas para oferecer resistência. Como sempre, são as mulheres de grupos com deficiências o foco primário para estudo e experimentação.
Nunca "melhores" clientes: o mais inquietante, talvez, é que a nova ênfase do setor farmacêutico são as pessoas que estão "bem", em confronto com as pessoas que estão "doentes". Pessoas saudáveis são, simplesmente, melhores consumidores. Elas permanecem no emprego, não morrem facilmente, nem geram muita pena com relação aos altos custos de seus medicamentos e, melhor de tudo, nunca ficam realmente "melhor". Os medicamentos HyPE "brincam com a cabeça" das pessoas saudáveis e seus empregadores. Um ambiente de trabalho carente — que causa estresse ou esgotamento físico — pode ser "medicado" através de custos que sejam arcados pelo funcionário e não pelo empregador.

O Comunicado fornece uma série de exemplos de pesquisas de companhias em curso, com relação aos HyPEs e suas aplicações militares. Os HyPEs podem ser usados para amansar as tropas ou incapacitar o inimigo. Muitos dos novos desenvolvimentos em genômica e neurociências são classificados na categoria de "armas não-letais", que poderiam ser usadas para pacificar protestantes e manter o controle das massas em momentos de agitação urbana. É necessário que a ONU tome uma ação: até o presente, a Organização Mundial da Saúde (OMS) tem se esquivado dessas questões. A Assembléia da OMS tem enveredado pelo caminho cansado e batido de condenar a clonagem reprodutiva, mas tem falhado em investigar todo o horizonte das novas tecnologias da genômica. Além disso, a Convenção para a Diversidade Biológica ainda não foi capaz de resolver os problemas irresolutos que surgiram durante a Conferência do Rio de Janeiro, quase dez anos depois, com relação à colocação política da diversidade genética humana. Embora a UNESCO tenha adotado uma fraca Declaração do Genoma Humano e Direitos Humanos em 1997, o documento não aborda questões importantes como a propriedade intelectual, além de ser o lugar errado para a elaboração de um documento tão importante. O documento deveria ser transferido para a Comissão de Direitos Humanos da ONU e desenvolvido em uma convenção com força de lei.

Por cinco anos, as preocupações relativas à engenharia genética têm estado centradas nas colheitas e alimentos GM. Contudo, os avanços no mapeamento do genoma humano têm desovado novas oportunidades para o setor farmacêutico. Enquanto as perspectivas para a clonagem humana e as terapias baseadas nas células-tronco ocupam as manchetes e desviam a nossa atenção, as empresas estão em busca de agendas mais estratégicas. Embora a maioria se oponha à clonagem reprodutiva, a opinião e a política públicas tem sido bastante ‘brandas’. O mais recente e lucrativo mercado para o setor consiste nos chamados ‘HyPEs’: Human Performance Enhancement drugs, ou seja, remédios ou medicamentos para a Melhoria do Desempenho Humano — que nem sequer fazem parte da agenda política. O presente número do Comunicado do ETC examina os últimos desenvolvimentos, assim como quem será mais afetado.


Impacto: a clonagem reprodutiva nunca será mais do que um nicho de mercado para os aflitos e desesperados. Similarmente, as "bio-bombas’ que têm como alvo minorias étnicas ou raciais — apesar de plausíveis e desprezíveis — raramente apresentarão um melhor desempenho do que as armas convencionais. O grosso do capital (e do risco) reside nas terapias e medicamentos denominados HyPEs, que tornam possível controlar as divergências e erradicar os "diferentes". O conceito de "Melhoria" pressupõe que exista um consenso sobre quais são as qualidades e características humanas "aceitáveis" e "inaceitáveis", além de reduzir todas as respostas sociais relativas às diferenças humanas a soluções meramente médicas. Igualmente preocupante, as tecnologias HyPES nas mãos dos militares podem transformar-se em tecnologias incapacitadoras.


Fóruns: nenhum. Até o presente, a Organização Mundial da Saúde (OMS) tem se esquivado dessas questões. A Assembléia da OMS tem enveredado pelo caminho cansado e batido de condenar a clonagem reprodutiva, mas tem falhado em investigar todo o horizonte das novas tecnologias da genômica. Além disso, a Convenção para a Diversidade Biológica ainda não foi capaz de resolver os problemas irresolutos que surgiram durante a Conferência do Rio de Janeiro, quase dez anos depois, com relação à colocação política da diversidade genética humana. Embora a UNESCO tenha adotado uma fraca Declaração do Genoma Humano e Direitos Humanos em 1997, o documento não aborda questões importantes como a propriedade intelectual, além de ser o lugar errado para a elaboração de um documento tão importante. O documento deveria ser transferido para a Comissão de Direitos Humanos da ONU e desenvolvido em uma convenção com força de lei.


Política: apesar de parecer que está "chovendo no molhado", uma legislação abrangente sobre a clonagem é um teste de tornassol para outras questões de genômica. Se os governos mundiais não se enquadrarem, há pouca esperança de sossego. Dito isso, o campo de batalha real será formado em torno das terapias e medicamentos HyPE. É hora que as Nações Unidas realmente tratem da agenda da genômica. Em seguida ao debate Rio+10 em setembro de 2002 na África do Sul, a ONU deveria convocar uma seção especial da Assembléia Geral sobre genômica e Recursos Genéticos (humanos e outros), com o intuito de tratar de questões não resolvidas e designar responsabilidades institucionais.

Referências ETC:

http://www.etcgroup.org/about_staff.asp

Biodiversidade Ambiental

biodiv<info@imediata.com>