...fui
ao diálogo com o Ratzinger levando duas maletas contendo
100.000 subscrições, do mundo inteiro, desde a Sibéria,
Coréia, bispos, milhares de cristãos. E, quando
comecei, disse: "Cardeal, não estou sozinho aqui,
estou com estes 100.000". "Vocês é que
manipularam assinaturas!" "Como, manipularam? Um bispo
que é lá da cidade de Zagorsky, na Rússia,
como é que vai ter contato comigo?" Quer dizer, a
Teologia da Libertação não era causa minha,
é a causa de uma geração, é um movimento.
E saí convencido, devido à influência dos
dois cardeais que me acompanharam, que o problema terminaria ali.
E qual não foi a minha surpresa quando, no dia 11 de maio,
todo paramentado para entrar na missa dos trabalhadores em Petrópolis,
toca o telefone, era do Vaticano. Atendo e dizem: "Você
se considere imediatamente demitido da cátedra de teologia,
deposto da Revista Eclesiástica Brasileira, da coordenação
editorial da Vozes, não pode mais falar, viajar, nem dar
aula. Esta é a punição". Eu disse: "Então
apelo ao direito canônico. Só entro na punição
quando tiver os documentos na mão, porque oral não
vale". "Então, os documentos seguirão."
E desligaram. Aí vieram os documentos.
...junto
comigo foram dom Paulo Evaristo e dom Ivo Lorscheiter, que era
presidente da CNBB. Dom Paulo havia sido meu professor e era cardeal.
Chegamos os três juntos no Vaticano, o cardeal Ratzinger
ficou sumamente irado e disse: "O fato de convocarmos um
teólogo aqui já é uma condenação
implícita. E esse teólogo, para escândalo
dos cristãos, vem acompanhado de Castor e Pólux,
as duas divindades pagãs, como anjos da guarda que o acompanham".
Eu disse: "Cardeal, com licença, nós somos
cristãos, venho acompanhado de São Cosme e São
Damião e não de Castor e Pólux"
que sãos os equivalentes pagãos de Cosme e Damião.
(risos)..
.Dom
Paulo disse ao Ratzinger: "Se o senhor quiser, preparo tudo
em São Paulo, o senhor vai conhecer as periferias, vai
com os agentes da pastoral e, depois de ver tudo isso, vamos sentar
e falar sobre a Teologia da Libertação, porque,
se o senhor não vir isso, não vai entender os teólogos".
O cardeal respondeu: "Temos obrigações com
a Igreja universal, não podemos fazer partido na Igreja
local. Somos responsáveis por todas as igrejas, nossa sede
de pensamento é aqui". Aí me levantei e disse:
"Cardeal, por favor, olhe esta janela, toda de ferro quadriculado.
Atrás dessa janela de ferro quadriculado não se
faz Teologia da Libertação, porque o mundo já
vem traduzido nessa quadratura. Tem de sentir na pele uma experiência
de pobreza, porque daí nasce a teologia como o grito dos
pobres". A Teologia da Libertação é
um grande esforço de uma parte dos cristãos de fazer
do Evangelho e da fé cristã um fator de mobilização
social.
.
JOÃO
PAULO II
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