Qual dos dois detergentes deixa a roupa mais branca?

O Poder Público na era do Império

 

 


Arundhati Roy

16 deagosto de 2004

Transcrição do discurso integral de Arundhati Roy em San Francisco, Califórnia, em 16 de agosto de 2004.

Copyright 2004 Arundhati Roy. Para obter permissão para reimprimir, contactar arnove@igc.org

Tradução Imediata

Fui solicitada para falar sobre "O Poder Público na Era do Império". Não tenho o costume de aceitar encomendas mas, por uma feliz coincidência, é exatamente sobre isso que gostaria de falar nesta noite.

Quando a linguagem é destroçada e esvaziada de significado, como podemos entender o que é "poder público"? Quando liberdade quer dizer ocupação, quando democracia significa capitalismo neoliberal, quando reforma quer dizer repressão, quando palavras como "capacitação" e "fazer a paz" nos congelam o sangue —então, "poder público" pode significar aquilo que se quiser que ele signifique. Uma máquina para ajudar a desenvolver bíceps, ou um produto de limpeza. Assim, a única coisa que precisarei fazer será definir "poder público" à medida em que prosseguirei nesse discurso, do modo que melhor me convir.

Na Índia, a palavra "público" é agora uma palavra hindi. Quer dizer "pessoas". Em hindi, temos a palavra "sarkar" e a palavra "público", o governo e o povo. Inerente a esse uso é a pressuposição de que governo é algo bem distinto das "pessoas". Essa distinção tem a ver com o fato de que a luta pela liberdade, na Índia, apesar de magnífica, não foi de modo algum revolucionária. A elite da Índia calçou-se fácil e elegantemente nos sapatos dos imperialistas britânicos. Uma sociedade profundamente empobrecida, essencialmente feudal, tornou-se um estado e uma nação independente e moderna. Mesmo hoje em dia, depois de cinqüenta e sete anos, os verdadeiramente vencidos encaram o governo como "mai-baap", ou seja, como o pai e a mãe provedores. Aqueles que são de alguma forma mais radicais, os que ainda têm fogo no estômago, vêem o governo como "chor’’, o ladrão, aquele que arranca ou arrebata todas as coisas.

Seja como for, para a maioria dos indianos, "sarkar" é algo muito distinto de "público". Entretanto, à medida em que se sobe na escada social, a distinção entre "sarkar" e "público" fica embaçada. A elite indiana, como a elite de qualquer parte do mundo, acha difícil separar-se do estado. Ela vê como o estado, pensa como o estado, fala como o estado.

Nos Estados Unidos, por outro lado, o embaçamento da distinção entre "sarkar" e "público" penetrou muito mais profundamente na sociedade. Isso poderia ser um sinal de uma democracia robusta, mas infelizmente, a realidade é um pouco mais complicada e menos ‘bonita’. Entre outras coisas, isso tem a ver com a elaborada rede de paranóia gerada pelo "sarkar" dos EUA, e que sai da mídia corporativa e de Hollywood. Os estadunidenses comuns têm sido manipulados para imaginar que são um povo assediado, cujo único refúgio e proteção é o próprio governo. Se não são os comunistas, é a Al-Qaeda. Se não é Cuba, é a Nicarágua. Conseqüentemente, a mais poderosa nação do mundo — com seu arsenal de armas sem paralelos, sua história de ter declarado e patrocinado infinitas guerras, e a única nação da História a ter efetivamente usado bombas nucleares — é povoada por uma cidadania terrificada, que se atira pelas janelas. Um povo atado ao estado não por causa da assistência social ou da saúde pública, ou dos direitos empregatícios, mas pelo medo.

Esse medo manufaturado sinteticamente é usado para se obter o apoio do público para ulteriores atos de agressão. E assim, se constrói uma espiral de histeria, agora formalmente calibrada pelo programa do governo dos EUA de Alertas de Terror em Assombroso Tecnicolor: fúcsia, turquesa, rosa salmão.

Aos que olhamos do exterior, essa fusão de "sarkar" e de "público" nos EUA, às vezes se torna difícil distingüir as ações do governo dos EUA das ações do povo estadunidense. É essa confusão que alimenta o anti-americanismo no mundo. O governo dos EUA e seus fiéis canais da mídia se aproveitam do anti-americanismo e o ampliam. Todos conhecemos a rotina: "Porque nos odeiam?" Eles odeiam nossas liberdades"…etc… etc… Isso reforça o senso de isolamento entre o povo americano e estreita ainda mais o abraço entre "sarkar" e "público". Como Chapeuzinho Vermelho buscando proteção e carinho na cama do lobo mau.

O uso da ameaça de um inimigo externo para reunir e incitar a população é como um burro velho montado pelos políticos há séculos como modo de entrar pelas portas do poder. Mas será que o cidadão comum não está cansado desse velho burro e está procurando algo diferente? Uma antiga canção de um filme hindu diz: "yeh public hai, yeh sab jaanti hai" ("o povo sim é que sabe tudo"). Não seria maravilhoso se a canção estivesse certa e os políticos errados?

Antes da invasão ilegal do Iraque por Washington, uma pesquisa da Gallup International mostrou que em nenhum país europeu havia um nível de apoio para uma guerra unilateral superior a 11 por cento. Em 15 de fevereiro de 2003, semanas antes da invasão, mais de dez milhões de pessoas marcharam contra a guerra em todos os continentes, incluindo a América do Norte. Mesmo assim, os governos de muitos países que se supõem democráticos declararam a guerra.

A pergunta a ser feita é: a "democracia" continua sendo democrática?

Os governos democráticos devem prestar contas às pessoas que os elegeram? E, de modo crucial, o "público" nos países democráticos é responsável pelas ações do seu "sarkar"?

Se pararmos para pensar, a lógica em que se baseia a guerra contra o terrorismo e a lógica em que se baseia o terrorismo são exatamente as mesmas. Ambas obrigam os cidadãos a pagar pelas ações de seus governos. A Al-Qaeda fez o povo dos Estados Unidos pagar com suas vidas pelas ações do seu governo na Palestina, na Arábia Saudita, no Iraque e no Afeganistão. O governo dos Estados Unidos fez o povo do Afeganistão pagar — com milhares de vidas — pelas ações dos talibãs e o povo do Iraque pagar — em centenas de milhares — pelas ações de Saddam Hussein.

A diferença crucial é que ninguém realmente votou na Al-Qaeda, nos talibãs, ou em Saddam Hussein. Mas o presidente dos Estados Unidos foi eleito… (bem… pelo menos é um modo de dizer). Poderíamos dizer, então, que os cidadãos desses países são mais responsáveis pelas ações de seus respectivos governos do que os iraquianos o são pelas ações de Saddam Hussein ou os afegãos pelas ações dos talibãs?

E é o Deus de quem que vai decidir qual é a "guerra justa" e qual não é? George Bush pai disse uma vez: "Eu nunca pedirei desculpas em nome dos EUA. Não me importa o que tiver acontecido." Quando o presidente do país mais poderoso do mundo não precisa se importar com os fatos, então pelo menos podemos estar certos de que entramos na Era do Império.

Assim, o que significa poder público na Era do Império? Será que isso ainda tem algum significado? Será que ainda existe, na realidade?

Nesses tempos que se supõem democráticos, o pensamento político convencional afirma que o poder público se exerce nas urnas. Pessoas em dezenas de países do mundo todo votarão neste ano. A maioria (não todos) terá o governo por que votaram. Mas será que terão o governo que desejam?

Neste ano, na Índia, votamos para derrotar os nacionalistas hindus. Mas mesmo enquanto estávamos celebrando, sabíamos que no que dizia respeito a bombas nucleares, neoliberalismo, privatização, censura, mega-represas — em cada um dos principais tópicos, exceto o nacionalismo hindu descarado — o partido do Congresso e o do BJP não tinham substanciais diferenças ideológicas. Sabíamos também que foi o legado de cinqüenta anos do Partido do Congresso que preparou o terreno cultural e politicamente para a extrema direita. Foi também o Partido do Congresso que abriu pela primeira vez os mercados da Índia à globalização corporativa.

Em sua campanha eleitoral, o Partido do Congresso garantiu que estava disposto a revisar algumas de suas políticas econômicas precedentes. Milhões de cidadãos destituídos em toda a Índia votaram nas eleições. O espetáculo da grande democracia da Índia foi mostrado pelas televisões ao vivo — os pobres camponeses, os velhos e os enfermos, as mulheres de véu com suas belas jóias de prata, fazendo a viagem até os colégios eleitorais de elefante ou em camelos ou nos carros de bois. Ao contrário das previsões de todos os especialistas em Índia e das sondagens de opinião pública, o Partido do Congresso ganhou mais votos que qualquer outro partido. Os partidos comunistas da Índia ganharam a maior participação nas eleições de toda a sua história. Os pobres da Índia claramente votaram contra as "reformas" econômicas neoliberais e o crescente fascismo. Assim que foram contados os votos, esses pobres foram despachados pela mídia corporativa como se fossem figurantes extras de uma filmagem qualquer. Os canais de televisão mostravam a tela partida em dois. Metade da tela mostrava o caos ao externo da casa de Sônia Gandhi, a líder do Partido do Congresso, enquanto se improvisava um governo de coalizão.

A outra metade mostrava, frente às portas da Bolsa de Mumbai, os corretores em pânico ao pensarem que o Partido do Congresso efetivamente honraria suas promessas e implementaria o seu mandato eleitoral. Vimos o índice da bolsa Sensex subir, descer e ir para todos os lados. Os meios de comunicação, cujo valor das próprias ações estavam despencando, noticiavam o colapso da Bolsa como se o Paquistão tivesse acabado de lançar seus mísseis intercontinentais sobre Nova Déli.

Mesmo antes que o novo governo tivesse tomado posse, políticos da linha de frente do Congresso faziam declarações públicas visando assegurar aos investidores e à mídia que a privatização das utilidades públicas continuaria. Enquanto isso, o BJP, agora oposição, começava a fazer objeções, de um modo ao mesmo tempo cínico e cômico, opondo-se aos investimentos estrangeiros diretos e a uma ulterior abertura dos mercados indianos.

Esta é a dialética hipócrita adotada pela democracia eleitoral.

Quanto aos pobres da Índia, uma vez fornecidos seus votos, espera-se que eles voltem bem comportados para casa. A política será decidida sem que suas opiniões contem.

E as eleições nos EUA? Será que os votantes podem fazer escolhas verdadeiras?

É verdade que se John Kerry se tornar presidente, alguns dos magnatas do petróleo e dos fundamentalistas cristãos na Casa Branca mudarão. Poucos ficarão sentidos de não ver mais circular na área figuras tão descaradas como Dick Cheney ou Donald Rumsfeld ou John Ashcroft. Mas a preocupação real é de que na nova administração, as políticas deles continuarão. Que teremos um Bushismo sem Bush.

As posições de poder real — os banqueiros, os diretores executivos ou CEOs — não são vulneráveis ao voto (… e, de todo jeito, são eles que financiam os dois lados).

Infelizmente, a importância das eleições nos EUA deterioraram em uma espécie competição de personalidades. Um bate-boca sobre quem seria melhor para ocupar o cargo de supervisionar o império. John Kerry acredita na idéia de império com o mesmo fervor que George Bush.

O sistema político dos EUA foi cuidadosamente confeccionado de modo a garantir que qualquer pessoa que questione a bondade da estrutura do poder militar-industrial-corporativo tenha sua entrada barrada nos portais do poder.

Nesse contexto, não surpreende que nesta eleição sejam dois graduados da Universidade de Yale, ambos membros da "Skull and Bones" (Caveira e Ossos) — a mesma sociedade secreta, ambos milionários que brincam de ser soldadinhos, ambos apregoando a guerra, e discutindo de modo quase infantil sobre quem seria o cacique mais eficiente na guerra contra o terror.

Como o Presidente Bill Clinton antes dele, Kerry continuará a expansão do poder econômico e a penetração militar dos EUA no mundo. Diz que teria votado para autorizar Bush a declarar a guerra no Iraque, mesmo se tivesse sabido que não havia armas de destruição em massa. Promete enviar ainda mais tropas no Iraque. Disse, recentemente, que apóia 100% as políticas de Bush relativas a Israel e a Ariel Sharon. Diz que vai reter 98% dos cortes fiscais implementados por Bush.

Dessa forma, sob uma histérica troca de insultos, há um consenso quase absoluto. Parece que, mesmo se o eleitorado votar por Kerry, vai continuar a ter Bush. Presidente John Kerbush ou Presidente George Berry.

Não se trata de uma escolha real. Mas de uma escolha aparente. Como escolher a marca de um detergente. Tanto faz comprar Ivory Snow ou Tide, os dois são produtos da Proctor & Gamble.

Isso não significa que cada posição não tenha lá suas nuanças, que o Congresso e o BJP, os New Labor e os Tories, os democratas e os republicanos sejam a mesma coisa. Claro que não. Assim como Tide e Ivory Snow também não são a mesma coisa. Tide é aditivado e Ivory Snow passa por um detergente mais suave.

Na Índia, há uma diferença entre um partido abertamente fascista (o BJP) e um partido que astutamente joga uma comunidade contra a outra (o Congresso), lançando as sementes do "comunalismo" que serão, depois, colhidas habilidosamente pelo BJP.

Existem diferenças quanto ao Q.I. e aos níveis de impiedade entre os candidatos à presidência dos EUA deste ano. O movimento anti-guerra nos EUA tem feito um trabalho fenomenal de expor as mentiras e a venalidade que levaram à invasão do Iraque, apesar da propaganda e da intimidação que o movimento teve que enfrentar.

O serviço prestado pelo movimento não foi importante só para o povo dos EUA, mas para o mundo todo. Mas agora, se o movimento anti-guerra apóia Kerry abertamente, o resto do mundo poderá pensar que ele aprova suas políticas de imperialismo "sensível". Será que o imperialismo dos EUA é preferível, quando conta com o apoio da ONU e dos países europeus? Será preferível se a ONU solicitar que sejam enviados soldados da Índia e do Paquistão para fazer a matança e morrer no Iraque, ao invés dos soldados dos EUA? Será que a única mudança que os iraquianos podem esperar é que as empresas francesas, alemãs e russas compartilhem do saque representado pela ocupação de seu país?

Será isso melhor ou pior para nós que vivemos em nações subservientes? Será melhor para o mundo ter um imperador mais inteligente no poder ou um imperador mais estúpido? Será que essa é a única escolha de que dispomos?

Desculpem, eu sei que essas são perguntas incômodas e até mesmo brutais, mas elas precisam ser formuladas.

O fato é que a democracia eleitoral tornou-se um processo de cínica manipulação. Ela nos oferece um espaço político extremamente reduzido, hoje em dia. E seria muito ingênuo acreditar que esse espaço constitua uma escolha real.

A crise da democracia moderna é profunda.

