|
Democracia transgênica por Silvia Ribeiro Fonte: Alai-amlatina 26-04-2005 Tradução Imediada No dia 21 de março passado, a revista Nature revelou que a transnacional Syngenta esteve vendendo por mais de quatro anos uma variedade de milho transgênico que nunca foi aprovada por nenhuma das autoridades regulamentares dos Estados Unidos. Trata-se do milho inseticida Bt10. Segundo a empresa, foi um acidente e "somente" foram distribuídas algumas centenas de toneladas desse milho, e além disso, alegam que ele é "praticamente" igual a outro milho transgênico aprovado, o Bt11, que segundo eles não apresenta riscos para a saúde. Syngenta, resultado da fusão das empresas Novartis e AstraZeneca, é a segunda das cinco multinacionais que controlam os transgênicos plantados comercialmente em escala global. Embora soubessem do fato pela empresa desde dezembro de 2004, e embora afirmem que não seja perigoso, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, a Administração de Fármacos e Alimentos (FDA) e a Agência de Proteção Ambiental (EPA) ocultaram a informação do público até que a revista Nature a revelou em seu artigo. Inclusive, nesse período, foi consultada a Casa Branca sobre a política a ser seguida, já que a notícia poderia afetar a a ação judicial dos Estados Unidos contra a União Européia (UE) em razão da moratória que esta última impõe contra a importação de transgênicos. Logo depois de revelada a notícia, a Syngenta se negou a dizer em que entidades dos Estados Unidos esse milho tinha sido cultivado, embora tenha assinalado que "somente" foram quatro, e "somente" em uma área de uns 15 mil hectares. Com a média de produção por hectar desse país, estamos falando de mais de 150 mil toneladas e não de "somente algumas centenas". A Syngenta teve que aceitar que o milho se tinha penetrado nas safras exportadas, porém, novamente, negou-se a dizer para quais países. Apesar disso, a UE reagiu e pediu explicações, e soube que o Bt10 também tinha entrado em países europeus, porém, "somente em pequenas quantidades". Dias depois, reconheceram que também teria sido enviado para o Canadá e a Argentina, e mais tarde disseram que também foi para a África do Sul, o Uruguai e o Japão, onde foi legalizado o cultivo do milho inseticida Bt11. Uma semana depois da primeira notícia, a Nature revelou que, diferentemente do Bt11, o milho Bt10 -vendido sem aprovação- tem genes marcadores de resistência contra antibióticos. Embora a Syngenta minimize o fato, isso significa que esse transgêncico têm o potencial de se recombinar com bactérias do aparato digestivo de quem ingerir o milho -animais ou humanos-, conferindo-lhe resistência contra o antibiótico ampicilina, um dos mais usados para diversas infecções bacterianas comuns. Isso quer dizer que uma pessoa poderá tomar o antibiótico, e ele não surtirá mais efeito, porém não poderá sabê-lo até a hora de ficar doente e ver que o remédio não funciona mais. Em 8 de abril, a Syngenta anunciou que tinha concordado com as autoridades dos EUA para pagar uma multa de 375 mil dólares e, o que mais?, dar um cursinho para que seus empregados se informem sobre a aplicação das regulamentações vigentes! Só isso. É, para dizer o mínimo, muito estranho que um "acidente" tenha durado quatro anos. Porém, é claro que ele evidencia a incapacidade das agências regulamentares e da sociedade para controlar as empresas transnacionais. A UE, por exemplo, teve que reconhecer que não tinha o equipamento necessário para encontrar a diferença entre o milho Bt11 aprovado e o Bt10 não aprovado. Segundo a lei Monsanto, votada pelos legisladores mexicanos -eufemisticamente chamada de lei de "biosegurança"-, será aplicado o princípio de precaução "segundo as capacidades" que existam no país. E, diga-se de passagem, elas são seguramente bem mais rudimentares que as da UE. Além disso, as cláusulas sobre confidencialidade garantem às empresas que possam manter em segredo os detalhes das construções transgênicas, para se protegerem de seus competidores. Princípio que foi levado a tal extremo que o grupo do Instituto Nacional de Ecologia que deve fazer a avaliação de risco dos pedidos apresentados nem sequer pode circular a informação para seus próprios especialistas! Na prática, as empresas podem colocar diversas seqüências genéticas em suas sementes transgênicas, que ninguém ficará a par, até que provoquem algum desastre ou se vejam obrigadas a revelar que foi "acidental". Por exemplo, nada impediria essas empresas de colocar genes "terminator", que tenham sido ativados por indutores externos posteriormente (por exemplo, químicos de dedetização aérea), produzindo a esterilidade das sementes da geração seguinte, além de todas aquelas plantas que tivessem sido contaminadas nesse ínterim. Os potenciais impactos sobre o ambiente e a saúde continuam envoltos na neblina e os estudos brilham por sua ausência. O que está claro é a instauração global de uma "democracia" transgênica, onde as decisões se tomam fora de todas as regulamentações, da legalidade, das chamadas estruturas democráticas embora essas companhias delas se sirvam como cobertura e que são definidas por quem tem o poder e o dinheiro para tanto, à margem da vontade da maioria da população. Qualquer semelhança com o cínico desaforo do chefe do Governo do Distrito Federal do México não é mera coincidência. É