Durões contra o crime, mas nem aí com as causas do crime, desde que elas tragam grana;

Pesquisa mostra relação direta entre junk food e comportamento violento. Mas os governos estão em conluio com o setor.

 

 

 


George Monbiot
The Guardian

02 de maio de 2006

Tradução Imediata

A televisão causa crimes? A idéia de que as pessoas copiam a violência que assistem é debatida indefinidamente pelos criminologistas. Mas esta coluna vai tratar de idéia mais singular e, talvez, mais interessante: se o crime salta pra fora da caixa, os responsáveis não seriam tanto os programas como o material veiculado entre eles. A idéia é de que a violência emerge daquelas imagens abençoadas da vida em família, destituídas de toda ambigüidade, que vemos nos anúncios publicitários.

Permitam-me começar, na construção desse estranho argumento, com um estudo publicado na útlima edição dos Archives of Pediatrics and Adolescent Medicine (Arquivos de Medicina Pediátrica e do Adolescente). Ele fornece um suporte empírico para a alegação de que as crianças que assistem mais televisão comem mais dos alimentos que são anunciados. "Cada hora a mais em frente à televisão", o estudo revelou, "foi associada com um consumo adicional de 167 calorias por dia". A maioria dessas calorias extras estavam contidas na junk food: bebidas borbulhantes, comidas crocantes, biscoitos, doces, burgers e "nuggets" (N. do T.: bolinhos fritos) de galinha. Assistir a televisão, reportou o estudo, "é inversamente associado ao consumo de frutas e legumes".  

Não existe mais qualquer debate sério sobre o que a dieta da televisão provoca em nosso corpo. Uma pesquisa do governo publicada no mês passado mostra que a proporção de crianças nas escolas secundárias da Inglaterra que é clinicamente obesa quase que dobrou em 10 anos. Hoje, 27% das meninas e 24% dos meninos entre os 11 e os 15 anos são vítimas desse problema, o que significa ser muito mais provável que terão diabetes e morrerão antes de completarem 50 anos. Mas a questão mais interessante é o que essa dieta pode causar na mente das pessoas. Agora, há um grande volume de estudos que sugerem que o cérebro é tão danificado quanto o coração ou o pâncreas. Entre as muitas associações propostas há uma relação entre a má alimentação e o comportamento violento e antisocial.

Os resultados mais espetaculares foram aqueles reportados no Journal of Nutritional and Environmental Medicine em 1997. Os pesquisadores tinham conduzido um experimento controlado, duplo-cego, numa prisão para infratores crônicos com idade entre os 13 e 17 anos. Muitos dos rapazes tinham deficiência de certos nutrientes. Eles consumiam, em média, somente 63% do ferro, 42% do magnésio, 39% do zinco, 39% da vitamina B12 e 34% do folate da quantidade de consumo diária recomendada pelo governo dos EUA. Os pesquisdores trataram da metade dos infratores com cápsulas contendo os nutrientes que faltavam, e a outra metade com placebos. Eles também aconselharam todos os infratores participantes da pesquisa para melhorarem seus hábitos alimentares. O número de incidentes violentos causados por presidiários do grupo de controle (aqueles que tomavam placebos) caiu 56% e 80% para o grupo experimental. Mas entre os infratores do grupo placebo que se recusaram de melhorar suas dietas, não houve qualquer redução. Os pesquisadores também ligaram os sujeitos a um eletroencefalógrafo para registrar os padrões das ondas cerebrais e encontraram um maior decréscimo nas anormalidades 13 semanas depois do início da ingestão dos suplementos.  

Uma pesquisa similar, publicada em 2002 pelo British Journal of Psychiatry, descobriu que ministrados os suplementos de vitaminas, minerais e ácidos graxos naturais para os priosioneiros adultos jovens, deficientes dos mesmos, as infrações disciplinares caíram em 26% para o grupo experimental e não se alteraram parra o grupo de controle. Pesquisadores na Finlândia acharam que todos os 68% dos infratores violentos, testados durante outro estudo, sofriam de hipoglicemia reativa : um nível de tolerância anormal à glicose causado por consumo excessivo de açúcar, carboidratos e estimulantes, como a cafeína.

Em março deste ano, Bernard Gesch, o autor que encabeçou o relatório de 2002, disse à revista The Ecologist que: "ter uma dieta ruim é, agora, um melhor fator de previsão de comportamento violento futuro que de comportamento violento passado... Da mesma forma, um diagnóstico de psicopatia, geralmente comprendida como sendo um melhor previsor que um passado de criminalidade, ainda está muito atrás do que pode ser predito só de se olhar para o que uma pessoa come".   