No cenário global, além da jurisdição dos governos soberanos, os instrumentos internacionais de comércio e finanças supervisionam um sistema complexo de leis e acordos multilaterais, os quais consolidaram um sistema de apropriação que faria os próprios colonialistas ficarem envegonhdos... Esse sistema permite a entrada e a saída irrestrita de volumes maciços de capital especulativo — hot money — para dentro e para fora dos países do terceiro mundo, o que acaba ditando a política econômica dos mesmos. Usando a ameaça da fuga de capitais como alavanca, o capital internacional se insinua cada vez mais profundamente nessas economias. Gigantescas corporações transnacionais estão tomando posse das infra-estruturas essenciais e dos recursos naturais desses países, seus minérios, sua água, sua eletricidade. A Organização Mundial do Comércio, o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional e outras instituições financeiras como o Banco Asiático de Desenvolvimento, praticamente escrevem a política econômica e a legislação parlamentar. Com essa combinação letal de arrogância e impiedade, é a golpes de marreta que atacam as sociedades mais frágeis, interdependentes e historicamente complexas, provocando simplesmente a sua devastação.

Tudo isso ocorre sob a ondulação da bandeira da "reforma".

Como conseqüência dessa reforma, na África, Ásia e América Latina, milhares de pequenas empresas e empreendimentos tiveram que fechar, milhões de trabalhadores e camponeses perderam seus empregos e sua terra.

O jornal The Spectator de Londres nos garante que "vivemos na era mais feliz, mais saudável e mais pacífica de toda a história humana". Bilhões de pessoas se perguntam: "Nós" quem? Onde vivem essas pessoas? Como se chamam?

O que deve ser compreendido é que a moderna democracia se baseia na premissa da aceitação quase religiosa da nação- estado. Mas a globalização corporativa não. O capital líquido não. Assim, embora o capital necessite dos poderes coercitivos da nação-estado para reprimir as revoltas das senzalas, esse tipo de arranjo garante que nenhuma nação individual possa se opor à globalização corporativa por conta própria.

A mudança radical não pode e não será negociada pelos governos; poderá ser colocada em prática somente pelos povos. Pelo público. Um público que se pode dar as mãos além das respectivas fronteiras nacionais.

Dessa forma, quando falamos de "Poder Público na Era do Império", espero que não seja presunçoso admitir que a única coisa que vale a pena discutir seriamente é o poder de um público dissidente. Um público que discorda do próprio conceito de império. Um público que enfrenta aqueles que ocupam o poder — os governos e as instituições internacionais, nacionais, regionais e locais que apóiam e prestam serviço ao império.

Quais são os meios de protesto disponíveis para as pessoas que desejam resistir ao império? Por resistir não quero dizer somente expressar a dissidência, mas forçar a mudança de modo eficaz. O império tem uma vasta gama de cartões de visita. Usa diferentes armas para arrombar diferentes mercados, do talão de cheques aos mísseis cruise.

Para os pobres de muitos países, o império nem sempre aparece na forma de um míssil cruise e de tanques de guerra, como foi o caso no Iraque, ou no Afeganistão, ou no Vietnã. Pode aparecer em suas vidas através de avatares bem locais — perda de emprego, contas de eletricidade impossíveis de pagar, corte no abastecimento de água, ações de despejo de suas casas e suas terras. Tudo isso supervisionado pela maquinaria repressiva do estado, da polícia, do exército, do judiciário. É um processo de empobrecimento implacável com relação ao qual os pobres têm grande familiaridade histórica. O que o império faz é reforçar e exacerbar essas desigualdades já existentes.

Até recentemente, era difícil para as pessoas se verem como vítimas das conquistas do império. Mas agora, os conflitos locais começaram a visualizar o seu papel com uma clareza crescente. Entretanto, apesar de soar grandiloqüente, o fato é que cada um está confrontando o império a seu modo, de maneiras muito diferentes. No Iraque, na África do Sul, na Índia, na Argentina e, de um modo diferente, até nas ruas da Europa e dos Estados Unidos.

Os movimentos de resistência de massas, os ativistas individuais, jornalistas, artistas e cineastas se uniram para desmascarar o império. Eles estão dando os nós aos pontos, transformando as representações dos fluxos de caixa e os discursos dos conselhos de administração em histórias reais de pessoas reais e desespero real. Eles mostraram como o projeto neoliberal tem custado ao povo suas casas, suas terras, seus empregos, sua liberdade, sua dignidade. Eles tornaram tangível o intangível. O inimigo, que uma vez parecia in-CORP-óreo, agora tem um CORPO real.

Trata-se de uma vitória imensa. Foi forjada pela união de grupos políticos diferentes, através de uma variedade de estratégias. Mas todos reconheceram que o alvo de sua ira, seu ativismo e seu empenho era a mesma coisa. Este foi o início da globalização real: a globalização da dissidência.

Em termos gerais, há dois tipos de movimentos de resistência de massas nos países do terceiro mundo, hoje em dia. O Movimento dos Sem Terra no Brasil, o Movimento Anti-Represas na Índia, os Zapatistas no México, o Fórum Anti-Privatização na África do Sul, e centenas de outros, todos lutando contra seus próprios governos soberanos, os quais se tornaram meros agentes do projeto neoliberal. Em sua grande maioria, se trata de conflitos radicais, lutando para mudar a estrutura e o modelo de "desenvolvimento" escolhido para suas próprias sociedades.

Daí, há aqueles que lutam contra as ocupações neocoloniais oficiais e brutais, em territórios contestados cujas fronteiras e limites foram demarcados arbitrariamente pelas potências imperiais do século passado. Na Palestina, no Tibete, na Tchetchênia, na Caxemira, e em vários estados nas províncias do nordeste da Índia, há conflitos por auto-determinação.

Muitos desses conflitos podem ter sido radicais, até mesmo revolucionários quando começaram, mas com freqüência a brutalidade da repressão que enfrentaram os levaram a espaços conservadores e até mesmo retrógrados, em que usam as mesmas estratégias violentas e a mesma linguagem impregnada de nacionalismo religioso e cultural que foi usada pelos estados que procuravam substituir.

Muitos dos soldados rasos nesses conflitos, assim como aqueles que lutaram contra o apartheid na África do Sul, verão que, uma vez vencida a ocupação, se depararão imediatamente com outra guerra — uma guerra contra o colonialismo econômico.

Enquanto isso, à medida em que aumenta o abismo entre os ricos e os pobres e se intensifica a batalha pelo controle dos recursos do mundo, reaparece o colonialismo econômico, por meio da agressão militar formal.

O Iraque hoje é uma trágica ilustração desse processo. Uma invasão ilegal. Uma ocupação brutal em nome da liberação. Leis sendo rescritas, permitindo a apropriação sem-vergonha da riqueza e dos recursos do país, por corporações aliadas à ocupação, e agora, a piada de um "governo iraquiano" local.

Por essas razões, é absurdo condenar-se a resistência à ocupação dos EUA no Iraque, como se fosse organizada por terroristas ou insurgentes ou partidários de Saddam Hussein. Afinal de contas, se os EUA tivessem sido invadidos e ocupados, seria justo chamar as pessoas que lutariam para liberar o seu país de terroristas ou insurgentes ou bushistas?

A resistência iraquiana está lutando na linha de frente da batalha contra o império. E, portanto, aquela luta é a nossa também.

Como a maioria dos movimentos de resistência, esse combina uma variedade de facções. Antigos baathistas, liberais, islamistas, colaboracionistas frustrados, comunistas, etc. Naturalmente, o movimento deve estar cheio de oportunismo, rivalidades locais, demagogia e criminalidade. Porém se formos dar nosso apoio somente a movimentos completamente íntegros e puros, então nenhuma resistência merecerá nosso apoio.

Isso não significa que não deveríamos nunca criticar os movimentos de resistência. Muitos deles padecem de falta de democracia, de iconização de seus "líderes", de falta de transparência, de falta de visão e direção. Mas, sobretudo, sofrem de demonização, repressão e falta de recursos.

Antes de decidirmos o nível de pureza da resistência iraquiana para conduzir sua batalha secular, feminista, democrática e não violenta, deveríamos afiar o nosso lado da resistência forçando os EUA e seus aliados a se retirarem do Iraque.

O primeiro confronto militante nos EUA entre o movimento pela justiça global e a junta neoliberal teve lugar durante a conferência da OMC em Seattle, em dezembro de 1999. Para muitos movimentos de massas em países em desenvolvimento e que estavam lutando isoladamente, Seattle foi o primeiro sinal alentador de que sua ira e visão de um outro tipo de mundo era compartilhada por cidadãos de países imperialistas.

Em janeiro de 2001, em Porto Alegre, Brasil, 20.000 ativistas, estudantes, cineastas — entre as melhores ‘cabeças’ do mundo — se uniram para compartilhar suas experiências e trocar idéias sobre como confrontar o império. Era o nascimento do agora histórico Fórum Social Mundial. Foi a primeira reunião oficial de um tipo distinto de "poder público", entusiasmante, anarquista, não doutrinado, cheio de energia. O lema do FSM é "Um Outro Mundo É Possível" . Tornou-se uma plataforma onde centenas de debates, conversas e seminários ajudaram a refinar a visão de que tipo de mundo esse deveria ser.

Em janeiro de 2004, o 4º FSM ocorreu em Mumbai, Índia, atraindo 200.000 participantes. Nunca participei de um encontro mais energizante. Foi um sinal do sucesso do fórum social, ignorado pelos principais meios de comunicação do país. Mas agora, o FSM está ameaçado devido ao seu próprio sucesso. A atmosfera segura, aberta e festiva do fórum possibilitou aos políticos e às agências não governamentais que estão envolvidas nos sistemas político e econômico combatidos pelo fórum, de poderem participar e se fazerem ouvir.

Outro perigo é que o FSM, que tem desempenhado um papel tão vital no movimento pela justiça global, corra o risco de se tornar um fim em si mesmo. Somente o trabalho necessário para a organização do fórum a cada ano chega a consumir as energias de alguns dos melhores ativistas. Se as conversações sobre a resistência substituírem a desobediência civil real, então o FSM poderia se tornar uma vantagem para aqueles contra os quais ele foi criado. O Fórum deve acontecer e deve crescer, mas precisamos encontrar modos de canalizar nossas conversações no sentido da ação concreta.

À medida em que os movimentos de resistência começaram a se estender além das fronteiras nacionais e representar uma ameaça real, os governos desenvolveram suas próprias estratégias para lidar com eles. Elas variam da cooptação à repressão.

Vou falar a respeito de três dos perigos contemporâneos que enfrentam os movimentos de resistência: o difícil ponto de encontro entre os movimentos de massas e a mídia de massas, os riscos da ONG-ização da resistência, e o confronto entre os movimentos de resistência e os estados cada vez mais repressivos.

O lugar em que a mídia de massas encontra os movimentos de massas é bastante complicado.

Os governos se deram conta de que uma mídia que funciona e é movida através da sucessão de crises não pode se dar ao luxo de ficar parada por muito tempo no mesmo assunto. Como os estabelecimentos comerciais, que precisam de um fluxo e de um volume de caixa, a mídia precisa de um fluxo e de um volume de crises. Inteiros países se convertem em notícia obsoleta. Deixam de existir, e a obscuridão se torna ainda maior do que quando um foco de luz tinha se pousado brevemente sobre eles. Vimos isso acontecer no Afeganistão quando os soviéticos se retiraram. E agora, depois da operação Enduring Freedom (Liberdade Duradoura) a qual colocou no poder Hamid Karzai, representante da CIA, atirando o Afeganistão nas mãos dos caciques da guerra, mais uma vez.

Outro agente da CIA, Iyad Allawi, foi instalado no Iraque. Assim, quem sabe, chegou a hora da mídia ir embora dali também.

Enquanto os governos refinam a arte de esperar que a crise passe, os movimentos de resistência estão se emaranhando crescentemente em um vórtice de produção de crises, procurando modos de manufaturá-las em formatos de fácil consumo e de uso amigável aos espectadores.

Cada movimento popular que se respeite a si próprio, cada "questão" deve ter seu próprio balão publicitário flutuando no ar, propagandeando sua marca e seu propósito.

Por esse motivo, mortes por inanição são propagandas mais eficazes que o empobrecimento de milhões de pessoas mal nutridas, as quais não dão ibope. As represas não merecem notícia, até que a devastação que causam caia bem na televisão. (E daí, é tarde demais.)

Ficar dias em pé na água, enquanto a represa vai se enchendo, olhando a própria casa e pertences flutuarem, como protesto contra a construção de uma grande represa costumava ser uma estratégia eficaz, mas já não o é mais. A mídia se cansou mortalmente dessa cena. Assim, para milhares de pessoas deslocadas pelas represas a alternativa é procurar novos truques ou desistir da luta.

Manifestações cheias de cores e as marchas de fim de semana são vitais, mas sozinhas, não têm o poder suficiente para impedir as guerras. As guerras pararão somente quando os soldados se recusarem de lutar, quando os trabalhadores se recusarem de carregar as armas nos navios e nas aeronaves, quando as pessoas boicotarem os postos econômicos do império que estão disseminados pelo globo.

Se quisermos reclamar o espaço da desobediência civil, teremos que nos livrar da tirania do jornalismo de crise, com seu medo do trivial. Precisamos usar nossa experiência, nossa imaginação e nossa arte para interrogar os instrumentos do estado que garantem que a "normalidade" permaneça o que é: cruel, injusta, inaceitável. Devemos expor as políticas e os processos que fazem com que as coisas de cada dia — a comida, a água, a moradia e a dignidade — sejam um sonho tão distante para as pessoas comuns. O verdadeiro ataque preventivo significa compreender que as guerras são o resultado final de uma paz imperfeita e injusta.

No que toca aos movimentos de resistência de massas, o fato é que nenhum tipo de cobertura de mídia pode ser comparado à força da massa em campo. Não há opção comparável, na verdade, à velha e boa mobilização política.

A globalização corporativa aumentou a distância entre aqueles que tomam decisões e aqueles que têm que sofrer os efeitos daquelas decisões tomadas. Fóruns como o FSM permitem que os movimentos de resistência local se conectem com as suas contrapartidas nos países ricos. Essa aliança é importante e formidável. Por exemplo, quando a primeira represa privada da Índia, Maheshwar Dam, foi construída, alianças entre a Narmada Bachao Andolan (a NBA), a organização alemã Urgewald, a Declaração de Berna, na Suíça, e a International Rivers Network em Berkeley trabalharam em conjunto para forçar a saída de uma série de bancos e corporações internacionais do projeto. Isso não teria sido possível se não houvesse um movimento de resistência extremamente sólido no terreno. A voz daquele movimento local foi amplificada por defensores do movimento em âmbito global, desconcertando os investidores e obrigando-os a se retirarem.

Um número infinito de alianças similares, tendo como alvo projetos específicos e corporações específicas ajudaria a fazer um outro mundo possível. Deveríamos começar com as corporações que fizeram negócios com Saddam Hussein e que agora estão lucrando com a devastação e a ocupação do Iraque.

Um segundo risco para os movimentos de massas é a ONG-ização da resistência. Será fácil distorcer o que vou dizer, fazendo com que isso pareça uma acusação contra todas as ONGs, o que seria falso. Mas apesar das turvas águas de um contexto estudado para que falsas ONGs chupem as subvenções ou evadam impostos (em estados como Bihar, elas são doadas como dote), é claro que existem ONGs de grande valor. Mas é importante considerar o fenômeno das ONGs em um contexto político mais amplo.

