Guerra psicológica e agiotagem contra os pobres
Fonte: comidad de 14/6/2012
Tradução: Mario S. Mieli



É preciso de muito dinheiro para se criar a pobreza

Há uma ironia no fato de que o financista Warren Buffet seja ao mesmo tempo dono da agência de rating Moody’s e da cadeia McDonalds: desse modo ele pode nos envenenar dos dois lados: na comida, mas também na informação financeira. Warren Buffet não se poupa da possibilidade de envenenar ulteriormente a informação jornalística. Efetivamente, no “Il Sole – 24 ore” (N. do T.: quotidiano econômico italiano), ele nos informa em tons entusiásticos que acaba de se assenhorear de uma grande cadeia estadunidense de jornais locais. [1]


Warren Buffet

No artigo, e até no seu título, Buffet é celebrado como o “oráculo de Omaha”. Dessa forma, o quotidiano se esquece do que estava escrito em um seu artigo de dois anos atrás, onde se narrava que o oráculo tinha admitido, candidamente, que a sua sibila, a Moody’s, tinha errado tudo a respeito de previsões e avaliações financeiras. Como desculpa, Buffett não encontrou nada de melhor que dizer que todos tinham errado e que ele, todavia, nunca toma suas decisões de investimento com base nas informações das agências de rating. E se é ele a dizer isso, por uma vez podemos até acreditar nele. [2]

O presidente da comissão estadunidense encarregada de indagar sobre as agências de rating, Phil Angelides, tinha afirmado naquela ocasião que as previsões da Moody’s eram “ou inúteis, ou em odor de fraude”. E, de fato, o rating é uma máquina da banalidade (a última: “se a Grécia tivesse que sair da área do Euro, o Euro ficaria enfraquecido”); uma função fumígena que serve, porém, para encobrir episódios específicos de agiotagem, ou até mesmo de fraude. Ainda não está confirmado se Mario Monti (N. do T.: o atual primeiro-ministro da Itália) fosse consultor da Moody’s para se ocupar da fumaça ou diretamente do assado (as fraudes), mas parece irrealista a hipótese de uma sua incriminação por agiotagem. Justamente, até as investigações da comissão estadunidense resultam encalhadas; e isso não surpreende nem um pouco, porque, definitivamente, quem pode se permitir de falar de Warren Buffet?

Depois que o nosso (Mario Monti) disse que os ricos nos EUA são muito pouco taxados, em torno dele criou-se uma aura de santidade, mais que suficiente para enamorar aquela “esquerda” cuja ideia de redistribuição da riqueza não consegue ir além da mitologia fiscal. O código penal (italiano), no artigo 501, define assim a agiotagem: “Quem quer que, com a finalidade de turbar o mercado interno dos valores ou das mercadorias, publica ou divulga de qualquer outra forma notícias falsas, exageradas ou tendenciosas, ou emprega outros artifícios aptos a causar um aumento ou uma diminuição do preço das mercadorias, ou seja, dos valores admitidos nas listas da bolsa ou negociáveis no mercado público, é punido… etc.. etc… etc… . [3]

Coloquemos de lado as punições porque, se assumíssemos como verdade o que estipula o artigo 501, não somente todos aqueles que praticam o rating, mas também os que exercitam qualquer forma de lobby, deveriam estar na cadeia. Sem agiotagem não existiria nem o capitalismo. O capitalismo se baseia justamente numa visão de mundo falsa, exagerada e tendenciosa. O falso começa até mesmo no fazer-se chamar “economia de mercado” quando, pelo contrário, é um sistema assistencial para uso dos ricos.

Mas no capitalismo, a maior agiotagem consiste em depreciar aquela que é a mercadoria mais importante: os pobres. A economista e ecologista indiana Vandana Shiva falou muito do business dos pobres, explicando precisamente em que consiste essa desvalorização: “A hipocrisia que caracteriza a linguagem das multinacionais faz com que as novas estratégias para a exploração dos pobres sejam apresentadas como políticas da luta contra a pobreza. O objetivo é, porém, eliminar as capacidades dos pobres, desvalorizar suas competências, suas habilidades e capacidades de auto-organizar-se e sustentar economias vitais…” [4]


Mas existe também uma outra forma de desvalorização dos pobres, que se exprime através de formas de desestabilização e de guerras psicológicas, cujo escopo é fazer crer que os pobres, se deixados a si mesmos, só seriam capazes de fazer a guerra, os uns contra os outros. Não por acaso a mídia nos avisa que, nesses dias, na Nigéria, estaria ocorrendo uma “guerra entre pobres”, de muçulmanos contra cristãos.