Por que deveria surpreender esta relação entre dieta e comportamento? Além dos efeitos psicológicos de se comer muito açúcar (aparente para qualquer pessoa que tenha ido a uma festinha de crianças), o cérebro, cuja função depende de processos bioquímicos precisos, não pode funcionar adequadamente com insuficientes alimentos crus. Os mais importantes deles parecem ser os ácidos graxos insaturados (especialmente os de tipo ômega 3), o zinco, o magnésio, o ferro, o folate e as vitaminas B, justamente aquelas com relação às quais prisioneiros do estudo de 1997 eram mais deficientes.

Um relatório publicado no final do ano passado pelo grupo de pressão Sustain, explicou o que parece ser uma relação clara entre a deterioração das dietas e o crescimento da depressão, dos problemas comportamentais, do Alzheimer, além de outras formas de doenças mentais. Sessenta por cento do peso constante do cérebro é gordura, "única no corpo, por ser predominantemente composta de ácidos graxos altamente insaturados". O zinco e o magnésio afetam tanto o seu metabolismo de lipídios quanto a sua produção de neurotransmissores - as substâncias químicas que permitem às células dos nervos comunicarem entre si.

Quanto mais junk food se come, tanto menos lugar se tem para alimentos que contêm as substâncias químicas de que o cérebro necessita. Isso não significa que os anunciantes de comida são os únicos responsáveis pelo declínio da quantidade de nutrientes que consumimos. Como mostra o novo livro de Graham Harvey, We Want Real Food (Queremos comida real), a agropecuária industrial, dependente de fertilizantes artificiais, tem drasticamente reduzido o conteúdo de minerais dos vegetais, ao mesmo tempo em que a qualidade da carne e do leite também diminuiu. Esses estudos também não sugerem que uma dieta pobre é a única causa da criminalidade e do comportamento antisocial. Mas os estudos que li sugerem que qualquer governo que alega levar a sério a criminalidade deveria começar a ser severo com os anunciantes.

Ao contrário, nosso governo relaxa enquanto o órgão regulador da televisão, a Ofcom, pactua com a indústria alimentar. Enquanto esboçava seus planos para controlar os anunciantes de junk food, a Ofcom teve 29 reuniões com produtores e publicitários do setor alimentar, e apenas quatro com grupos de consumidores e grupos voltados à saúde. Os resultados podem ser vistos no documento de consulta publicado. Este propõe não fazer nada a respeito dos patrocinadores de programas e anúncios que as crianças mais novas assistem com mais freqüência. Quais? Reporta-se que os programas mais populares da ITV entre as crianças de 2 a 9 anos são: Dancing on Ice, Coronation Street e Emmerdale, mas a Ofcom planeja regular só os programas feitos "especificamente" para as crianças com menos de nove anos de idade. Alega que regulamentos mais severos seriam demasiado custosos ao setor. Para menter o valor das ações dos patrocinadores comerciais, a Ofcom está pronta a sacrificar o bem-estar físico e psicológico de nossas crianças.

Em âmbito europeu, o choque é até mais óbvio. Na semana passada, Viviane Reding, chefe da comissão para a mídia européia, falou a um grupo de produtores de programas sobre seus planos de permitir a colocação de produtos nos programas de TV europeus (isso significa que os anunciantes teriam a permissão de promover suas mercadorias durante, e não somente entre os programas). Ela reclamou que sua proposta foi atacada pelo parlamento europeu. "Vocês têm que lutar se quiserem manter a idéia", disse ela aos executivos de TVs. "Gostaria de deixar bem claro que preciso do apoio de vocês nisso."

Eu passei a maior parte da semana passada tentando descobrir se alguém do Home Office está levando a sério a pesquisa que estabelece uma relação entre dieta e crime. No passado, o órgão insistiu serem necessários estudos adicionais, embora não os tenha financiado. Primeiro, meu pedido se deparou com a incredulidade, depois foi fortemente atacado. Durões contra o crime, mas nem aí com as causas do crime.

www.monbiot.com

© Guardian Newspapers Limited 2006

Tough on Crime, to Hell With the Causes of Crime if They Make Money

Research shows a direct link between junk food and violent behaviour. But governments are in cahoots with the industry

by George Monbiot

Published on Tuesday, May 2, 2006 by the Guardian / UK

 

Does television cause crime? The idea that people copy the violence they watch is debated endlessly by criminologists. But this column concerns an odder and perhaps more interesting idea: if crime leaps out of the box, it is not the programmes that are responsible as much as the material in between. It proposes that violence emerges from those blissful images of family life, purged of all darkness, that we see in the advertisements.

Let me begin, in constructing this strange argument, with a paper published in the latest edition of Archives of Pediatrics and Adolescent Medicine. It provides empirical support for the contention that children who watch more television eat more of the foods it advertises. "Each hour increase in television viewing," it found, "was associated with an additional 167 kilocalories per day." Most of these extra calories were contained in junk foods: fizzy drinks, crisps, biscuits, sweets, burgers and chicken nuggets. Watching television, the paper reported, "is also inversely associated with intake of fruit and vegetables".