Na Índia, por exemplo, o boom das ONGs subvencionadas começou no fim dos anos 80 e durante os anos 90. Coincidiu com a abertura dos mercados do país ao neoliberalismo. Na época, o estado indiano, mantendo os requisitos de ajuste estrutural, estava retirando seu apoio financeiro ao desenvolvimento rural, agricultura, energia, transporte e saúde. Enquanto o estado abdicava do seu papel tradicional, as ONGs se voltaram para trabalhar justamente nessas áreas. A diferença, naturalmente, é que os fundos disponíveis a elas correspondiam a uma minúscula fração do corte efetivo feito nas despesas públicas. A maioria das grandes ONGs são financiadas e patrocinadas pelas agências de desenvolvimento, as quais, por sua vez, são financiadas pelos governos ocidentais, o Banco Mundial, a ONU, e algumas corporações multinacionais. Embora seja possível que não se trate exatamente das mesmas agências, elas certamente são parte da mesma formação política que supervisiona o projeto neoliberal e que demanda cortes drásticos dos governos em seus gastos.

Por que motivo essas agências financiam as ONGs? Será que só pelo antigo afã missionário? Culpa? É um pouco mais que isso. As ONGs dão a impressão de estarem preenchendo o vácuo criado pelo estado em retirada. E elas o estão preenchendo, só que de uma maneira materialmente inconseqüente. Sua contribuição real é aplacar a ira política, e repartir como ajuda ou caridade aquilo que, na realidade, caberia ao povo como direito.

Elas alteram a psique pública. Tornam as pessoas vítimas dependentes e aparam as pontas da resistência política. As ONGs formam uma espécie de amortecedor entre o "sarkar" e o "público". Entre o império e seus vassalos. Elas se tornaram os árbitros, os intérpretes, os facilitadores.

A longo prazo, as ONGs são responsáveis perante seus financiadores, não com relação às pessoas para as quais trabalham. Elas são aquilo que os botânicos chamam de "espécie indicadora". É quase como se quanto maior a devastação causada pelo neoliberalismo, maior o número de ONGs que aparecem. Nada consegue ilustrar isso de modo mais contundente do que o fenômeno dos EUA se preparando para invadir um país e, ao mesmo tempo, preparando as ONGs para irem fazer a limpeza dos despojos.

Para se certificarem de que o financiamento não será posto em risco e de que os governos dos países em que trabalham lhes permitirão o funcionamento, as ONGs devem apresentar seu trabalho dentro de uma estrutura superficial, mais ou menos isenta de qualquer contexto político ou histórico. De todo jeito, um contexto histórico ou político inconveniente.

Os pedidos de socorro dos países pobres e das zonas de guerra, veiculados como apolíticos (e, portanto, extremamente políticos), criam a imagem de que o povo (de péle escura) daqueles países (com população de péle escura) seja equivalente a uma vítima patológica. Mais um indiano mal nutrido, mais um etiópico que morre de fome, mais um sudanês mutilado… precisando da ajuda do homem branco. Sem querer, essas imagens reforçam os estereótipos racistas e reafirmam as conquistas, os confortos e a compaixão (o amor do tipo: "é tudo para o seu bem…") da civilização ocidental. As ONGs são os missionários seculares do mundo moderno.

Por fim — em uma menor escala, porém mais insidiosa— o capital disponível para as ONGs desempenha o mesmo papel na política alternativa que o capital especulativo que entra e sai das economias dos países pobres. Começa ditando a ordem do dia, transforma confronto em negociação, despolitiza a resistência, interfere junto aos movimentos populares locais que têm sido tradicionalmente auto-suficientes. As ONGs têm fundos com os quais podem dar empregos a pessoas que, de outra forma, se tornariam ativistas nos movimentos de resistência, mas agora podem se sentir engajadas em algo mais imediato e criativo (à medida em que ganham a vida com seus ideais). A resistência política real não oferece esses tipos de benefício.

A Ong-ização da política ameaça transformar a resistência em uma fonte de empregos razoáveis, bem comportados, assalariados e em tempo integral. Com alguns benefícios extras. A resistência real tem conseqüências reais. E não paga salários.

Isso nos leva ao terceiro perigo de que gostaria de falar: a natureza letal do atual confronto entre os movimentos de resistência e a realidade de estados cada vez mais repressivos. Entre o poder público e os agentes do império.

Onde quer que a resistência civil tenha mostrado os mais brandos sinais de estar evoluindo de ações simbólicas a qualquer coisa remotamente mais ameaçadora, a repressão se mostra implacável. Constatamos isso nas manifestações de Seattle, em Miami, Göthenberg, em Gênova.

Nos Estados Unidos, há o USA PATRIOT Act, o qual se tornou um esquema para a promulgação de leis antiterroristas, aprovadas em vários países do mundo. As liberdades estão sendo cerceadas em nome de se proteger a liberdade. E, uma vez que renunciamos às nossas liberdades, só uma revolução poderá trazê-las de volta.

Certos governos têm vastíssima experiência em cerceamento das liberdades, e ainda continuarem a dar a impressão de que está tudo bem. O governo da Índia, veterano nesse jogo, pode lançar uma luz no assunto.

Ao longo dos anos, o governo da Índia passou um número imenso de leis que permitiram tratar qualquer pessoa de terrorista, insurgente, militante. Assim, temos a Lei de Poderes Especiais das Forças Armadas (Armed Forces Special Powers Act), a Lei de Segurança Pública (Public Security Act), a Lei de Segurança para Áreas Especiais (Special Areas Security Act), a Lei para Gangsters (Gangster Act), a Lei de Áreas Terroristas e de Perturbação (Terrorist and Disruptive Areas Act) (a qual, oficialmente, não está mais em vigência, embora ainda haja pessoas esperando julgamento devido à mesma) e, mais recentemente, a Lei de Prevenção contra o Terrorismo (POTA, ou Prevention of Terrorism Act), o antibiótico de amplo espectro para curar a doença da dissidência.

Outras medidas estão sendo tomadas, tais como sentenças em tribunais cujo efeito é cercear a liberdade de expressão, o direito dos funcionários públicos de declararem greve, o direito à vida e ao sustento. Na Índia, os tribunais começaram a micro-gerenciar nossas vidas. Sem contar o fato de que criticar os tribunais constitui um delito.

Mas voltando às iniciativas antiterroristas, na última década, o número de pessoas que morreram pela polícia e pelas forças de segurança alcançou dezenas de milhares. No estado de Andhra Pradesh (a garota propaganda da globalização corporativa da Índia), uma média de 200 "extremistas" morrem, naquilo a que chamam de "encontros", a cada ano. A polícia de Mumbai se gaba do número de "gangsters" que morreram em tiroteios. Na Caxemira, cuja situação é praticamente de guerra, estima-se que 80.000 pessoas tenham sido assassinadas desde 1989. Milhares simplesmente "desapareceram". Nas províncias do nordeste do país, a situação é similar.

Nos últimos anos, a polícia da Índia tem aberto fogo contra pessoas desarmadas, sobretudo das castas dalit e adivasi. O seu método preferido é matá-las e, em seguida, chamá-las de terroristas. E a Índia não é o único país onde isso ocorre. Coisas similares acontecem na Bolívia, no Chile e na África do Sul. Na era do neoliberalismo, a pobreza é um crime, e protestar contra a pobreza vem sendo definido cada vez mais freqüentemente como terrorismo.

Na Índia, a Lei de Prevenção contra o Terrorismo (Prevention of Terrorism Act, ou POTA) é chamada com freqüência de Lei de Produção do Terrorismo. Ela é versátil, inclui tudo, e pode ser aplicada a qualquer um, seja um agente da Al-Qaeda seja um motorista de ônibus descontente. Como todas as leis antiterrorismo, sua genialidade está no fato de que ela é seja o que for que o governo queira que ela seja. Depois dos progroms de 2002 em Gujarat, apoiados pelo estado, em que morreram cerca de 2.000 muçulmanos, assassinados por multidões hindus e cerca de 150.000 foram despejados de sus casas, 287 pessoas foram acusadas, sob a POTA. Dessas, 286 eram muçulmanas e uma era sikh.

A POTA permite utilizar como evidência em julgamentos as confissões extraídas do réu enquanto o mesmo está em custódia da polícia. De fato, a tortura tende a substituir a investigação. O Centro de Documentação de Direitos Humanos da Ásia Meridional (South Asia Human Rights Documentation Center) reporta que na Índia se verifica o número mais alto de torturas e mortes sob custódia, no mundo. Os registros governamentais mostram que houve 1.307 mortes sob custódia judicial, e isso somente para o ano de 2002.

Há poucos meses, eu fiz parte de um tribunal do povo a respeito da POTA. Durante um período de dois dias, escutamos testemunhos estarrecedores daquilo que está acontecendo em nossa maravilhosa democracia. Tudo o que se possa imaginar — desde pessoas forçadas a beber urina, outras obrigadas a se despirem, humilhações, choques elétricos, queimaduras com pontas de cigarros acesos, barras de ferro inseridas no ânus, surras e pontapés.

O novo governo prometeu abolir a POTA. Eu ficaria surpresa se isso acontecesse antes que outra legislação similar, mas com um nome diferente, tenha sido aprovada. Deixará de ser POTA e passará a ser MOTA, ou qualquer coisa assim.

Quando se fecham todas as portas para a dissidência não violenta, e quando qualquer pessoa que protesta contra a violação de seus direitos humanos é taxada de terrorista, será que deveríamos ficar tão surpresos com o fato de que em vastas partes do país é crescente o número de pessoas que acreditam em luta armada e se encontram mais ou menos além do controle do estado? Na Caxemira, nas províncias do nordeste, em muitas partes de Madhya Pradesh, em Chattisgarh, Jharkhand e em Andhra Pradesh. As pessoas destas regiões se encontram encurraladas entre a violência dos militantes e a violência do estado.

Na Caxemira, o exército indiano estima que de 3.000 a 4.000 militantes estejam na ativa, a qualquer momento. Para controlá-los, o governo indiano emprega cerca de 500.000 soldados. Obviamente, não são só os militantes que o exército procura controlar, mas toda uma população de pessoas humilhadas e infelizes, que vêem o exército indiano como uma força de ocupação.

A Lei de Poderes Especiais das Forças Armadas (Armed Forces Special Powers Act) permite que, não somente os oficiais de alto escalão, mas até mesmo sub-oficiais recém contratados possam usar a força e até matar qualquer pessoa suspeita de perturbar a ordem pública. Ela foi imposta primeiramente no estado de Manipur, em 1958. Hoje, ela é aplicada em praticamente todo o nordeste e na Caxemira. A documentação dos episódios de tortura, desaparecimentos, mortes sob custódia, estupro e execução sumária pelas forças de segurança são de dar nó no estômago.

Em Andhra Pradesh, no coração da Índia, o grupo militante Marxist-Leninist Peoples' War Group — que há anos tem estado engajado em lutas violentas e tem sido o alvo principal de muitos dos falsos "encontros" com a polícia de Andhra — fez a sua primeira reunião pública no dia 28 de julho de 2004, na cidade de Warangal.

Centenas de milhares de pessoas participaram da reunião. Sob a POTA, todas elas são consideradas terroristas. Será que vão ser todas detidas em algum equivalente indiano de Guantânamo?

Todo o nordeste da Índia e o vale da Caxemira estão em fermento. O que fará o governo com esses milhões de pessoas?

Hoje em dia, não há nenhum tema de discussão mais importante do que as estratégias de resistência. E a escolha da estratégia não está inteiramente nas mãos do público. Está também nas mãos do "sarkar".

Afinal de contas, quando os EUA invadem e ocupam o Iraque, como foi feito, com uma força militar tão avassaladora, será que se pode esperar que a resistência seja do tipo convencional? (É claro que, mesmo se ela fosse convencional, ainda assim seria chamada de terrorista.) Parece estranho, mas, o arsenal de armas do governo dos EUA e sua potência aérea e de artilharia sem paralelos tornam o terrorismo algo de inevitável. O povo acaba compensando sua falta de dinheiro e poder com estratégias e astúcia.

Nesses tempos de ansiedade e desespero, se os governos não fizerem o impossível para respeitar a resistência não violenta, então acabam favorecendo aqueles que optam pela violência. A condenação do terrorismo pelos governos não é crível, se esses governos não se mostrarem abertos à mudança através da dissidência não violenta.

Contudo, o que vemos é o esmagamento dos movimentos de resistência não violenta. Todo tipo de mobilização ou organização de massas está sendo comprada, ou destruída, ou simplesmente ignorada.

Enquanto isso, os governos e a mídia corporativa, sem nos esquecermos da indústria cinematográfica, dedicam seu tempo, atenção, tecnologia, pesquisa e admiração à guerra contra o terrorismo. A violência foi deificada.

A mensagem que lançam é perturbadora e perigosa: para expressar um descontentamento, a violência é mais eficaz que a não violência.

À medida em que aumenta o abismo entre ricos e pobres, e quando se faz mais urgente a necessidade de apropriação e controle dos recursos do mundo para se alimentar a gigantesca máquina capitalista, será que haverá apenas uma escalada do descontentamento?

Para aqueles entre nós que se encontram no lado errado do império, a humilhação está ficando insuportável.

Cada uma das crianças iraquianas assassinadas pelos Estados Unidos era como um filho nosso. Cada um dos prisioneiros torturados em Abu Ghraib era como um nosso camarada. Cada um de seus gritos era como um grito nosso. Quando eles foram humilhados, nós é que fomos humilhados. Os soldados dos EUA lutando no Iraque — em sua maioria voluntários recrutados pela pobreza de suas pequenas cidades e dos bairros urbanos mais pobres — são vítimas, da mesma forma que os iraquianos, do mesmo processo horrendo, que lhes exige a morte por uma vitória que nunca lhe pertencerá.

Os mandarins do mundo corporativo, os diretores executivos, os banqueiros, os políticos, os juízes e generais nos olham de cima para baixo, balançando a cabeça com uma expressão severa: "Não há alternativa", dizem. E soltam os cães de guerra.

Então, das ruínas do Afeganistão, dos despojos do Iraque e da Tchetchênia, das ruas da Palestina ocupada e das montanhas da Caxemira, das montanhas e planícies da Colômbia e das florestas de Andhra Pradesh e de Assam chega a resposta terrificante: "Não há alternativa ao terrorismo." Terrorismo. Luta armada. Insurgência. Cada um lhe dá o nome que quiser.

O terrorismo é desalmado, feio, desumanizador tanto para aqueles que o perpetram quanto para as vítimas. Contudo, a guerra também é isso tudo. Poderíamos dizer que o terrorismo é a privatização da guerra. Os terroristas são os mercadores do livre mercado da guerra. São pessoas que não acreditam que o estado tenha o monopólio do uso legítimo da violência.

A sociedade humana está embarcando para um lugar terrível.

Obviamente, há uma alternativa ao terrorismo. Ela se chama justiça.

Chegou a hora de reconhecermos que não é a quantidade de armas nucleares ou o domínio de amplo espectro ou as bombas de fragmentação "daisy cutters" ou os espúrios conselhos de governo e loya jirgas que poderão comprar a paz às custas da justiça.

A ambição de hegemonia e preponderância de alguns terá como contrapartida o desejo mais intenso de dignidade e justiça de outros.

A forma que tomará essa batalha, se ela será bonita ou sangrenta, dependerá de nós.

 

TIDE? OR IVORY SNOW?

Public Power in the Age of Empire

 

Transcript of full speech by Arundhati Roy in San Francisco, California on August 16th, 2004.

Copyright 2004 Arundhati Roy. For permission to reprint contact arnove@igc.org

 

I've been asked to speak about "Public Power in the Age of Empire." I'm not used to doing as I'm told, but by happy coincidence, it's exactly what I'd like to speak about tonight.