apenas democracia transgênica. Silvia Ribeiro é pesquisadora do Grupo ETC, México. Democracia transgénica Silvia Ribeiro Alai-amlatina, 26-04-2005 El 21 de marzo pasado, la revista Nature reveló que la trasnacional Syngenta estuvo vendiendo por más de cuatro años una variedad de maíz transgénico que nunca fue aprobada por ninguna de las autoridades regulatorias de Estados Unidos. Se trata del maíz insecticida Bt10; según la empresa fue un accidente y "solamente" se distribuyeron algunos cientos de toneladas de ese maíz, y además es "prácticamente" igual a otro maíz transgénico aprobado, el Bt11, que según ellos no tiene riesgo para la salud. Syngenta, resultado de la fusión de las empresas Novartis y AstraZeneca, es la segunda de las cinco multinacionales que controlan los transgénicos plantados comercialmente a escala global. Aunque lo sabían por la empresa desde diciembre de 2004, y pese a que afirman que no es peligroso, el Departamento de Agricultura de Estados Unidos, la Administración de Fármacos y Alimentos (FDA) y la Agencia de Protección Ambiental (EPA) ocultaron la información al público hasta que Nature lo reveló en su artículo. Inclusive en ese periodo se consultó a la Casa Blanca sobre la política a seguir, ya que la noticia podría afectar la demanda que existe de Estados Unidos contra la Unión Europea (UE) por la moratoria de esta última contra la importación de transgénicos. Luego de revelada la noticia, Syngenta se negó a decir en qué entidades de Estados Unidos se había cultivado este maíz, aunque señaló que "solamente" fueron cuatro, y "solamente" en unas 15 mil hectáreas. Con el promedio de producción por hectárea en ese país, estamos hablando de más de 150 mil toneladas y no de "solamente algunos cientos". Syngenta tuvo que aceptar que se había colado en las exportaciones, pero nuevamente se negó a decir a qué países. Sin embargo, la UE reaccionó y pidió explicaciones, por lo que se supo que el Bt10 también había entrado a países europeos, pero "solamente en pequeñas cantidades". Días después reconocieron que también estaría en Canadá y Argentina, y más tarde dijeron que en Sudáfrica, Uruguay y Japón, donde se ha legalizado el cultivo de maíz insecticida Bt11. Una semana después de la primera noticia, Nature reveló que a diferencia del Bt11, el maíz Bt10 -vendido sin aprobación- tiene genes marcadores de resistencia a antibióticos. Aunque Syngenta lo minimiza, esto significa que tienen el potencial de recombinarse con bacterias del aparato digestivo de quienes lo ingieran -animales o humanos-, confiriéndole resistencia al antibiótico ampicilina, uno de los más usados para diversas infecciones bacterianas comunes. Quiere decir que uno puede tomar el antibiótico y que éste no surta efecto, pero no habrá manera de saberlo hasta estar enfermo y que la medicina no funcione. El 8 de abril Syngenta anunció que había acordado con las autoridades estadunidenses pagar una multa de 375 mil dólares y, vaya, ¡un curso para que sus empleados se entrenen en aplicar las regulaciones vigentes! Solamente. Es cuando menos extraño que un "accidente" haya durado cuatro años. Pero es claro que pone de manifiesto la incapacidad de las agencias regulatorias y de la sociedad para controlar las empresas trasnacionales. La UE, por ejemplo, tuvo que reconocer que no tenía el equipo necesario para encontrar la diferencia entre el maíz Bt11 aprobado y el Bt10 no aprobado. Según la ley Monsanto votada por los legisladores mexicanos -eufemísticamente llamada ley de "bioseguridad"-, se aplicará el principio de precaución "según las capacidades" que existan en el país. Que huelga decir son seguramente bastante más rudimentarias que las de la UE. Por más datos, las cláusulas sobre confidencialidad garantizan a las empresas que pueden mantener en secreto los detalles de las construcciones transgénicas, para protegerse frente a sus competidores. Principio que se ha llevado a tal extremo que el grupo del Instituto Nacional de Ecología que debe hacer la evaluación de riesgo de las solicitudes presentadas ¡ni siquiera puede circular la información a sus propios expertos! En la práctica, las empresas pueden colocar diversas secuencias genéticas en sus semillas transgénicas que nadie se enterará hasta que provoquen algún desastre o se vean obligadas a revelar que fue "accidental". Por ejemplo, nada les impediría colocar genes "terminator" que fueran activados por inductores externos posteriormente (por ejemplo, químicos de fumigación aérea), produciendo la esterilidad de las semillas de la siguiente generación, y de todas aquellas plantas que hubieran sido contaminadas mientras tanto. Los potenciales impactos sobre el ambiente y la salud siguen en la niebla y los estudios brillan por su ausencia. Lo que está claro es la instauración global de una "democracia" transgénica, donde las decisiones se toman fuera de las regulaciones, de la legalidad, de las llamadas estructuras democráticas -aunque las usen para darse cobertura- y que las definen quienes tengan el poder y el dinero para ello, al margen de la voluntad de la mayoría de la población. Cualquier parecido con el cínico desafuero del jefe de Gobierno del Distrito Federal en México no es mera coincidencia. Es solamente la democracia transgénica. Silvia Ribeiro es investigadora del Grupo ETC, México
|
||
|
|||