Há muitos anos a Nigéria é rotulada pela CIA e, habitualmente, pela inteligência militar estadunidense como um “failed State”. Cinco coronéis da aeronáutica estadunidense – um dos quais é um especialista em operações de guerra psicológica – juntaram-se para elinear um cenário consonante com os “interesses da segurança estadunidense”, sucessivamente à próxima falência da Nigéria. A ocupação militar da Nigéria está, portanto, na ordem do dia, aliás, já foi anunciada. Poderia tratar-se da segunda etapa africana para a OTAN. [5]

Não por acaso, a secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, têm como alvo a Nigéria já faz um bom tempo. Com agudo senso diplomático e exemplar correção nas relações internacionais, a Clinton divulga, com frequência, boletim de notas aos vários Estados e governos. Dois anos atrás fez declarações nas quais manifestava a sua indignação não só com o grau de corrupção na Nigéria, mas também com a falta de meritocracia. [6]

Dito por uma pessoa criminosa como a Clinton, parece até uma piada, mas a guerra contra os pobres se serve amplamente desse pretexto da corrupção: os pobres são ladrões, os pobres são corruptos e não amam a meritocracia; enquanto os ricos não precisam roubar e embolsar subornos porque já são ricos, portanto, também merecedores. Quanto à ambiguidade do conceito de mérito, poderíamos pedir esclarecimentos ao ‘sofisticado intelectual’ que é o Warren Buffet. Será que a atitude de hipocrisia e crime da família Clinton pode também ser considerada um “mérito”? O marido de Hillary, Bill Clinton, assola, por sua vez, a Nigéria com a sua própria fundação, lançando aqueles falsos programas de luta contra a pobreza descritos por Vandana Shiva. [7]


Mas sobra também para nós, italianos. A agiotagem para desvalorizar os pobres pode se servir também de atentados de guerra psicológica. Dizem-nos que em Brindisi, um pobre coitado, enlouquecido em função de suas dificuldades financeiras, não tenha achado um meio melhor de se vingar que colocar uma bomba embaixo de uma escola, e só porque não podia atacar outros alvos. Os pobres são também loucos. A mídia nem dedicou tanto espaço a esse atentado de Brindisi: a minimização dos espaços concedidos corresponde ao minimalismo dos conteúdos narrativos. Os motivos do assassino são fúteis e evanescentes. Nesta narração de guerra psicológica, o jornalismo e a literatura de má qualidade se tornam a mesma coisa, por isso as névoas da retórica jornalística se encarregam de encobertas as falhas da versão oficial. Eis uma das “pérolas” extraída do “La Stampa”:

“E então precisamos tentar imaginá-lo, esse homem cheio de rancor, enquanto brinca de pequeno químico nos campos do Salento. Um homem que está preparando com cuidado a sua vingança contra o mundo.” [8]

Mas será que é tão casual a escolha de uma escola para lançar uma operação de guerra psicológica? O primeiro a falar de guerra psicológica, a propósito do atentado de Brindisi foi justamente o ministro da Educação, Profumo. Quem sabe, talvez ele não tenha conseguido se conter. [9]


Notas:
[1] http://www.ilsole24ore.com/art/notizie/2012-05-17/warren-buffett-oracolo-omaha-164942.shtml?uuid=AbHOU3dF
[2] http://www.ilsole24ore.com/art/notizie/2010-06-03/buffett-moodys-sbagliato-come-080000.shtml?uuid=AYnqHVvB
[3] http://www.brocardi.it/codice-penale/libro-secondo/titolo-viii/capo-i/art501.html
[4] http://www.shantionlus.org/PDF/newsnov2006.pdf
[5] http://www.hsdl.org/?view&did=697456
[6] http://www.hsdl.org/?view&did=697456
[7] http://www.clintonfoundation.org/news/news-media/index.php/search%3fq=clinton+foundation+nigeria&hl=it&prmd=imvns
[8] http://www3.lastampa.it/cronache/sezioni/articolo/lstp/457955/
[9] http://www.umbria24.it/brindisi-ministro-profumo-assisi-%C2%ABuna-guerra-psicologica-fatta-scuola%C2%BB-umbria24/99610.html

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por Artur d’Amaru:

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