When language has been butchered and bled of meaning, how do we understand "public power"? When freedom means occupation, when democracy means neoliberal capitalism, when reform means repression, when words like "empowerment" and "peacekeeping" make your blood run cold - why, then, "public power" could mean whatever you want it to mean. A biceps building machine, or a Community Power Shower. So, I'll just have to define "public power" as I go along, in my own self-serving sort of way.

In India, the word public is now a Hindi word. It means people. In Hindi, we have sarkar and public, the government and the people. Inherent in this use is the underlying assumption that the government is quite separate from "the people." This distinction has to do with the fact that India's freedom struggle, though magnificent, was by no means revolutionary. The Indian elite stepped easily and elegantly into the shoes of the British imperialists. A deeply impoverished, essentially feudal society became a modern, independent nation state. Even today, fifty seven years on to the day, the truly vanquished still look upon the government as mai-baap, the parent and provider. The somewhat more radical, those who still have fire in their bellies, see it as chor, the thief, the snatcher-away of all things.

Either way, for most Indians, sarkar is very separate from public. However, as you make your way up India's social ladder, the distinction between sarkar and public gets blurred. The Indian elite, like the elite anywhere in the world, finds it hard to separate itself from the state. It sees like the state, it thinks like the state, it speaks like the state.

In the United States, on the other hand, the blurring of the distinction between sarkar and public has penetrated far deeper into society. This could be a sign of a robust democracy, but unfortunately, it's a little more complicated and less pretty than that. Among other things, it has to do with the elaborate web of paranoia generated by the U.S. sarkar and spun out by the corporate media and Hollywood. Ordinary Americans have been manipulated into imagining they are a people under siege whose sole refuge and protector is their government. If it isn't the Communists, it's al-Qaeda. If it isn't Cuba. it's Nicaragua. As a result, this, the most powerful nation in the world - with its unmatchable arsenal of weapons, its history of having waged and sponsored endless wars, and the only nation in history to have actually used nuclear bombs - is peopled by a terrified citizenry, jumping at shadows. A people bonded to the state not by social services, or public health care, or employment guarantees, but by fear.

This synthetically manufactured fear is used to gain public sanction for further acts of aggression. And so it goes, building into a spiral of self-fulfilling hysteria, now formally calibrated by the U.S government's Amazing Technicolored Terror Alerts: fuchsia, turquoise, salmon pink.

To outside observers, this merging of sarkar and public in the United States sometimes makes it hard to separate the actions of the U.S. government from the American people. It is this confusion that fuels anti-Americanism in the world. Anti-Americanism is then seized upon and amplified by the U.S. government and its faithful media outlets. You know the routine: "Why do they hate us? They hate our freedoms" . . . etc. . . . etc. This enhances the sense of isolation among American people and makes the embrace between sarkar and public even more intimate. Like Red Riding Hood looking for a cuddle in the wolf's bed.

Using the threat of an external enemy to rally people behind you is a tired old horse, which politicians have ridden into power for centuries. But could it be that ordinary people are fed up of that poor old horse and are looking for something different? There's an old Hindi film song that goes yeh public hai, yeh sab jaanti hai (the public, she knows it all). Wouldn't it be lovely if the song were right and the politicians wrong?

Before Washington's illegal invasion of Iraq, a Gallup International poll showed that in no European country was the support for a unilateral war higher than 11 percent. On February 15, 2003, weeks before the invasion, more than ten million people marched against the war on different continents, including North America. And yet the governments of many supposedly democratic countries still went to war.

The question is: is "democracy" still democratic?

Are democratic governments accountable to the people who elected them? And, critically, is the public in democratic countries responsible for the actions of its sarkar?

If you think about it, the logic that underlies the war on terrorism and the logic that underlies terrorism is exactly the same. Both make ordinary citizens pay for the actions of their government. Al-Qaeda made the people of the United States pay with their lives for the actions of their government in Palestine, Saudi Arabia, Iraq, and Afghanistan. The U.S government has made the people of Afghanistan pay in their thousands for the actions of the Taliban and the people of Iraq pay in their hundreds of thousands for the actions of Saddam Hussein.

The crucial difference is that nobody really elected al-Qaeda, the Taliban, or Saddam Hussein. But the president of the United States was elected (well ... in a manner of speaking).

The prime ministers of Italy, Spain, and the United Kingdom were elected. Could it then be argued that citizens of these countries are more responsible for the actions of their government than Iraqis are for the actions of Saddam Hussein or Afghans for the Taliban?

Whose God decides which is a "just war" and which isn't? George Bush senior once said: "I will never apologize for the United States. I don't care what the facts are." When the president of the most powerful country in the world doesn't need to care what the facts are, then we can at least be sure we have entered the Age of Empire.

So what does public power mean in the Age of Empire? Does it mean anything at all? Does it actually exist?

In these allegedly democratic times, conventional political thought holds that public power is exercised through the ballot. Scores of countries in the world will go to the polls this year. Most (not all) of them will get the governments they vote for. But will they get the governments they want?

In India this year, we voted the Hindu nationalists out of office. But even as we celebrated, we knew that on nuclear bombs, neoliberalism, privatization, censorship, big dams - on every major issue other than overt Hindu nationalism - the Congress and the BJP have no major ideological differences. We know that it is thefifty-year legacy of the Congress Party that prepared the ground culturally and politically for the far right. It was also the Congress Party that first opened India's markets to corporate globalization.

In its election campaign, the Congress Party indicated that it was prepared to rethink some of its earlier economic policies. Millions of India's poorest people came out in strength to vote in the elections. The spectacle of the great Indian democracy was telecast live - the poor farmers, the old and infirm, the veiled women with their beautiful silver jewelry, making quaint journeys to election booths on elephants and camels and bullock carts. Contrary to the predictions of all India's experts and pollsters, Congress won more votes than any other party. India's communist parties won the largest share of the vote in their history. India's poor had clearly voted against neoliberalism's economic "reforms" and growing fascism. As soon as the votes were counted, the corporate media dispatched them like badly paid extras on a film set. Television channels featured split screens. Half the screen showed the chaos outside the home of Sonia Gandhi, the leader of the Congress Party, as the coalition government was cobbled together.

The other half showed frenzied stockbrokers outside the Mumbai Stock Exchange, panicking at the thought that the Congress Party might actually honor its promises and implement its electoral mandate. We saw the Sensex stock index move up and down and sideways. The media, whose own publicly listed stocks were plummeting, reported the stock market crash as though Pakistan had launched ICBMs on New Delhi.

Even before the new government was formally sworn in, senior Congress politicians made public statements reassuring investors and the media that privatization of public utilities would continue. Meanwhile the BJP, now in opposition, has cynically, and comically, begun to oppose foreign direct investment and the further opening of Indian markets.

This is the spurious, evolving dialectic of electoral democracy.

As for the Indian poor, once they've provided the votes, they are expected to bugger off home. Policy will be decided despite them.

And what of the U.S. elections? Do U.S. voters have a real choice?

It's true that if John Kerry becomes president, some of the oil tycoons and Christian fundamentalists in the White House will change. Few will be sorry to see the back of Dick Cheney or Donald Rumsfeld or John Ashcroft and their blatant thuggery. But the real concern is that in the new administration their policies will continue. That we will have Bushism without Bush.

Those positions of real power - the bankers, the CEOs - are not vulnerable to the vote (. . . and in any case, they fund both sides).

Unfortunately the importance of the U.S elections has deteriorated into a sort of personality contest. A squabble over who would do a better job of overseeing empire. John Kerry believes in the idea of empire as fervently as George Bush does.

The U.S. political system has been carefully crafted to ensure that no one who questions the natural goodness of the military-industrial-corporate power structure will be allowed through the portals of power.

Given this, it's no surprise that in this election you have two Yale University graduates, both members of Skull and Bones, the same secret society, both millionaires, both playing at soldier-soldier, both talking up war, and arguing almost childishly about who will lead the war on terror more effectively.

Like President Bill Clinton before him, Kerry will continue the expansion of U.S. economic and military penetration into the world. He says he would have voted to authorize Bush to go to war in Iraq even if he had known that Iraq had no weapons of mass destruction. He promises to commit more troops to Iraq. He said recently that he supports Bush's policies toward Israel and Ariel Sharon 100 percent. He says he'll retain 98% of Bush's tax cuts.

So, underneath the shrill exchange of insults, there is almost absolute consensus. It looks as though even if Americans vote for Kerry, they'll still get Bush. President John Kerbush or President George Berry.

It's not a real choice. It's an apparent choice. Like choosing a brand of detergent. Whether you buy Ivory Snow or Tide, they're both owned by Proctor & Gamble.

This doesn't mean that one takes a position that is without nuance, that the Congress and the BJP, New Labor and the Tories, the Democrats and Republicans are the same. Of course, they're not. Neither are Tide and Ivory Snow. Tide has oxy-boosting and Ivory Snow is a gentle cleanser.

In India, there is a difference between an overtly fascist party (the BJP) and a party that slyly pits one community against another (Congress), and sows the seeds of communalism that are then so ably harvested by the BJP.

There are differences in the I.Q.s and levels of ruthlessness between this year's U.S. presidential candidates. The anti-war movement in the United States has done a phenomenal job of exposing the lies and venality that led to the invasion of Iraq, despite the propaganda and intimidation it faced.

This was a service not just to people here, but to the whole world. But now, if the anti-war movement openly campaigns for Kerry, the rest of the world will think that it approves of his policies of "sensitive" imperialism. Is U.S. imperialism preferable if it is supported by the United Nations and European countries? Is it preferable if UN asks Indian and Pakistani soldiers to do the killing and dying in Iraq instead of U.S. soldiers? Is the only change that Iraqis can hope for that French, German, and Russian companies will share in the spoils of the occupation of their country?

Is this actually better or worse for those of us who live in subject nations? Is it better for the world to have a smarter emperor in power or a stupider one? Is that our only choice?

I'm sorry, I know that these are uncomfortable, even brutal questions, but they must be asked.

The fact is that electoral democracy has become a process of cynical manipulation. It offers us a very reduced political space today. To believe that this space constitutes real choice would be naïve.

The crisis in modern democracy is a profound one.

On the global stage, beyond the jurisdiction of sovereign governments, international instruments of trade and finance oversee a complex system of multilateral laws and agreements that have entrenched a system of appropriation that puts colonialism to shame. This system allows the unrestricted entry and exit of massive amounts of speculative capital - hot money - into and out of third world countries, which then effectively dictates their economic policy. Using the threat of capital flight as a lever, international capital insinuates itself deeper and deeper into these economies. Giant transnational corporations are taking control of their essential infrastructure and natural resources, their minerals, their water, their electricity. The World Trade Organization, the World Bank, the International Monetary Fund, and other financial institutions like the Asian Development Bank, virtually write economic policy and parliamentary legislation. With a deadly combination of arrogance and ruthlessness, they take their sledgehammers to fragile, interdependent, historically complex societies, and devastate them.

All this goes under the fluttering banner of "reform."

As a consequence of this reform, in Africa, Asia, and Latin America, thousands of small enterprises and industries have closed down, millions of workers and farmers have lost their jobs and land.

The Spectator newspaper in London assures us that "[w]e live in the happiest, healthiest and most peaceful era in human history." Billions wonder: who's "we"? Where does he live? What's his Christian name?

The thing to understand is that modern democracy is safely premised on an almost religious acceptance of the nation state. But corporate globalization is not. Liquid capital is not. So, even though capital needs the coercive powers of the nation state to put down revolts in the servants' quarters, this set up ensures that no individual nation can oppose corporate globalization on its own.

Radical change cannot and will not be negotiated by governments; it can only be enforced by people. By the public. A public who can link hands across national borders.

So when we speak of "Public Power in the Age of Empire," I hope it's not presumptuous to assume that the only thing that is worth discussing seriously is the power of a dissenting public. A public which disagrees with the very concept of empire. A public which has set itself against incumbent power - international, national, regional, or provincial governments and institutions that support and service empire.

What are the avenues of protest available to people who wish to resist empire? By resist I don't mean only to express dissent, but to effectively force change. Empire has a range of calling cards. It uses different weapons to break open different markets. You know the check book and the cruise missile

For poor people in many countries, Empire does not always appear in the form of cruise missiles and tanks, as it has in Iraq or Afghanistan or Vietnam. It appears in their lives in very local avatars - losing their jobs, being sent unpayable electricity bills, having their water supply cut, being evicted from their homes and uprooted from their land. All this overseen by the repressive machinery of the state, the police, the army, the judiciary. It is a process of relentless impoverishment with which the poor are historically familiar. What Empire does is to further entrench and exacerbate already existing inequalities.

Even until quite recently, it was sometimes difficult for people to see themselves as victims of the conquests of Empire. But now local struggles have begun to see their role with increasing clarity. However grand it might sound, the fact is, they are confronting Empire in their own, very different ways. Differently in Iraq, in South Africa, in India, in Argentina, and differently, for that matter, on the streets of Europe and the United States.

Mass resistance movements, individual activists, journalists, artists, and film makers have come together to strip Empire of its sheen. They have connected the dots, turned cash-flow charts and boardroom speeches into real stories about real people and real despair. They have shown how the neoliberal project has cost people their homes, their land, their jobs, their liberty, their dignity. They have made the intangible tangible. The once seemingly in-CORP-o-real enemy is now CORP-o-real.

This is a huge victory. It was forged by the coming together of disparate political groups, with a variety of strategies. But they all recognized that the target of their anger, their activism, and their doggedness is the same. This was the beginning of real globalization. The globalization of dissent.

Broadly speaking, there are two kinds of mass resistance movements in third world countries today. The landless peoples' movement in Brazil, the anti-dam movement in India, the Zapatistas in Mexico, the Anti-Privatization Forum in South Africa, and hundreds of others, are fighting their own sovereign governments, which have become agents of the neoliberal project. Most of these are radical struggles, fighting to change the structure and chosen model of "development" of their own societies.

Then there are those fighting formal and brutal neocolonial occupations in contested territories whose boundaries and fault lines were often arbitrarily drawn last century by the imperialist powers. In Palestine, Tibet, Chechnya, Kashmir, and several states in India's northeast provinces, people are waging struggles for self-determination.

Several of these struggles might have been radical, even revolutionary when they began, but often the brutality of the repression they face pushes them into conservative, even retrogressive spaces in which they use the same violent strategies and the same language of religious and cultural nationalism used by the states they seek to replace.

Many of the foot soldiers in these struggles will find, like those who fought apartheid in South Africa, that once they overcome overt occupation, they will be left with another battle on their hands - a battle against covert economic colonialism.

Meanwhile, as the rift between rich and poor is being driven deeper and the battle to control the world's resources intensifies. Economic colonialism through formal military aggression is staging a comeback.

Iraq today is a tragic illustration of this process. An illegal invasion. A brutal occupation in the name of liberation. The rewriting of laws that allow the shameless appropriation of the country's wealth and resources by corporations allied to the occupation, and now the charade of a local "Iraqi government."

For these reasons, it is absurd to condemn the resistance to the U.S. occupation in Iraq, as being masterminded by terrorists or insurgents or supporters of Saddam Hussein. After all if the United States were invaded and occupied, would everybody who fought to liberate it be a terrorist or an insurgent or a Bushite?