There is no longer any serious debate about what a TV diet does to your body. A government survey published last month shows that the proportion of children in English secondary schools who are clinically obese has almost doubled in 10 years. Today, 27% of girls and 24% of boys between 11 and 15 years old suffer from this condition, which means they are far more likely to contract diabetes and to die before the age of 50. But the more interesting question is what this diet might do to your mind. There are now scores of studies suggesting that it hurts the brain as much as it hurts the heart and the pancreas. Among the many proposed associations is a link between bad food and violent or antisocial behaviour.

The most spectacular results were those reported in the Journal of Nutritional and Environmental Medicine in 1997. The researchers had conducted a double-blind, controlled experiment in a jail for chronic offenders aged between 13 and 17. Many of the boys there were deficient in certain nutrients. They consumed, on average, only 63% of the iron, 42% of the magnesium, 39% of the zinc, 39% of the vitamin B12 and 34% of the folate in the US government's recommended daily allowance. The researchers treated half the inmates with capsules containing the missing nutrients, and half with placebos. They also counselled all the prisoners in the trial about improving their diets. The number of violent incidents caused by inmates in the control group (those taking the placebos) fell by 56%, and in the experimental group by 80%. But among the inmates in the placebo group who refused to improve their diets, there was no reduction. The researchers also wired their subjects to an electroencephalograph to record brainwave patterns, and found a major decrease in abnormalities after 13 weeks on supplements.

A similar paper, published in 2002 in the British Journal of Psychiatry, found that among young adult prisoners given supplements of the vitamins, minerals and fatty acids in which they were deficient, disciplinary offences fell by 26% in the experimental group, and not at all in the control group. Researchers in Finland found that all 68 of the violent offenders they tested during another study suffered from reactive hypoglycaemia: an abnormal tolerance of glucose caused by an excessive consumption of sugar, carbohydrates and stimulants such as caffeine.

In March this year the lead author of the 2002 report, Bernard Gesch, told the Ecologist magazine that "having a bad diet is now a better predictor of future violence than past violent behaviour ... Likewise, a diagnosis of psychopathy, generally perceived as being a better predictor than a criminal past, is still miles behind what you can predict just from looking at what a person eats."

Why should a link between diet and behaviour be surprising? Quite aside from the physiological effects of eating too much sugar (apparent to anyone who has attended a children's party), the brain, whose function depends on precise biochemical processes, can't work properly with insufficient raw materials. The most important of these appear to be unsaturated fatty acids (especially the omega 3 types), zinc, magnesium, iron, folate and the B vitamins, which happen to be those in which the prisoners in the 1997 study were most deficient.

A report published at the end of last year by the pressure group Sustain explained what appear to be clear links between deteriorating diets and the growth of depression, behavioural problems, Alzheimer's and other forms of mental illness. Sixty per cent of the dry weight of the brain is fat, which is "unique in the body for being predominantly composed of highly unsaturated fatty acids". Zinc and magnesium affect both its metabolism of lipids and its production of neurotransmitters - the chemicals which permit the nerve cells to communicate with each other.

The more junk you eat, the less room you have for foods which contain the chemicals the brain needs. This is not to suggest that food advertisers are solely responsible for the decline in the nutrients we consume. As Graham Harvey's new book We Want Real Food shows, industrial farming, dependent on artificial fertilisers, has greatly reduced the mineral content of vegetables, while the quality of meat and milk has also declined. Nor do these findings suggest that a poor diet is the sole cause of crime and antisocial behaviour. But the studies I have read suggest that any government that claims to take crime seriously should start hitting the advertisers.

Instead, our government sits back while the television regulator, Ofcom, canoodles with the food industry. While drawing up its plans to control junk food adverts, Ofcom held 29 meetings with food producers and advertisers and just four with health and consumer groups. The results can be seen in the consultation document it published. It proposes to do nothing about adverts among programmes made for children over nine and nothing about the adverts the younger children watch most often. Which? reports that the most popular ITV programmes among two- to nine-year-olds are Dancing on Ice, Coronation Street and Emmerdale, but Ofcom plans to regulate only the programmes made specifically for the under-nines. It claims that tougher rules would cost the industry too much. To sustain the share values of the commercial broadcasters, Ofcom is prepared to sacrifice the physical and psychological wellbeing of our children.

At the European level, the collusion is even more obvious. Last week, Viviane Reding, the European media commissioner, spoke to a group of broadcasters about her plans to allow product placement in European TV programmes (this means that the advertisers would be allowed to promote their wares during, rather than just between, the programmes). She complained that her proposal had been attacked by the European parliament. "You have to fight if you want to keep it," she told the TV executives. "I would like to make it very clear that I need your support in this."

I spent much of last week trying to discover whether the Home Office is taking the research into the links between diet and crime seriously. In the past, it has insisted that further studies are needed, while failing to fund them. First my request was met with incredulity, then I was stonewalled. Tough on crime. To hell with the causes of crime.

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© Guardian Newspapers Limited 2006

 

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