The Iraqi resistance is fighting on the frontlines of the battle against Empire. And therefore that battle is our battle.

Like most resistance movements, it combines a motley range of assorted factions. Former Baathists, liberals, Islamists, fed-up collaborationists, communists, etc. Of course, it is riddled with opportunism, local rivalry, demagoguery, and criminality. But if we are only going to support pristine movements, then no resistance will be worthy of our purity.

This is not to say that we shouldn't ever criticize resistance movements. Many of them suffer from a lack of democracy, from the iconization of their "leaders," a lack of transparency, a lack of vision and direction. But most of all they suffer from vilification, repression, and lack of resources.

Before we prescribe how a pristine Iraqi resistance must conduct their secular, feminist, democratic, nonviolent battle, we should shore up our end of the resistance by forcing the U.S. and its allies government to withdraw from Iraq.

The first militant confrontation in the United States between the global justice movement and the neoliberal junta took place famously at the WTO conference in Seattle in December 1999. To many mass movements in developing countries that had long been fighting lonely, isolated battles, Seattle was the first delightful sign that their anger and their vision of another kind of world was shared by people in the imperialist countries.

In January 2001, in Porto Alegre, Brazil, 20,000 activists, students, film makers - some of the best minds in the world - came together to share their experiences and exchange ideas about confronting Empire. That was the birth of the now historic World Social Forum. It was the first, formal coming together of an exciting, anarchic, unindoctrinated, energetic, new kind of "Public Power." The rallying cry of the WSF is "Another World is Possible." It has become a platform where hundreds of conversations, debates, and seminars have helped to hone and refine a vision of what kind of world it should be.

By January 2004, when the fourth WSF was held in Mumbai, India, it attracted 200,000 delegates. I have never been part of a more electrifying gathering. It was a sign of the social forum's success that the mainstream media in India ignored it completely. But now, the WSF is threatened by its own success. The safe, open, festive atmosphere of the forum has allowed politicians and nongovernmental organizations that are imbricated in the political and economic systems that the forum opposes to participate and make themselves heard.

Another danger is that the WSF, which has played such a vital role in the movement for global justice, runs the risk of becoming an end unto itself. Just organizing it every year consumes the energies of some of the best activists. If conversations about resistance replace real civil disobedience, then the WSF could become an asset to those whom it was created to oppose. The forum must be held and must grow, but we have to find ways to channel our conversations there back into concrete action.

As resistance movements have begun to reach out across national borders and pose a real threat, governments have developed their own strategies of how to deal with them. They range from cooptation to repression.

I'm going to speak about three of the contemporary dangers that confront resistance movements: the difficult meeting point between mass movements and the mass media, the hazards of the NGO-ization of resistance, and the confrontation between resistance movements and increasingly repressive states.

The place in which the mass media meets mass movements is a complicated one.

Governments have learned that a crisis-driven media cannot afford to hang about in the same place for too long. Like business houses need a cash turnover, the media need crises turnover. Whole countries become old news. They cease to exist, and the darkness becomes deeper than before the light was briefly shone on them. We saw it happen in Afghanistan when the Soviets withdrew. And now, after Operation Enduring Freedom put the CIA's Hamid Karzai in place, Afghanistan has been thrown to its warlords once more.

Another CIA operative, Iyad Allawi, has been installed in Iraq, so perhaps it's time for the media to move on from there, too.

While governments hone the art of waiting out crisis, resistance movements are increasingly being ensnared in a vortex of crisis production, seeking to find ways of manufacturing them in easily consumable, spectator-friendly formats.

Every self-respecting peoples' movement, every "issue" is expected to have its own hot air balloon in the sky advertising its brand and purpose.

For this reason, starvation deaths are more effective advertisements for impoverishment than millions of malnourished people, who don't quite make the cut. Dams are not newsworthy until the devastation they wreak makes good television. (And by then, it's too late).

Standing in the rising water of a reservoir for days on end, watching your home and belongings float away to protest against a big dam used to be an effective strategy, but isn't any more. The media is dead bored of that one. So the hundreds of thousands of people being displaced by dams are expected to either conjure new tricks or give up the struggle.

Colorful demonstrations and weekend marches are vital but alone are not powerful enough to stop wars. Wars will be stopped only when soldiers refuse to fight, when workers refuse to load weapons onto ships and aircrafts, when people boycott the economic outposts of Empire that are strung across the globe.

If we want to reclaim the space for civil disobedience, we will have to liberate ourselves from the tyranny of crisis reportage and its fear of the mundane. We have to use our experience, our imagination, and our art to interrogate the instruments of that state that ensure that "normality" remains what it is: cruel, unjust, unacceptable. We have to expose the policies and processes that make ordinary things - food, water, shelter and dignity - such a distant dream for ordinary people. Real pre-emptive strike is to understand that wars are the end result of flawed and unjust peace.

As far as mass resistance movements are concerned, the fact is that no amount of media coverage can make up for mass strength on the ground. There is no option, really, to old-fashioned, back-breaking political mobilization.

Corporate globalization has increased the distance between those who make decisions and those who have to suffer the effects of those decisions. Forums like the WSF enable local resistance movements to reduce that distance and to link up with their counterparts in rich countries. That alliance is an important and formidable one. For example, when India's first private dam, the Maheshwar Dam, was being built, alliances between the Narmada Bachao Andolan (the NBA), the German organization Urgewald, the Berne Declaration in Switzerland, and the International Rivers Network in Berkeley worked together to push a series of international banks and corporations out of the project. This would not have been possible had there not been a rock solid resistance movement on the ground. The voice of that local movement was amplified by supporters on the global stage, embarrassing and forcing investors to withdraw.

An infinite number of similar, alliances, targeting specific projects and specific corporations would help to make another world possible. We should begin with the corporations who did business with Saddam Hussein and now profit from the devastation and occupation of Iraq.

A second hazard facing mass movements is the NGO-ization of resistance. It will be easy to twist what I'm about to say into an indictment of all NGOs. That would be a falsehood. In the murky waters of fake NGOs set up or to siphon off grant money or as tax dodges (in states like Bihar, they are given as dowry), of course there are NGOs doing valuable work. But it's important to consider the NGO phenomenon in a broader political context.

In India, for instance, the funded NGO boom began in the late 1980s and 1990s. It coincided with the opening of India's markets to neoliberalism. At the time, the Indian state, in keeping with the requirements of structural adjustment, was withdrawing funding from rural development, agriculture, energy, transport, and public health. As the state abdicated its traditional role, NGOs moved in to work in these very areas. The difference, of course, is that the funds available to them are a minuscule fraction of the actual cut in public spending. Most large funded NGOs are financed and patronized by aid and development agencies, which are in turn funded by Western governments, the World Bank, the UN, and some multinational corporations. Though they may not be the very same agencies, they are certainly part of the same loose, political formation that oversees the neoliberal project and demands the slash in government spending in the first place.

Why should these agencies fund NGOs? Could it be just old-fashioned missionary zeal? Guilt? It's a little more than that. NGOs give the impression that they are filling the vacuum created by a retreating state. And they are, but in a materially inconsequential way. Their real contribution is that they defuse political anger and dole out as aid or benevolence what people ought to have by right.

They alter the public psyche. They turn people into dependent victims and blunt the edges of political resistance. NGOs form a sort of buffer between the sarkar and public. Between Empire and its subjects. They have become the arbitrators, the interpreters, the facilitators.

In the long run, NGOs are accountable to their funders, not to the people they work among. They're what botanists would call an indicator species. It's almost as though the greater the devastation caused by neoliberalism, the greater the outbreak of NGOs. Nothing illustrates this more poignantly than the phenomenon of the U.S. preparing to invade a country and simultaneously readying NGOs to go in and clean up the devastation.

In order make sure their funding is not jeopardized and that the governments of the countries they work in will allow them to function, NGOs have to present their work in a shallow framework more or less shorn of a political or historical context. At any rate, an inconvenient historical or political context.

Apolitical (and therefore, actually, extremely political) distress reports from poor countries and war zones eventually make the (dark) people of those (dark) countries seem like pathological victims. Another malnourished Indian, another starving Ethiopian, another Afghan refugee camp, another maimed Sudanese . . . in need of the white man's help. They unwittingly reinforce racist stereotypes and re-affirm the achievements, the comforts, and the compassion (the tough love) of Western civilization. They're the secular missionaries of the modern world.

Eventually - on a smaller scale but more insidiously - the capital available to NGOs plays the same role in alternative politics as the speculative capital that flows in and out of the economies of poor countries. It begins to dictate the agenda. It turns confrontation into negotiation. It depoliticizes resistance. It interferes with local peoples' movements that have traditionally been self-reliant. NGOs have funds that can employ local people who might otherwise be activists in resistance movements, but now can feel they are doing some immediate, creative good (and earning a living while they're at it). Real political resistance offers no such short cuts.

The NGO-ization of politics threatens to turn resistance into a well-mannered, reasonable, salaried, 9-to-5 job. With a few perks thrown in. Real resistance has real consequences. And no salary.

This brings us to a third danger I want to speak about tonight: the deadly nature of the actual confrontation between resistance movements and increasingly repressive states. Between public power and the agents of Empire.

Whenever civil resistance has shown the slightest signs of evolving from symbolic action into anything remotely threatening, the crack down is merciless. We've seen what happened in the demonstrations in Seattle, in Miami, in Göthenberg, in Genoa.

In the United States, you have the USA PATRIOT Act, which has become a blueprint for antiterrorism laws passed by governments across the world. Freedoms are being curbed in the name of protecting freedom. And once we surrender our freedoms, to win them back will take a revolution.

Some governments have vast experience in the business of curbing freedoms and still smelling sweet. The government of India, an old hand at the game, lights the path.

Over the years the Indian government has passed a plethora of laws that allow it to call almost anyone a terrorist, an insurgent, a militant. We have the Armed Forces Special Powers Act, the Public Security Act, the Special Areas Security Act, the Gangster Act, the Terrorist and Disruptive Areas Act (which has formally lapsed but under which people are still facing trial), and, most recently, POTA (the Prevention of Terrorism Act), the broad-spectrum antibiotic for the disease of dissent.

There are other steps that are being taken, such as court judgments that in effect curtail free speech, the right of government workers to go on strike, the right to life and livelihood. Courts have begun to micro-manage our lives in India. And criticizing the courts is a criminal offense.

But coming back to the counter-terrorism initiatives, over the last decade, the number of people who have been killed by the police and security forces runs into the tens of thousands. In the state of Andhra Pradesh (the pin-up girl of corporate globalization in India), an average of about 200 "extremists" are killed in what are called "encounters" every year. The Mumbai police boast of how many "gangsters" they have killed in "shoot outs." In Kashmir, in a situation that almost amounts to war, an estimated 80,000 people have been killed since 1989. Thousands have simply "disappeared." In the northeastern provinces, the situation is similar.

In recent years, the Indian police have opened fire on unarmed people, mostly Dalit and Adivasi. Their preferred method is to kill them and then call them terrorists. India is not alone, though. We have seen similar thing happen in countries such Bolivia, Chile, and South Africa. In the era of neoliberalism, poverty is a crime and protesting against it is more and more being defined as terrorism.

In India, POTA (the Prevention of Terrorism Act) is often called the Production of Terrorism Act. It's a versatile, hold-all law that could apply to anyone from an al-Qaeda operative to a disgruntled bus conductor. As with all anti-terrorism laws, the genius of POTA is that it can be whatever the government wants. After the 2002 state-assisted pogrom in Gujarat, in which an estimated 2,000 Muslims were savagely killed by Hindu mobs and 150,000 driven from their homes, 287 people have been accused under POTA. Of these, 286 are Muslim and one is a Sikh.

POTA allows confessions extracted in police custody to be admitted as judicial evidence. In effect, torture tends to replace investigation. The South Asia Human Rights Documentation Center reports that India has the highest number of torture and custodial deaths in the world. Government records show that there were 1,307 deaths in judicial custody in 2002 alone.

A few months ago, I was a member of a peoples' tribunal on POTA. Over a period of two days, we listened to harrowing testimonies of what is happening in our wonderful democracy. It's everything - from people being forced to drink urine, to being stripped, humiliated, given electric shocks, burned with cigarette butts, having iron rods put up their anuses, to being beaten and kicked to death.

The new government has promised to repeal POTA. I'd be surprised if that happens before similar legislation under a different name is put in place. If its not POTA it'll be MOTA or something.

When every avenue of non-violent dissent is closed down, and everyone who protests against the violation of their human rights is called a terrorist, should we really be surprised if vast parts of the country are overrun by those who believe in armed struggle and are more or less beyond the control of the state: in Kashmir, the north eastern provinces, large parts of Madhya Pradesh, Chattisgarh, Jharkhand, and Andhra Pradesh. Ordinary people in these regions are trapped between the violence of the militants and the state.

In Kashmir, the Indian army estimates that 3,000 to 4,000 militants are operating at any given time. To control them, the Indian government deploys about 500,000 soldiers. Clearly, it isn't just the militants the army seeks to control, but a whole population of humiliated, unhappy people who see the Indian army as an occupation force.

The Armed Forces Special Powers Act allows not just officers, but even junior commissioned officers and non-commissioned officers of the army, to use force and even kill any person on suspicion of disturbing public order. It was first imposed on a few districts in the state of Manipur in 1958. Today, it applies to virtually all of the north east and Kashmir. The documentation of instances of torture, disappearances, custodial deaths, rape, and summary execution by security forces is enough to turn your stomach.

In Andhra Pradesh, in India's heartland, the militant Marxist-Leninist Peoples' War Group - which for years been engaged in a violent armed struggle and has been the principal target of many of the Andhra police's fake "encounters" - held its first public meeting in years on July 28, 2004, in the town of Warangal.

It was attended by about hundreds of thousands of people. Under POTA, all of them are considered terrorists. Are they all going to be detained in some Indian equivalent of Guantánamo Bay?

The whole of the north east and the Kashmir valley is in ferment. What will the government do with these millions of people?

There is no discussion taking place in the world today that is more crucial than the debate about strategies of resistance. And the choice of strategy is not entirely in the hands of the public. It is also in the hands of sarkar.

After all, when the U.S. invades and occupies Iraq in the way it has done, with such overwhelming military force, can the resistance be expected to be a conventional military one? (Of course, even if it were conventional, it would still be called terrorist.) In a strange sense, the U.S. government's arsenal of weapons and unrivalled air and fire power makes terrorism an all-but-inescapable response. What people lack in wealth and power, they will make up with stealth and strategy.

In this restive, despairing time, if governments do not do all they can to honor nonviolent resistance, then by default they privilege those who turn to violence. No government's condemnation of terrorism is credible if it cannot show itself to be open to change by to nonviolent dissent.

But instead nonviolent resistance movements are being crushed. Any kind of mass political mobilization or organization is being bought off, or broken, or simply ignored.

Meanwhile, governments and the corporate media, and let's not forget the film industry, lavish their time, attention, technology, research, and admiration on war and terrorism. Violence has been deified.

The message this sends is disturbing and dangerous: If you seek to air a public grievance, violence is more effective than nonviolence.

As the rift between the rich and poor grows, as the need to appropriate and control the world's resources to feed the great capitalist machine becomes more urgent, the unrest will only escalate.

For those of us who are on the wrong side of Empire, the humiliation is becoming unbearable.

Each of the Iraqi children killed by the United States was our child. Each of the prisoners tortured in Abu Ghraib was our comrade. Each of their screams was ours. When they were humiliated, we were humiliated. The U.S. soldiers fighting in Iraq - mostly volunteers in a poverty draft from small towns and poor urban neighborhoods - are victims just as much as the Iraqis of the same horrendous process, which asks them to die for a victory that will never be theirs.

The mandarins of the corporate world, the CEOs, the bankers, the politicians, the judges and generals look down on us from on high and shake their heads sternly. "There's no Alternative," they say. And let slip the dogs of war.

Then, from the ruins of Afghanistan, from the rubble of Iraq and Chechnya, from the streets of occupied Palestine and the mountains of Kashmir, from the hills and plains of Colombia and the forests of Andhra Pradesh and Assam comes the chilling reply: "There's no alternative but terrorism." Terrorism. Armed struggle. Insurgency. Call it what you want.

Terrorism is vicious, ugly, and dehumanizing for its perpetrators, as well as its victims. But so is war. You could say that terrorism is the privatization of war. Terrorists are the free marketers of war. They are people who don't believe that the state has a monopoly on the legitimate use of violence.

Human society is journeying to a terrible place.

Of course, there is an alternative to terrorism. It's called justice.

It's time to recognize that no amount of nuclear weapons or full-spectrum dominance or daisy cutters or spurious governing councils and loya jirgas can buy peace at the cost of justice.

The urge for hegemony and preponderance by some will be matched with greater intensity by the longing for dignity and justice by others.

Exactly what form that battle takes, whether its beautiful or bloodthirsty, depends on us.

Opinión

¿Con qué detergente lavas? El poder público en la era del imperio

Arundhati Roy

Discurso completo pronunciado por en San Francisco, California

Me han pedido que hable acerca del "poder público en la era del imperio". No acostumbro hacer lo que se me dice, pero por una feliz casualidad eso es precisamente de lo que quiero hablar hoy.

Cuando vemos cómo se destripa y se desangra el lenguaje, ¿qué entendemos por "poder público"? Cuando la libertad significa ocupación; la democracia, capitalismo neoliberal; la reforma, represión; y palabras como "emancipación" y "misión de paz" le hielan a una la sangre, entonces una expresión como "poder público" puede significar lo que quiera cada uno. Por ejemplo, una máquina para desarrollar los bíceps o un producto de limpieza. Así que voy a tener que definir el "poder público" por el camino, digamos que arrimando el ascua a mi sardina.

En la India, la palabra "public" está incorporada a la lengua hindú. Significa pueblo. En hindú tenemos "sarkar" y "public", el gobierno y el pueblo. Este uso implica la suposición de que el gobierno es algo aparte de "el pueblo". La distinción tiene mucho que ver con el hecho de que la lucha por la libertad en la India, aunque magnífica, no fue ni mucho menos revolucionaria. La élite india se calzó con facilidad y elegancia los zapatos que dejaron los imperialistas británicos. Una sociedad extremadamente empobrecida y esencialmente feudal se convirtió en una nación estado independiente y moderna. Hoy, cuando han pasado cincuenta y siete años exactos, los verdaderos vencidos todavía ven al gobierno como "mai-baap", el padre y proveedor. El sector ligeramente más radical, los que todavía tienen fuego en las entrañas, lo ven como "chor", el ladrón, el que arrebata todas las cosas.

Sea como sea, para la mayoría de los indios, "sarkar" es algo muy diferente de "public". Sin embargo, a medida que se suben los peldaños de la escala social, la distinción entre "sarkar" y "public" se diluye. A la élite india, como a todas las élites del mundo, le cuesta separarse del estado. Ve lo que ve el estado, piensa como el estado, habla como el estado.

En contraste, en Estados Unidos la distinción entre "sarkar" y "public" se ha difuminado a niveles mucho más profundos dentro de la sociedad. Esto podría ser indicativo de una democracia robusta, pero desgraciadamente el asunto es un poco más complicado y menos lindo. Entre otras cosas está relacionado con la intrincada trama de paranoia urdida por el "sarkar" estadounidense y difundida por las corporaciones mediáticas y por Hollywood. Los estadounidenses normales se han visto manipulados hasta imaginar que son un pueblo en estado de sitio cuyo único refugio y protección provienen de su gobierno. Si no son los comunistas, es Al Qaeda. Si no es Cuba, es Nicaragua. El resultado es que la nación más poderosa del mundo, con su inigualable arsenal, su historial de combate y financiación de innumerables guerras, y la única nación que ha hecho uso de la bomba atómica, está habitada por una ciudadanía aterrorizada que se asusta hasta de su sombra. Un pueblo atado al estado, no por las prestaciones sociales, la sanidad pública o las garantías laborales, sino por el miedo.

Este miedo de fabricación sintética se utiliza para conseguir el apoyo del pueblo a más actos de agresión, y así se va construyendo una espiral de histeria autoreplicante, ya calibrada oficialmente por el gobierno estadounidense en su programa Alertas Terroristas en Rutilante Tecnicolor: fucsia, azul turquesa, rosa salmón.

A los que la miramos desde afuera, esta fusión de "sarkar" y "public" en EEUU a veces nos hace difícil distinguir entre las acciones del gobierno de EEUU y las del pueblo estadounidense. Esta confusión es lo que alimenta al antiamericanismo en el mundo. Entonces el gobierno estadounidense se aferra al antiamericanismo y lo amplifica por medio de sus leales medios de comunicación. Ya conocen la rutina: "¿Por qué nos odian? Odian nuestras libertades"... etc, etc. De esta forma se refuerza la sensación de aislamiento de la población de EEUU y hace más estrecho todavía el abrazo entre "sarkar" y "public". Como Caperucita Roja buscando el calorcito de la cama del lobo.

El uso de la amenaza de un enemigo externo para unificar a la población en favor de uno es un burro viejo al que se suben los políticos desde hace siglos para entrar por las puertas del poder. Pero a lo mejor la gente normal está harta de ese pobre burro y busca otra cosa. Una antigua canción de película hindú dice: "yeh public hai, yeh sab jaanti hai" (el pueblo sí lo sabe todo). ¿No sería estupendo si la canción tuviera razón y los políticos no?

Antes de la invasión ilegal de Irak por Washington, una encuesta de Gallup International indicaba que en ningún país europeo el apoyo a una guerra unilateral superaba el 11%. El 15 de febrero de 2003, pocas semanas antes de la invasión, más de diez millones de personas se manifestaron en contra de la guerra en los distintos continentes, América del Norte inclusive. Y aún así los gobiernos de muchos países supuestamente democráticos se unieron a la guerra.

La cuestión es si la "democracia" sigue siendo democrática.

¿Los gobiernos democráticos tienen que rendir cuentas a las personas que los eligieron? Y, crucialmente, ¿el "public" de los países democráticos es responsable de las acciones de su "sarkar"?

Si nos ponemos a pensar, la lógica en la que se basa la guerra contra el terrorismo y la lógica en que se basa el terrorismo es exactamente la misma. Ambas obligan a los ciudadanos a pagar por las acciones de sus gobiernos. Al Qaeda obligó al pueblo de los EEUU a pagar con sus vidas las acciones de su gobierno en Palestina, Arabia Saudí, Irak y Afganistán. El gobierno estadounidense ha obligado al pueblo afgano a pagar con miles de vidas las acciones de los talibanes, y el pueblo iraquí está pagando con cientos de miles más las acciones de Sadam Husein.

La diferencia esencial es que en realidad nadie había votado a Al Qaeda, a los talibanes o a Sadam Husein. Pero el presidente de los Estados Unidos sí que había ganado elecciones (bueno, por decirlo de alguna manera).

Los jefes de gobierno de Italia, España y Reino Unido habían ganado elecciones. ¿No podría decirse, entonces, que los ciudadanos de estos países son más responsables de las acciones de sus gobiernos que lo son los iraquíes de las acciones de Sadam Husein, o los afganos de las de los talibanes?

¿Cuál de sus respectivos dioses decide si ésta o la otra es una "guerra justa"? George Bush padre dijo una vez: "Yo nunca pediré disculpas en nombre de EEUU. No me importa lo que haya pasado". Cuando el presidente del país más poderoso del mundo no necesita que le importe lo que haya ocurrido, por lo menos podemos estar seguros de que hemos entrado en la era del imperio.

Así que, ¿qué significado tiene el poder público en la era del imperio? ¿Tiene algún significado? ¿Existe en realidad?

En estos tiempos presuntamente democráticos el pensamiento político convencional afirma que el poder público se ejerce en las urnas. Docenas de países de todo el mundo irán a las urnas este año, y la mayoría (no todos) tendrán los gobiernos a los que hayan votado. Pero ¿conseguirán tener los gobiernos a los que aspiran?

En la India este año votamos la derrota de los nacionalistas hindúes. Sin embargo, mientras estábamos celebrándolo, sabíamos ya que en lo que se refiere al armamento nuclear, el neoliberalismo, la privatización, la censura, los grandes pantanos, es decir, en todas las cuestiones importantes, aparte del nacionalismo hindú descarado, el Partido del Congreso y el BJP no presentan grandes diferencias ideológicas. Sabemos también que fueron los cincuenta años de existencia del Partido del Congreso los que abrieron el camino, cultural y políticamente, a la extrema derecha. También fue el Partido del Congreso el que abrió los mercados de la India a la globalización corporativa.

En su campaña electoral, el Partido del Congreso aseguraba que estaba dispuesto a revisar parte de su política económica. Millones de personas, de las más pobres de la India, salieron a votar en masa en estas elecciones. El espectáculo de la gran democracia india se televisó en directo: los agricultores pobres, los ancianos y enfermos, las mujeres cubiertas de velos con sus hermosas joyas de plata, acudiendo a los colegios electorales sobre elefantes, camellos y carros de bueyes en un espectáculo encantadoramente anacrónico. En contra de las predicciones de todos los expertos y encuestadores de la India, el Congreso obtuvo más votos que ningún otro partido. Los partidos comunistas consiguieron el mayor número de votos de su historia. Los pobres de la India votaron claramente en contra de las "reformas" económicas del neoliberalismo y el fascismo creciente. En cuanto se contaron los votos, los grandes medios de comunicación los despacharon como si fueran figurantes baratos en un rodaje. Los canales de televisión desplegaban pantallas partidas: en la mitad de la pantalla aparecía el caos que se había formado a la puerta de la residencia de Sonia Gandhi, líder del Partido del Congreso, mientras se improvisaba un gobierno de coalición.

La otra mitad mostraba, a las puertas del Mumbai Stock Exchange, a los corredores de bolsa frenéticos por la preocupación, por si al Partido del Congreso se le ocurría cumplir sus promesas y llevar a cabo las propuestas electorales que lo habían llevado al poder. Vimos el índice bursátil Sensex subir, bajar y dar tumbos. Los medios de comunicación, cuyos propios valores estaban cayendo en picado, daban la noticia del colapso bursátil como si Pakistán acabara de lanzar misiles balísticos intercontinentales sobre Nueva Delhi.

Antes incluso de la toma de posesión del nuevo gobierno, hubo políticos de primera fila del Partido del Congreso que hicieron declaraciones públicas en las que aseguraban a los inversores y a los medios que la privatización de los servicios públicos continuaría. Entretanto, el BJP, al pasar a la oposición, ha comenzado a poner objeciones, de forma tan cínica como cómica, a la inversión extranjera directa y a una mayor apertura de los mercados indios.

Esta es la falsa dialéctica que está adoptando la democracia electoral.

En cuanto a los indios pobres, una vez que han suministrado los votos, carretera y manta, que la política se decidirá sin contar con ellos.

¿Y en las elecciones de EEUU? ¿Tienen opción los votantes?

Es cierto que si John Kerry llega a ser presidente, cambiarán algunos de los magnates del petróleo y fundamentalistas cristianos de la Casa Blanca. Serán pocos los que sientan perder de vista a truhanes descarados como Dick Cheney, Donald Rumsfeld o John Ashcroft. Lo que sí es preocupante es que la nueva administración conservará su política. Que tendremos Bushismo sin Bush.

Los que están realmente en el poder - los banqueros, directivos etc - no son vulnerables al voto (y de todas formas financian a ambos lados).

Por desgracia, la importancia de las elecciones estadounidenses ha degenerado en una contienda entre personalidades. Una trifulca para dirimir quién sería el mejor capataz del imperio. John Kerry cree en la idea del imperio con el mismo fervor que George Bush.

El sistema político de EEUU está cuidadosamente confeccionado para impedir que cualquiera que cuestione la bondad natural de la estructura de poder militar-industrial-corporativa pueda entrar por las puertas del poder.

En este contexto, no sorprende a nadie que en estas elecciones los dos contendientes sean licenciados de la Universidad de Yale, ambos miembros de la sociedad secreta "Skull and Bones" (La calavera), ambos millonarios que juegan a los soldaditos, ambos pregonando la guerra y discutiendo de manera casi pueril cuál de los dos sería el caudillo más eficiente en la guerra contra el terror.

Al igual que su predecesor el presidente Clinton, Kerry continuará la expansión del poder económico y militar de EEUU en el mundo. Dice que hubiera votado a favor de la guerra de Bush en Irak aún sabiendo que Irak no tenía armas de destrucción masiva. Promete asignar más tropas a Irak. Recientemente ha dicho que apoya al cien por cien la política de Bush en relación con Israel y Ariel Sharon. Dice que mantendrá el 98% de los recortes fiscales de Bush.

Así que, por debajo del histérico intercambio de insultos, el consenso es casi absoluto. Parece que, incluso si el electorado americano vota a Kerry, de todas formas seguirá estando Bush: El presidente John Kerbush o el presidente George Berry.

La posibilidad de elegir no es real, sino aparente. Es como elegir una marca de detergente. Compres Tide o compres Ivory Snow, los dos son de Procter and Gamble.

Esto no significa que la posición de cada uno no tenga sus matices, que el Congreso y el BJP, los neolaboristas y los conservadores, los demócratas y los republicanos sean lo mismo. Claro que no lo son. Tampoco lo son Tide y Ivory Snow: Tide tiene oxígeno activo y Ivory Snow es un jabón suave.

En la India, hay diferencias entre un partido abiertamente fascista (el BJP) y otro que taimadamente enfrenta a una comunidad con otra (Congreso), sembrando las semillas del comunalismo que luego cosecha hábilmente el BJP.

Existen diferencias en los niveles de inteligencia e insensibilidad de los actuales candidatos a presidente de los EEUU. El movimiento contra la guerra en EEUU ha realizado una labor extraordinaria al poner de manifiesto las mentiras y la venalidad que dieron lugar a la invasión de Irak, a pesar de la propaganda e intimidación a las que se enfrentaban.

Esta acción prestó un gran servicio no sólo al pueblo estadounidense, sino al mundo entero. Pero ahora, si el movimiento contra la guerra se une abiertamente a la campaña de Kerry, el resto del mundo pensará que está de acuerdo con su política de imperialismo "sensible". ¿Es preferible el imperialismo de EEUU si lo apoyan la ONU y los países europeos? ¿Es preferible que la ONU pida soldados a India y Pakistán para que maten y mueran en Irak en lugar de los soldados estadounidenses? ¿Es verdad que el único cambio que pueden esperar los iraquíes es que las compañias francesas, alemanas y rusas participen en el saqueo de su país?

¿Es esto mejor o peor para los que vivimos en naciones vasallas? ¿es mejor para el mundo tener un emperador más listo en el poder, o uno más tonto? ¿Es ésa nuestra única alternativa?

Perdónenme, ya sé que estas son preguntas incómodas, incluso brutales, pero es necesario plantearlas.

Lo cierto es que la democracia electoral se ha convertido en un proceso de manipulación cínica. Ofrece un espacio político muy reducido, y sería ingenuo creer que en este espacio hay opciones reales.

La crisis de la democracia moderna es profunda.

En el escenario global, más allá de la jurisdicción de los gobiernos soberanos, los instrumentos internacionales de comercio y finanzas supervisan un complejo sistema de leyes multilaterales y acuerdos que han consolidado un sistema de apropiación que daría vergüenza a los colonialistas. Este sistema permite la entrada y salida sin restricciones de cantidades ingentes de capital especulativo - dinero caliente - de los países del tercer mundo, que acaba prácticamente por dictar su política económica. Utilizando la amenaza de la fuga de capital como palanca, el capital internacional penetra cada vez más en todos los niveles de estas economías. Las gigantes corporaciones transnacionales están tomando las riendas de sus infraestructuras esenciales y sus recursos naturales, sus minerales, su agua, su electricidad. La Organización Mundial del Comercio, el Banco Mundial, el Fondo Monetario Internacional y otras instituciones financieras como el Banco Asiático de Desarrollo, prácticamente escriben la política económica y la legislación parlamentaria. Arrogantes y despiadados, blanden sus mazas contra sociedades históricamente complejas, frágiles, interdependientes, y las asolan.

Todo esto, por cierto, bajo el alegre ondear de la pancarta de la "reforma".

Como consecuencia de esta reforma, en Africa, Asia y América latina, miles de negocios e industrias de pequeña envergadura han quebrado. Millones de trabajadores y agricultores han perdido sus empleos y sus tierras.

La revista "The Spectator", de Londres, nos asegura que "vivimos en la era más feliz, sana y pacífica de la historia de la humanidad". Miles de millones de personas preguntarían ¿de qué "nosotros" habla? ¿Dónde viven? ¿Cómo se llaman?

Lo que hay que comprender es que la democracia moderna está cimentada por una aceptación casi religiosa de la nación-estado. Pero la globalización de las corporaciones no lo está. El capital líquido no lo está. Por tanto, aunque el capital requiera el poder de coerción de la nación estado para acallar las revueltas en las habitaciones de los sirvientes, el sistema garantiza que ninguna nación pueda oponerse a la globalización por su cuenta y riesgo.

Un cambio radical no puede ser ni será nunca algo negociado por los gobiernos: sólo lo puede ejecutar el pueblo, el público. Un público capaz de darse la mano a través de las fronteras.

Así, cuando hablamos del "poder público en la era del imperio", espero que no parezca presuntuoso asumir que lo único que vale la pena debatir en serio es el poder de un público que disiente, un público que está en desacuerdo con el propio concepto de imperio, un público que se enfrenta con los que ocupan el poder: los gobiernos e instituciones internacionales, nacionales, regionales o provinciales que apoyan y prestan servicios al imperio.

¿Cuáles son las vías de protesta que pueden emplear las personas que desean resistir al imperio? Cuando digo "resistir" no me refiero sólo a expresar nuestro desacuerdo, sino a forzar un cambio real. El imperio tiene una amplia gama de tarjetas de visita. Utiliza distintas armas para descerrajar los distintos mercados, ya saben, como el talonario o el misil crucero.

Para los pobres de muchos países, el imperio no aparece siempre en forma de misiles o tanques, como en Irak, Afganistán o Vietnam. Aparece en sus vidas en forma de avatares muy locales: la pérdida del empleo, recibos de la luz impagables, cortes en el suministro de agua, desahucios de viviendas, desalojos de tierras... todo esto supervisado por la maquinaria represora del estado, la policía, el ejército, el poder judicial. Se trata de un proceso de empobrecimiento implacable que los pobres conocen muy bien a lo largo de su historia. Lo que hace el imperio es reforzar y exacerbar las desigualdades existentes.

Hasta hace bastante poco a la gente le costaba a veces verse a sí mismos como víctimas de las conquistas del imperio. Pero actualmente los conflictos locales están viendo cada vez más claro su propio papel. Por muy grandilocuente que suene, lo cierto es que se están enfrentando al imperio, cada uno a su manera, que es muy diferente en Irak, Sudáfrica, India, Argentina y, cómo no, en las calles de Europa y de Estados Unidos.

Los movimientos de resistencia de masas, los activistas, periodistas, artistas y cineastas se han unido para quitarle brillo al imperio. Han atado cabos, han convertido los flujogramas y los discursos de los consejos de administración en historias reales sobre personas reales y desesperanzas reales. Han demostrado cómo el proyecto neoliberal lo ha pagado la gente con sus viviendas, sus tierras, sus empleos, su libertad, su dignidad. Han hecho tangible lo intangible. El que antaño parecía un enemigo incorpóreo se ha hecho carne.

Esto es una gran victoria, forjada gracias a la unión de grupos políticos diferentes, con estrategias muy variadas. Pero lo que todos comprendieron es que el objeto de su rabia, de su activismo y su empeño es el mismo. Este fue el principio de la verdadera globalización: la globalización de la inconformidad.

En general, hoy en día hay dos tipos de movimientos de resistencia de masas en los países del tercer mundo. El movimiento de los sin tierra de Brasil, el movimiento anti-pantanos en la India, los zapatistas de Méjico, el foro anti-privatización de Sudáfrica y varios cientos más están luchando contra sus propios gobiernos soberanos, que han pasado a ser agentes del proyecto neoliberal. La mayor parte de éstos son conflictos radicales, en los que se lucha por cambiar la estructura y el modelo elegido para el "desarrollo" de sus sociedades.

Los otros son los que luchan contra ocupaciones neocoloniales tan oficiales como brutales en territorios disputados, cuyas fronteras dibujaron las potencias imperialistas en el siglo pasado. Los pueblos de Palestina, Tíbet, Tchetchênia, Caxemira y varios estados del nordeste de la India mantienen una lucha por la autodeterminación.

Algunas de estas luchas podrían haber sido radicales, e incluso revolucionarias, en sus comienzos, pero a menudo la brutalidad de la represión con que se encuentran las empuja hacia áreas conservadoras e incluso retrógradas, en las que las estrategias de violencia y el lenguaje de nacionalismo religioso y cultural que se emplean son idénticos a los de los estados que pretenden sustituir.

Muchos de los soldados rasos de estas contiendas se encontrarán, al igual que los que lucharon contra el apartheid en Sudáfrica, que una vez venzan a la ocupación van a tener otra guerra en las manos, una guerra contra el colonialismo económico encubierto.

Entretanto, a medida que el abismo entre ricos y pobres se profundiza y la batalla por el control de los recursos terrestres se intensifica, el colonialismo económico por medio de la agresión militar cabalga de nuevo.

El Irak de hoy proporciona una ilustración trágica de este proceso. Una invasión ilegal; una ocupación brutal en nombre de la liberación. La reelaboración de leyes que permiten la apropiación desvergonzada de la riqueza y los recursos del país por las corporaciones aliadas a la ocupación, y ahora la farsa de un "gobierno iraquí" local.

Por estas razones, es absurdo condenar la resistencia a la ocupación de Irak por EEUU basándose en que está organizada por terroristas, insurgentes o partidarios de Sadam Husein. Después de todo, si alguien invadiera y ocupara Estados Unidos, ¿serían todos los que lucharan por su liberación terroristas, insurgentes o bushistas?

La resistencia iraquí lucha en los frentes de la batalla contra el imperio, y en ese caso su lucha es la nuestra.

Como la mayoría de los movimientos de resistencia, está formado por una serie de facciones de distinto pelaje. Antiguos baathistas, liberales, islamistas, colaboracionistas descontentos, comunistas etc. Como es de esperar, está plagado de oportunismo, rivalidades locales, demagogia y delincuencia. Pero si sólo vamos a apoyar a los movimientos inmaculados, entonces ninguna resistencia merecerá nuestra pureza.

Esto no significa que no debamos criticar nunca a los movimientos de resistencia. Muchos de ellos adolecen de falta de democracia, de idolatría de sus líderes, de falta de transparencia, de falta de visión y dirección. Pero sobre todo sufren por la demonización, la represión y la falta de recursos.

Antes de decidir cómo debería dirigir una resistencia iraquí inmaculada su batalla laica, feminista, democrática y no violenta, deberíamos apuntalar la resistencia por nuestro lado obligando a EEUU y sus aliados a retirarse de Irak.

El primer enfrentamiento militar que se dio en EEUU entre el movimiento para la justicia global y la junta neoliberal tuvo lugar en la famosa conferencia de la OMC en Seattle en diciembre de 1999. Para muchos movimientos de masas en países en vías de desarrollo que llevaban mucho tiempo librando batallas aisladas y solitarias, Seattle fue la primera señal de alivio, que demostraba que su rabia y su visión de un mundo distinto también existían entre la gente de los países imperialistas.

En enero de 2001, en Porto Alegre, Brasil, se reunieron 20.000 activistas, estudiantes, cineastas - algunas de las mejores mentes del mundo - para poner en común sus experiencias e intercambiar ideas sobre cómo hacer frente al imperio. Así nació el ya histórico Foro Social Mundial. Esta era la primera reunión oficial de un tipo distinto de "poder público": estimulante, anárquico, nada indoctrinado, activo. El lema del FSM es "Otro mundo es posible". El foro se ha convertido en una plataforma en la que cientos de conversaciones, debates y seminarios han ayudado a templar y refinar una visión de cómo sería ese mundo.

En enero de 2004, se celebró el cuarto FSM en Mumbai, India, al que acudieron 200.000 delegados. Yo nunca había participado en una reunión tan vibrante. Una de las pruebas del éxito del foro social es que los medios de comunicación principales de la India lo ignoraron completamente. Pero ahora el FSM está amenazado por su propio éxito. El ambiente seguro, abierto y lúdico del foro ha permitido participar y ha dado voz a políticos y organizaciones no gubernamentales implicados en los sistemas políticos y económicos a los que se opone el foro.

Otro peligro es que el FSM, cuyo papel ha sido tan vital en el movimiento por la justicia global, corre el riesgo de convertirse en un fin en sí mismo. Solamente organizarlo todos los años consume las energías de algunos de los mejores activistas que tenemos. Si las conversaciones en torno a la resistencia sustituyen a la auténtica desobediencia civil, el FSM podría tornarse en algo valioso para aquéllos contra los que se creó. El foro se debe celebrar y tiene que crecer, pero tenemos que encontrar formas de canalizar esas conversaciones hacia acciones concretas.

A medida que los movimientos de resistencia se han estirado cruzando fronteras y han comenzado a suponer una amenaza real, los gobiernos han desarrollado sus propias estrategias para derrotarlos, sea por medio de la asimilación o la represión.

Voy a hablar de tres de los peligros actuales que afectan a los movimientos de resistencia: el difícil punto de encuentro entre los movimientos de masas y los medios de comunicación de masas; los riesgos de la ONG-ización de la resistencia; y el enfrentamiento entre los movimientos de resistencia y los estados cada vez más represivos.

El lugar en que los medios masivos se encuentran con los movimientos de masas es bastante complicado.

Los gobiernos se han dado cuenta de que unos medios que funcionan de crisis en crisis no se pueden permitir quedarse mucho tiempo en el mismo sitio. Al igual que los negocios requieren liquidez de dinero, los medios requieren liquidez de crisis. Países enteros se convierten en noticias pasadas: dejan de existir y la oscuridad se vuelve más profunda que antes de que los focos se detuvieran brevemente sobre ellos. Lo vimos en Afganistán cuando se retiraron los soviéticos, y ahora, una vez que la operación Libertad Duradera puso a Hamid Karzai, de la CIA, en el poder, Afganistán ha quedado una vez más en manos de sus guerreros feudales.

En Irak se ha instalado otro agente de la CIA, Iyad Allawi, así que quizá haya llegado la hora de que los medios se vayan también de allí.

Mientras los gobiernos refinan el arte de esperar a que pase cada crisis, los movimientos de resistencia se están enmarañando cada vez más en una espiral de producción de crisis, buscando las formas de fabricarlas en formatos de fácil consumo a medida de los espectadores.

Todo movimiento popular que se respete, todo "tema", ha de tener su propio globo publicitario en el aire anunciando su marca y su propósito.

Por esta razón, los muertos de hambre son más eficaces a la hora de dar publicidad a la pobreza que millones de personas desnutridas, que no llegan a dar la talla. Los pantanos no dan mucho juego como noticia hasta que la devastación que producen queda bien en televisión - cuando ya es demasiado tarde.

Pasarse días de pie en el agua mientras se va llenando el pantano, viendo cómo tu casa y tus posesiones se van flotando, solía ser una estrategia eficaz, pero ya no lo es. Ya aburre mortalmente a los medios. Así que, para capturar su atención, los cientos de miles de personas desplazadas por las presas tendrán que buscarse nuevos trucos o abandonar la lucha.

Las concentraciones coloridas y las manifestaciones de fin de semana son esenciales, pero por sí solas no son lo bastante potentes para parar las guerras. Las guerras sólo terminarán cuando los soldados se nieguen a luchar, cuando los trabajadores se nieguen a cargar armas en los buques y aviones, cuando el pueblo boicotee los centros económicos del imperio diseminados por todo el globo.

Si queremos reclamar el espacio de la desobediencia civil, tenemos que liberarnos de la tiranía del periodismo de crisis con su miedo a lo mundano. Tenemos que usar nuestra experiencia, nuestra imaginación y nuestro arte para interrogar a los instrumentos del estado que garantizan que la "normalidad" sea lo que es: cruel, injusta, inaceptable. Tenemos que sacar a la luz las políticas y procesos que hacen que las cosas de cada día - la comida, el agua, la vivienda y la dignidad - sean un sueño distante para la gente normal. El verdadero ataque preventivo es comprender que las guerras son el resultado final de una paz imperfecta e injusta.

En lo que se refiere a los movimientos de resistencia, lo cierto es que no hay cobertura de los medios comparable a la fuerza de las masas en acción sobre el terreno. No hay otra opción, de veras, que la agotadora movilización política.

La globalización de las corporaciones ha aumentado la distancia entre los que toman las decisiones y los que sufren las secuelas de esas decisiones. Los foros como el FSM permiten a los movimientos locales de resistencia reducir esa distancia y tomar contacto con los movimientos correspondientes en los países ricos. Esta es una alianza importante y formidable. Por ejemplo, cuando el primer pantano privado de la India, el Maheshwar Dam, estaba en construcción, las alianzas creadas entre la Narmada Bachao Andolaan (NBA), la organización alemana Urgewald, la Declaración de Berna en Suiza y la Red Internacional sobre Ríos de Berkeley en EEUU, se unieron para conseguir que una serie de bancos internacionales y corporaciones abandonaran el proyecto. Esto no hubiera sido posible si no hubiera existido sobre el terreno un movimiento de resistencia sólido como una piedra. La voz de ese movimiento local se vio amplificada por los que los apoyaban a nivel global, causando la deserción de los inversores, avergonzados.

Si se formaran infinitas alianzas similares, dirigidas a proyectos específicos y a corporaciones específicas, se podría crear un mundo diferente. Deberíamos empezar por las corporaciones que hacían negocios con Sadam Husein y ahora se aprovechan de la devastación y ocupación de Irak.

Otro peligro que amenaza a los movimientos de masas es la ONG-ización de la resistencia. Será fácil distorsionar lo que voy a decir para que parezca una acusación a todas las ONG. Eso sería falso. En las sucias aguas de las ONG de pega montadas para chupar subvenciones o eludir impuestos (en estados como Bihar se regalan como dote) también existen ONG que realizan labores valiosas. Pero es importante observar el fenómeno de las ONG en un contexto político más amplio.

En la India, por ejemplo, el apogeo de las ONG subvencionadas comenzó a finales de los años 80 y en los 90, coincidiendo con la apertura de los mercados indios al neoliberalismo. En aquel momento, el estado indio, cumpliendo los requisitos del ajuste estructural correspondiente, estaba retirando su apoyo financiero al desarrollo rural, la agricultura, la energía, el transporte y la sanidad pública. A medida que el estado abdicaba su función tradicional las ONG se pusieron a trabajar en estas áreas específicas. La diferencia, evidentemente, es que los fondos que tienen a su disposición son una fracción minúscula del recorte que se realizó en el gasto público. La mayoría de las grandes ONG subvencionadas están financiadas y patrocinadas por las agencias de ayuda y desarrollo, que a su vez dependen para su financiación de los gobiernos occidentales, el Banco Mundial, la ONU y algunas corporaciones multinacionales. Aunque no sean exactamente las mismas agencias, siguen siendo parte del mismo mundillo político que supervisa el proyecto neoliberal y que exige el recorte drástico del gasto público.

¿Cuál es la razón por la que estas agencias financian a las ONG? ¿Podría ser a causa del anticuado afán misionero? ¿Será el sentido de culpabilidad? En realidad, es algo más que eso. Las ONG dan la impresión de estar llenando el vacío creado por el estado en retirada. Sí que lo hacen, pero de forma materialmente inconsecuente. Su contribución real es que por medio de ellas se descarga la rabia política y que reparten como asistencia o caridad lo que corresponde al pueblo por derecho.

Las ONG alteran la psique pública. Convierten a las personas en víctimas desvalidas y mellan las puntas de la resistencia política. Las ONG forman una especie de parachoques entre el "sarkar" y el "public". Entre el imperio y sus súbditos. Se han convertido en árbitros, intérpretes, mediadores.

En última instancia, las ONG son responsables de sus acciones ante los que las financian, no ante las personas con las que trabajan. Son lo que llamarían los botánicos especies indicadoras. Es como si, cuanto más devastación produzca el neoliberalismo, más ONG surgen. No hay ilustración más pertinente que el fenómeno de EEUU preparándose a invadir un país y simultáneamente preparando a las ONG para que fueran a limpiar los despojos.

Con el fin de asegurarse la financiación y conseguir que los gobiernos de los países donde trabajan les permitan actuar, las ONG tienen que presentar su trabajo dentro de un marco superficial más o menos exento de contexto histórico o político. Por lo menos, de un contexto histórico o político inconveniente.

Las llamadas de socorro apolíticas (y, por lo tanto, extremadamente políticas en realidad) que envían los países pobres y las regiones en guerra acaban por formar una imagen en la que aquellas gentes (oscuras) de aquellos países (oscuros) aparecen como víctimas patológicas. Otro indio desnutrido más, otro etíope que se muere de hambre, otro campo de refugiados afganos, otro sudanés mutilado... todos los cuales necesitan la ayuda del hombre blanco. Estas imágenes refuerzan sin querer los estereotipos racistas y reafirman las hazañas, las comodidades y la compasión ("es todo por tu bien") de la civilización occidental. Son los misioneros seglares del mundo moderno.

A la larga, a menor escala pero de una forma más traicionera, el capital de que disponen las ONG tiene la misma función en la política alternativa que el capital especulativo que entra y sale de las economías de los países pobres: empieza a dictar el orden del día, convierte el conflicto en negociación, despolitiza a la resistencia, interfiere con los movimientos populares locales que tradicionalmente se han mantenido por sí solos. Las ONG disponen de fondos para dar empleos a personas que, de no ser así, trabajarían en los movimientos de resistencia, pero que de esta manera sienten que están haciendo algo inmediata y creativamente bueno, y encima se ganan la vida. La auténtica resistencia política no tiene atajos de esos.

La ONG-ización de la política amenaza con hacer de la resistencia un trabajo cortés, razonable, con su salario y su jornada de 9 a 5, más algunos extras. La verdadera resistencia tiene consecuencias de verdad. Y no paga salarios.

Así llegamos a un tercer peligro que quiero mencionar hoy: el carácter letal del enfrentamiento real entre los movimientos de resistencia y los estados cada vez más represivos. Entre el poder público y los agentes del imperio.

Siempre que la resistencia civil ha mostrado la más mínima señal de pasar de la acción simbólica a parecer, aunque sea remotamente, una amenaza, la represión se vuelve despiadada. Ya hemos visto lo que ocurrió en las manifestaciones de Seattle, Miami, Göthenberg, Génova.

En Estados Unidos tienen el USA PATRIOT Act, que se ha convertido en un esquema para la elaboración de leyes antiterroristas promulgadas en todo el mundo. Se recortan las libertades con el pretexto de proteger la libertad. Y una vez que cedemos nuestras libertades, será necesaria una revolución para conseguir que nos sean devueltas.

Algunos gobiernos tienen mucha experiencia en recortar libertades y seguir quedando bien. El gobierno indio, veterano en este juego, alumbra el camino.

A lo largo de los años el gobierno indio ha promulgado infinidad de leyes que le permiten tratar a casi cualquier persona de terrorista, insurgente, militante. Tenemos la Ley de Poderes Especiales de las Fuerzas Armadas, la Ley de Seguridad Pública, la Ley de Seguridad de Areas Especiales, la Ley de Gangsters, la Ley de Areas Terroristas y Levantiscas (que oficialmente ya no está en vigor, pero todavía hay personas a la espera de juicio por su causa) y, la más reciente, la POTA, Ley de Prevención del Terrorismo, el antibiótico de amplio espectro para curar la inconformidad.

También se están tomando otras medidas, como sentencias de tribunales cuyo efecto es sustraer la libertad de expresión, el derecho de los funcionarios a la huelga, el derecho a la vida y al sustento. En la India los tribunales han comenzado a microgestionar nuestras vidas. Y encima, criticar a los tribunales es un delito.

Sin embargo, volviendo a las iniciativas contra el terrorismo, en los últimos diez años el número de personas que han muerto a manos de la policía y las fuerzas de seguridad alcanza las decenas de miles. En el estado de Andhra Pradesh (la niña bonita de la globalización corporativa en la India) muere cada año una media de 200 "extremistas" en lo que se suelen llamar "encuentros". La policía de Mumbai presume del número de "gangsters" que han matado en estos "tiroteos". En Caxemira, cuya situación es casi de guerra, han muerto unas 80.000 personas desde 1989. Miles de personas simplemente han "desaparecido". En las provincias del nordeste la situación es similar.

En los últimos años la policía india ha abierto fuego contra personas desarmadas, en su mayoría de las castas dalit y adivasi. Su método preferido es matarlos y a continuación llamarlos terroristas. India no es la única, por cierto. Hemos visto ocurrir lo mismo en países como Bolivia, Chile y Sudáfrica. En la era del neoliberalismo, la pobreza es un crimen y protestar contra ella se define cada vez más a menudo como terrorismo.

En la India, la POTA (Ley de Prevención del Terrorismo) se denomina a menudo Ley de Producción del Terrorismo. Es una ley versátil, un patrón único que puede aplicarse a cualquiera, desde un agente de Al Qaeda a un conductor de autobús descontento. Como es el caso de todas las leyes contra el terrorismo, lo genial de la POTA es que puede ser lo que quiera el gobierno. Tras el pogromo de 2002 en Gujarat ayudado por el gobierno, en el que se calcula que 2.000 musulmanes fueron asesinados brutalmente por multitudes hindúes y 150.000 tuvieron que abandonar sus hogares, 287 personas han sido acusadas bajo la POTA, de las cuales 286 son musulmanas y una es sikh.

La POTA permite utilizar como evidencia en un juicio las confesiones extraídas mientras el reo se encuentra en custodia de la policía. En la práctica, la tortura tiende a sustituir a la investigación. El Centro de Documentación sobre Derechos Humanos del Sur de Asia informa que la India presenta el número más alto del mundo de fallecimientos en custodia y bajo tortura. Los archivos del gobierno indican que sólo en 2002 hubo 1.307 muertes en custodia judicial.

Hace unos meses formé parte de un jurado bajo la POTA. A lo largo de dos días escuchamos testimonios espeluznantes de lo que está ocurriendo en nuestra magnífica democracia. Hay de todo: desde las personas a las que obligan a beber orina, a las que desnudan, humillan, aplican electroshock, queman con colillas o insertan barras de hierro en el ano, hasta las que matan a palos y patadas.

El nuevo gobierno ha prometido abolir la POTA. Me sorprendería que esto se llevara a cabo antes de aprobar otra legislación con un nombre diferente. Si no es la POTA será la MOTA o algo así.

Cuando se cierran todas las vías al inconformismo no violento y se acusa de terrorista a toda persona que protesta contra la violación de los derechos humanos, ¿de verdad deberíamos sorprendernos al ver que amplias zonas del país están cuajadas de personas que creen en la lucha armada y están más o menos fuera del control del estado? Esto ocurre en Caxemira, en las provincias del nordeste, en grandes comarcas de Madhia Pradesh, Chattisgarh, Jharkhand y Andhra Pradesh. La gente normal de estas regiones está atrapada entre la violencia de los militantes y la del estado.

En Caxemira, el ejército indio calcula que hay entre 3.000 y 4.000 militantes activos en un momento dado. Con el objeto de controlarlos el gobierno indio envía unos 500.000 soldados. Está claro que el ejército no sólo pretende controlar a los militantes, sino a la población entera de infelices que ven al ejército indio como una fuerza de ocupación.

La Ley de Poderes Especiales de las Fuerzas Armadas permite no sólo a los oficiales de alto rango, sino incluso a los suboficiales del ejército, utilizar la fuerza y hasta matar a cualquier persona bajo sospecha de alterar el orden público. Primero se impuso en ciertos distritos del estado de Manipur en 1958. Hoy en día se aplica en prácticamente todo el nordeste y en Caxemira. La documentación de casos de tortura, desapariciones, muertes en custodia, violaciones y ejecuciones sumarias a manos de las fuerzas de seguridad es capaz de revolverle el estómago a cualquiera.

En Andhra Pradesh, en el corazón de la India, el grupo militante Marxist-Leninist People's War Group, que llevaba años en la lucha armada violenta y ha sido el principal foco de atención de muchos de los falsos "encuentros" que cita la policía de Andhra, celebró su primer mítin público el día 28 de julio de 2004, en la ciudad de Warangal.

Asistieron a la concentración cientos de miles de personas. Según la POTA, todos ellos son terrorristas. ¿Van a detenerlos a todos en algún equivalente indio a Guantánamo?

Todo el nordeste de la India y el valle de Caxemira están a punto de explotar. ¿Qué va a hacer el gobierno con estos millones de personas?

Hoy por hoy no hay en el mundo un tema de debate tan crucial como la cuestión de las estrategias de resistencia, y la elección de estrategias no está enteramente en manos del "public": también está en manos del "sarkar".

Después de todo, cuando EEUU invade y ocupa Irak como lo ha hecho, con una fuerza militar tan desmesurada, ¿se puede pedir que la resistencia sea de tipo militar convencional? Para empezar, incluso si fuera convencional seguiría siendo calificada como terrorista. Parece extraño, pero el arsenal armamentístico del gobierno de EEUU, su potencia aérea y su artillería hacen del terrorismo una reacción prácticamente ineludible. El pueblo compensa la falta de dinero y poder con estrategias y astucias.

En estos tiempos de ansiedad y desesperación, si los gobiernos no hacen lo posible por respetar la resistencia no violenta, están favoreciendo por omisión a los que optan por la violencia. La condena del terrorismo por los gobiernos no es creíble si no se muestran dispuestos a cambiar ante el inconformismo no violento.

Sin embargo se hace lo contrario: reventar los movimientos de resistencia; comprar, destruir o sencillamente ignorar cualquier movilización u organización política de masas.

Entretanto, los gobiernos y los grandes medios de comunicación, sin olvidar la industria cinematográfica, prodigan su tiempo, atención, tecnología, investigación y admiración en la guerra y el terrorismo. Es la deificación de la violencia.

El mensaje que lanzan es angustioso y peligroso: si quieres expresar una queja de carácter público, la violencia es más eficaz que la no violencia.

A medida que se ensancha el abismo entre el rico y el pobre; a medida que se hace más urgente la necesidad de adueñarse de los recursos mundiales y controlarlos con el fin de alimentar a la ingente maquinaria capitalista, el descontento no hará más que aumentar.

Para aquellos de nosotros que nos encontramos en el bando contrario al imperio, la humillación se está haciendo insoportable.

Cada uno de los niños iraquíes asesinados por Estados Unidos era hijo nuestro. Cada uno de los prisioneros torturados en Abu Ghraib era compañero nuestro. Cada uno de sus gritos era nuestro. Cuando se les humillaba, se nos humillaba a nosotros. Los soldados estadounidenses que luchan en Irak, la mayoría voluntarios reclutados en los pueblos y en los barrios pobres, son tan víctimas como los iraquíes del horrendo proceso que les exige morir por una victoria que nunca será la suya.

Los mandarines del mundo de las corporaciones, los directivos, los banqueros, los políticos, los jueces y los generales nos observan desde arriba meneando la cabeza con severidad: "No Hay Alternativa", sentencian, y sueltan a los perros de la guerra.

Y entonces, de las ruinas de Afganistán, de los escombros de Irak y Tchetchênia, de las calles de Palestina y las montañas de Caxemira, de los montes y altiplanos de Colombia y de las selvas de Andhra Pradesh y Assam, surge una escalofriante respuesta: "No hay otra alternativa que el terrorismo". Terrorismo. Lucha armada. Insurgencia. Llámenle como quieran.

El terrorismo es desalmado, feo y deshumanizante tanto para los que lo perpetran como para sus víctimas. Pero también lo es la guerra. Podría decirse que el terrorismo es la guerra privatizada. Los terroristas son los comerciantes en el libre mercado de la guerra. Personas que no creen que el estado tenga el monopolio del uso legítimo de la violencia.

La sociedad humana se dirige a un lugar terrible.

Evidentemente, hay una alternativa al terrorismo: se llama justicia.

Ha llegado la hora de reconocer que por muchos armamentos, segadoras de margaritas, sistemas de dominación total o falsos consejos de gobierno y loya jirgas que se tengan, la paz no se puede comprar a costa de la justicia.

La ambición de algunos por la hegemonía y la preponderancia tendrá como contrapartida el anhelo, aún más intenso, de los otros por la dignidad y la justicia.

La forma en que se manifieste la batalla, el que sea hermosa o cruenta, depende de nosotros.

Discurso completo pronunciado por en San Francisco, California, el 16 de agosto de 2004

Copyright 2004 Arundhati Roy. Para reimpresión contactar con arnove@igc.org

Traducido por María Fernández y revisado por Alfred Sola

 

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